17 - Quando o feitiço se vira contra o feiticeiro(parte 1)(a revisar)

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Quando o feitiço virou contra o feiticeiro. Ouvi essa frase algumas vezes sair da boca de Sebastian, e apenas dele ouvi. Achei um tanto cômico um homem desmemoriado inventar um ditado de repente, e um tão engenhoso.

Lembro perfeitamente, quando acompanhava-o uma certa vez em seus afazeres, e num sopro de tempo lhe contei das novas. Boatos muito bem fundamentados espalharam ações de um grupo rebelde, formado por betas.

O grupo, ainda sem nome, espreitava nos principais caminhos para a capital com o intuito de capturar reféns da nobreza. Com isso, pediam montantes exorbitantes de dinheiro às famílias. Não atendido o pedido, os reféns eram assassinados das piores formas imagináveis, era o que diziam.

" Parece que o feitiço se virou contra o feiticeiro" Sebastian bebericou o chá, que ainda estava quente demais para um gole cheio, " não é?"

Admito que fiquei meio confuso quando ele falou aquilo pela primeira vez, e nem precisei perguntar nada, pois ele explicou logo após se incomodar com meu silêncio.

" Todos os dias betas sobrevivem sem viver bem longe da luz do sol, picaretando sem intervalo nas minas; ou servindo ricos, fazendo os trabalhos que ninguém quer fazer, sem salário e tratados piores que animais; ou ainda passam fome e sede, frio e calor, na frente de muralhas de pedras cinzentas e ásperas, que o topo parece tocar os céus inalcançáveis. E tudo isso por culpa de pessoas como nós."

"Está falando que é nossa culpa se eles nasceram assim?!" fico indignado.

" Não. Mas é nossa culpa tirarmos deles a vida, só por terem nascido betas. Estão nos dando o troco. E a violência é a forma que encontraram."

" Eles estão pagando por suas vidas passadas, mestre. Por isso nasceram amaldiçoados." Falo como a um idiota, que não sabe o básico sobre o funcionamento do mundo. Sebastian havia se tornado um bobo após perder as memórias, pensei. E um homem de cérebro despregado como mestre de família, só podia levar todos juntos para a ruína.

Talvez tenha sido nesse instante, suponho ao refletir agora, que comecei a supor que a morte de Sebastian seria o melhor dos mundos. Um homem doente, que poderia cair de cama com qualquer descuido, e fraco de mente, como ele a mim aparentava.

Mas diferente de um covarde, Sebastian faz questão de me olhar bem nos olhos, com as pupilas bem miúdas, e as sobrancelhas levemente torcidas numa expressão de puro ódio. Eu, no lugar dele, fui o covarde. Encolhi os ombros e abaixei a cabeça , meus lábios se apertam com o pensamento inútil de arrependimento, por ter deixado a minha sinceridade escapar em uma frase direta demais, e clara demais.

Antes, eu sempre me dera o trabalho de ser sutil, mas algo havia mudado em mim. A máscara que protegia meu verdadeiro eu hora ou outra bambeava para um lado, para o outro. Às vezes até pedaços simplesmente desapareciam, para depois serem costurados como mágica, sem que qualquer vestígio de rachadura pudesse ser observado. E isso estava começando a me frustrar, a forma que eu não conseguia controlar meu espírito para trás dela.

Os segundos angustiantes e longos demais para serem segundos finalmente acabam, e Sebastian abre a boca, já com o rosto suavizado, após um breve suspiro de ar tenso.

" É exatamente por pensamentos assim, que eles nos odeiam como odeiam."

E quem liga se odeiam? Ser odiado por 'coisas' tão medíocres, só pode ser bom agouro. Se eles estão fazendo o que fazem, é porque tem espírito cruel de pecador. Almas incuráveis e nojentas. Não tive mais a audácia de falar, mas pensei encolhido no meu lugar de servente.

" Aceita mais chá?" Ofereço, ao perceber a xícara prestes a secar. Já estou com o bule na mão, angulado perfeitamente um pouco acima da altura de seus ombros para servi-lo. Mas com um gesto simples de mão, ele recusa.

Renascido Num Omegaverse(Em Revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora