Capítulo 1

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"Eu vim do interior

E ainda tem tanto desse mundo

Que eu não aprendi e que eu não sei

Mas meu coração é grande e cabem

Todos os meninos e as meninas

Que eu já amei (...)"

Meninos e Meninas, Jão.


Eu era muito bem resolvido. Tinha saído do armário aos 15 anos, na mesa do café. A tensão estava em cada uma das palavras que eu pronunciei rompendo aquele horroroso e agonizante armário em que eu me encontrava. Mas, pelo jeito que reagiram quando eu disse que era bissexual, não era surpresa para ninguém da minha família.

Eu lembro muito bem daquele dia: Meus pais estavam tomando café da manhã e eu me sentei para acompanhá-los, mas não consegui comer. Precisava desabafar.

- Ei pessoal, tem algo que preciso contar a todos vocês - eu disse.

Minha mãe pareceu preocupada: - Está tudo bem, Travis?

- Sim, está tudo bem. É que... eu nem sei como contar, mas eu tenho feito um exame de autoconhecimento e percebi que sou bissexual.

Meu pai seguiu calmamente olhando para mim e disse: - Tudo bem, filho. Obrigado por compartilhar isso conosco. Passe-me a manteiga, sim?

- Espera, é isso? Você não está chateado ou algo assim?

Meu pai sorriu e disse: - Por que eu ficaria chateado? Você ainda é meu filho, e eu te amo, não importa o que aconteça.

Mamãe acenou com a cabeça: - Seu pai está certo. Amamos você, Travis, e sempre o apoiaremos.

Eu fiquei estático e as lágrimas vieram aos meus olhos: - Sério? Eu estava com tanto medo de como vocês reagiriam.

- Não precisa ter medo de nós, Travis - disse meu pai - Somos uma família e sempre estaremos aqui para você.

Mamãe segurou minha mão e disse: - Nós só queremos que você seja feliz e verdadeiro consigo mesmo.

Me senti aliviado e agradeci aos meus pais: - Obrigado por tudo! Eu amo vocês dois!

- Nós também te amamos filho. Agora, passe a manteiga, por favor. O pãozinho tá esfriando.

Continuei sorrindo em meio às lágrimas e passei a manteiga para o meu pai. Naquele momento percebi que era realmente abençoado por ter uma família tão solidária e compreensiva.

Sentindo-me grato, disse: - Tenho muita sorte por ter vocês dois como meus pais!

Meus pais se levantaram e me abraçaram: - E temos sorte de te ter como nosso filho, não importa quem você ame. Mas, por favor, escolha alguém bonito! - disse meu pai rindo.

Assim, daquele dia em diante, eu resolvi contar para todos a minha verdade. Embora meus amigos tenham sido bem mais difíceis de lidar do que meus pais. Eles começaram não entendendo muito bem e disseram que eu apenas estava confuso. Depois surgiram os estereótipos como "não ter cara", "gostar de futebol" e outras coisas. Alguns achavam que eu só queria trair, estereotipando que todos bissexuais são não-monogâmicos.

Metade do tempo eu ficava perguntando para eu mesmo por qual motivo estava me colocando naquela situação, esperando que eles entendessem algo que estava além da minha decisão. Eu não decidi ser bissexual e foi, está sendo e seria para sempre um processo constante de desconstrução, de levantar a cabeça e seguir adiante. E eles, como meus amigos, deveriam me apoiar, não me julgar.

O imprinting de Paul LahoteOnde histórias criam vida. Descubra agora