10 - O estranho(a revisar)

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Eu era uma criança, que detinha o fascínio revigorante pelo novo, e não temia observar curioso tudo à minha volta. Naquela época, eu ainda perguntava sem medo de errar. Hábito que perdi com o passar dos anos. Desde então, não consigo lembrar de um dia que fui plenamente feliz.

Lembro-me de estar de mãos dadas com minha mãe. Ela parecia uma gigante aos meus olhos( nunca passou pela minha cabeça que me tornaria ainda maior que ela).

Caminhávamos na rua. Eu avisto um casal. Um casal de dois homens trocando carinhos. Sorrisos. Beijos. O toque aveludado na pele, no cabelo. O amor. Ao mesmo tempo inocente e puro, luxurioso e sujo. Uma sujeira perigosamente encantadora. A sujeira que quase todos anseiam experimentar. Mas é claro, ali eu não passava de uma criança. Para mim eram apenas duas pessoas felizes, igual meus pais.

Mas quando minha mãe me tapou os olhos enfurecida, soltando insultos que na época não me significavam nada, eu entendi que, para ela, aqueles dois eram bem diferentes dela e do meu pai. Enquanto ouvia atento tantas palavras caluniosas, uma colou na minha mente igual chiclete no calçado.

Perversão. Uma palavra tão bonita, parece com perfeição, mas enquanto uma significa coisa boa, a outra algo muito ruim. Não entendia na época o significado dela, mas ela me assombrou por anos suficientes para que eu logo descobrisse.Conforme tornava-me um adolescente, essa palavra, como muitas outras, me perseguiram a todo o tempo. Enquanto eu estava na cama, na escola, em casa.

Eu comecei a ter medo de mim e de todos. Tinha medo que descobrissem que aquelas palavras eram para pessoas como eu. Antes de dormir, em noites insones, todos os dias eu pedia pra Deus. "Deus, me faça ser que nem os outros. Me faça 'normal'." Ele nunca me respondeu. Nunca me fez mudar. E por muitos anos eu sofri, sofri pela 'anormalidade' que eu acreditava ter.

"Ei, está me ouvindo?" Uma voz aveludada, que eu nunca havia ouvido antes, e o cheiro agradável de maçãs com canela.

Demorou para que eu conhecesse alguém como eu, e percebesse que não éramos nós os problemáticos. Mas os olhos de meus pais quando descobriram me atormentam até hoje. Sempre me esforcei para ser o filho perfeito. E isso, apenas amar, foi suficiente para eu me tornar a maior decepção da vida deles.

Logo depois deles descobrirem, veio a doença. Consigo contar as vezes que me visitaram durante os anos que fiquei internado. Talvez uma, duas vezes no máximo. Sinceramente, não me surpreenderia se estivessem até aliviados. Afinal, foram poupados de mim. Foram poupados de terem um filho gay.

As mãos macias de alguém tocam minhas bochechas, e estranhamente respirar fica mais fácil quase que imediatamente. Quem é?

O perfume aos poucos me faz voltar a mim. Conforme as lembranças tornavam-se em fumaça, olhos cor de mel surgem, sobressaltados pelos raios dourados do sol. Um rosto que eu nunca vi antes salta-me a vista. As sobrancelhas afinaladas tornam o olhar marcante, lembrando uma raposa astuta. Os lábios rosados se contraem, e um doce sorriso repuxa as bochechas magras do rosto longo.

" Olá, bela adormecida" o chapéu branco quase despenca da cabeça loira com seus movimentos, mas ele não fica muito preocupado. " Voltou para a Terra?"

Terra? E onde estaria o tomatinho? A criança não estava mais em meu abraço. Para onde ele foi?

" M- mestre!" Era Lin, ainda recuperando o fôlego.

Lin está aqui...Lin... A presença dele faz com que todos os acontecimentos caiam em avalanche na minha consciência. O meu passado... memórias que eu gostaria de esquecer...

"Ei, está tudo bem" o gentil desconhecido move o dedão pelo meu rosto, como se secando lágrimas. Lágrimas? Ah, sinto meu rosto molhado, e não está chovendo. Eu... eu realmente estou chorando? Não consigo lembrar da última vez que chorei.

Renascido Num Omegaverse(Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora