VI - O Alquimista

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O barulho de gritos de horror, o clangor de armas e cordas de arcos sendo soltas, seguidas pelo silvar de flechas. Era um péssimo encerramento para um dia de banquetes, diga-se de passagem.

Ouvia os gritos: "Demônios!", "Feras da escuridão!", "É um ataque do diabo!" e "Os monstros vieram resgatar os bruxos". Coisas assim, mas Grimm sabia que a Incursio não exatamente estava querendo resgatá-lo das masmorras ou coisa parecida.

- Aposta em quem? - O rapaz estalou o pescoço, tentando ficar confortável na cela pequena.

- Oi? - Merlin não entendeu, estava distraído e principalmente amedrontado com os sons de horror.

- Nos nossos altivos e piedosos captores ou nas pitorescas "feras da escuridão"? Confesso que nesse caso eu até tô torcendo pro diabo... -

Os sons continuaram como se o escurecer tivesse trazido o inferno. Poderiam ter ficado esperando a morte por horas se não fosse uma luz surgindo de algum ponto dos corredores sombrios, aos poucos se aproximou um criado sério e colocou uma das chaves na fechadura.

- Ah, ótimo, a execução vai ser adiantada? - Grimm deu um sorriso meigo. Não saiu pelas grades abertas imediatamente, primeiro estendeu a mão discretamente e sentiu o ar tremer...mas nada veio. Só então, frustrado, saiu junto do serviçal.

Ele fez sinal para que fossem silenciosos e então seguiu por dentro das masmorras, passando por entre corredores cada vez mais emaranhados. Grimm e Merlin o seguiram com dificuldade, entendiam perfeitamente que aquelas masmorras eram mais que cavernosas prisões: era um labirinto disfarçado de prisão. Se entranharam em caminhos quase assustadores, correntes ligadas ao teto ainda com mãos ossudas e esquecidas pelo tempo presas a elas.

Por fim chegaram em um aparente beco sem saída, uma parede vazia e cinzenta. O servo, porém, ergueu o braço e falou algumas palavras em uma língua desconhecida. Merlin ficou em polvorosa, reconhecia que era simplesmente o serviçal de um nobre submetido à Igreja e ao Usurpador usando magia.

A parede ficou trêmula, como se fosse uma miragem, e então o trio passou por ela. Era a mesma sensação de passar por baixo de uma cachoeira mas sem a parte de se molhar, ainda que saindo por outro lado Grimm percebesse que seus ombros estavam sujos de poeira. Era estranho, inacreditável, bizarro...era magia.

Do outro lado havia um escritório amplo, talvez várias vezes o escritório de Derik no Khoven, que mais parecia um salão de festas. Estava cheio de estantes com prateleiras carregadas de livros, pergaminhos, tabuletas e seixos gravados com runas, talvez ao todo houvessem centenas apenas em contando os livros. Mesas com objetos bizarros de vidro e metal, que posteriormente seriam chamados de tubos de ensaio, destiladores e outros.

As prateleiras estavam carregadas mais próximas das mesas não tinham livros, mas sim potes, frascos e, bizarramente, bolhas flutuantes mágicas. Líquidos e pós multicolores, metais e cristais desconhecidos, animais bisonhos em conserva, fungos retorcidos, raízes nunca vistas e flores belas ou terríveis. Esse era um tipo de arsenal bastante curioso.

- E acredite, esse é o aposento mais jovem desse castelo - A voz de Lorde Sigurd veio de um canto afastado, quase imperceptível.

Ele estava junto de uma longa mesa de trabalho, com ferramentas conhecidas e desconhecidas. Ao lado dele estavam itens que pareciam troféus: o manto de escamas de Grimm, a varinha de Merlin, outras varinhas, um cajado partido, um colar de pedra branca igual aos dos cavaleiros vermelhos e até mesmo...uma lâmpada de vidro com uma pequena fada verde dormindo.

- O que você...? - Grimm estendeu a mão para pegar seu manto e, como Sigurd não fez gesto algum para impedí-lo, o pôs ao redor dos ombros.

- Minha real aliança com os cavaleiros vermelhos é exclusivamente por isso. Eu abrigo os prisioneiros deles, lhes dou banquetes e não mexo em seus assuntos...em troca recebo suas bugigangas - Sigurd sorriu como uma criança travessa, brincando com uma das varinhas.

As Crônicas de Desejo e Ruína - II Onde histórias criam vida. Descubra agora