O julgamento

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A cada dia que passava Juliette sentia-se mais desanimada. 
Passava os dias em casa sem vontade de fazer nada.  Nem a própria comida ela tinha ânimo para fazer.

Abria a geladeira e comia o que havia.  Muitas vezes uma sanduíche de queijo e um suco ou simplesmente um yogurte com uma fruta.

Não tirava o pijama o dia todo  e por algumas vezes até o simples tomar banho ela descurou.

Rodolffo ligava todas as noites.  Era sempre ele a ligar,  mas já tinha percebido algo de anormal.

- Oi linda.

- Oi.

- O que fizeste hoje?

- Nada.  Não saí de casa.

- Ju, está tudo bem?

- Sim.

Por algum motivo,  Rodolffo percebeu que não estava.

- Ju, liga a câmara por favor.

Juliette ligou a câmara e Rodolffo viu uma pessoa totalmente diferente da Juliette que ele conheceu.

- O que se passa?  Olha o teu cabelo.  Essas olheiras.   Não tens dormido bem?

- Não. Estou desanimada.  Sem  perspectivas nem vontade.

- Vem para cá.

- Não posso.  Fui arrolada como testemunha de defesa pelo Ricardo.
Tenho que esperar o julgamento.

- Esse idiota teve coragem?

- Sim.

- Promete que vais reagir ou eu vou para aí.

- Eu vou, prometo.  É apenas uma fase.
Como está isso aí?

- Bem.  Estou a estudar um projecto que pretendo executar com o Heitor.   Se der certo vai ser bacana.

- Quero saber.

- Quem sabe também entres no projecto.   Ainda está em estudo.

- Toca uma música para mim no teu violão.

Rodolffo apoiou o telefone no alpendre e sentado na cadeira de balanço tocou uma moda apaixonada.

" pois é, meu corpo sente falta do seu,
que saudade do teu corpo no meu,
porque é que a gente não está junto, meu Deus "

Os olhos de Ju deixaram cair umas lágrimas que ela tentou esconder dele mas não teve sucesso.

- Não te quero ver triste nem a chorar, senão vou para aí.

- Não.  Fica aí no teu mundo.  Isto vai passar.  Tem que passar.  E quando isso acontecer eu vou ter contigo.
Agora vou dormir.   Beijo.

- Muitos beijos.  Fica bem.

Nestes últimos dias alguns proprietários das casas da praia resolveram colocá-las à venda.

Rodolffo tinha algum dinheiro para investir e viu ali uma oportunidade de negócio.   Queria transformar a praia num local onde as pessoas pudessem passar bons momentos de lazer durante o ano todo.

Juntamente com Heitor que era um homem visionário estudaram as várias possibilidades.

A praia no total teria umas 8 casas habitáveis e 2 barracões para guardar materiais de pesca.

Dessas oito apenas a de Heitor e mais duas estavam habitadas todo o ano.  Não os 365 dias, mas pelo menos mais de metade.

Rodolffo e Heitor reuniram com os demais proprietários e ficaram a saber quem realmente estava interessado em vender.  A maioria eram idosos e diziam que se sentiam mais seguros na vila por questões de saúde.

O projecto em mente era constituir uma espécie de comunidade em que as casas disponíveis seriam alugadas por períodos grandes ou apenas para férias.
Nos barracões existiriam centros comunitários para desenvolvimento das artes manuais.

Eles sabiam que isso poderia retirar a tranquilidade ao local  mas com regras poderiam tornar o mesmo um destino turístico de eleição.
Não turismo de massas.  Não era isso que pretendiam, apenas para alguém que precisasse de um pouco de paz.

Depois da reunião com os proprietários e de ouvirem a proposta, alguns voltaram atrás e resolveram pensar melhor.

Rodolffo ia reunir com a prefeitura e prometeu nova reunião depois que tivesse novidades.

Juliette reuniu uma última vez com Vítor, o seu amigo advogado.
Tal como Rodolffo já tinha dito ele também era de opinião que ela deveria apresentar queixa de Ricardo por tentativa de homicídio.

- Mas eu não tenho provas.  São só as falas dele.

- Que já demonstram as intenções.
Eu vou falar com os advogados de defesa e acusação.

Chegou o dia da audiência.

Juliette chegou com Vítor à hora marcada.

Quando chegou a sua vez de depor o advogado de Ricardo simplesmente dispensou o seu depoimento.   Em contrapartida o advogado de acusação pediu ao juiz permissão para a interrogar.

Ela não entendeu nada mas tinha que depor.  O juiz concedeu autorização.

- Senhorita Juliette quer contar o que aconteceu no iate naquele dia?

Ricardo olhava a ex namorada com ar apavorado.  Quase uma súplica para ela não falar

- Não há muito que contar.  Nós estávamos na proa tendo mais uma das muitas discussões que tivemos nos últimos tempos e o Ricardo desceu até à cabine.   Quando regressou, passou por mim, disse tchau e pulou na àgua.

- E depois disso tiveram mais alguma conversa?

- Um tempo depois na minha casa.  Ele foi lá, eu terminei com ele e ele disse que naquele dia era para ter morrido eu e não o outro senhor.  Nunca mais nos falámos.

- Vocês não trabalham juntos?

- Já não.   Eu despedi-me uns meses depois.

- Estou satisfeito sr. Dr. Juiz.

- Pode retirar-se senhorita Juliette.

Abandonei o tribunal e no final Ricardo foi condenado a prisão por homicídio.  Mesmo não tendo apresentado queixa contra ele senti-me vingada.

Nessa noite fui eu que liguei a Rodolffo a contar as novidades.

Ficámos horas a conversar por vídeo chamada.   Ele estava só de short e a visão do seu corpo provocava em mim uma sensação indescritível.

Eu desejava-o com todas as minhas forças mas ele estava longe. A viagem até ele poderia demorar dois dias e eu não me sabia capaz de conduzir tanto tempo.
Pedir para ele vir, era a solução, mas também era egoísmo pois ele já me tinha pedido para ir com ele.

Fui dormir mas com este pensamento a noite foi difícil.
De manhã acordei cansada e com dor de cabeça.

Tomei um duche e saí de casa para desanuviar.

Senhora do marOnde histórias criam vida. Descubra agora