Tempestades

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POV Vic

Sabe aquela ferida aberta, que não dói mais, mas inflamou tanto por negligência que sai pus e continua exposta? Está feio, dá pra ver, e que a cicatriz vai ficar, não há o que fazer.
Aquela parte do caderno é a que desejo não olhar, porque faz minha ferida latejar um pouco, faz as cicatrizes dos cortes aparecerem, mas faz parte da minha história, aquele caderno, minha vida, é tudo um poema só e escrevo um pouco dia após dia, aquilo foi essencial para a minha capacidade de reerguer-me sempre, mas não posso negar que tenho vergonha e uma certa pena do que eu me fiz passar naquela fase, e ver que Pedro conheceu uma parte daquilo mesmo me conhecendo a tão pouco tempo me assusta muito, muito mesmo.
Agora estou no terraço fudido do prédio sentindo uma brisa gelada no meu rosto e me permitindo chorar o quanto for preciso, eu sei o que a minha criança interior sente agora e não vou oprimir isso. Não posso.
Ouço os passos de Pedro depois de tempo o suficiente para achar que ele não apareceria mais, nunca mais, mas lá estava ele, também com lágrimas nos olhos.

Pedro: Vic, eu te peço desculpas por aquilo, não imaginei que iria te deixar brava.

- Por aquilo, Pedro? Só por aquilo?-Levanto- Você começou a morar na minha casa, roubou minha gata, dormiu comigo, pagou minhas contas, entrou e bagunçou tudo. Antes de você voltar tudo estava em ordem, eu estava arrumando minha vida, do mesmo jeito que você decidiu fazer ao me deixar na porra do cu do mundo e vir pra cá pra ser a porra de streamer.

Pedro: Você pode tentar me espantar o tanto que for, a autossabotagem sempre foi seu forte. Não vou surtar e sair só porque você é impulsiva, eu não sou os filha da puta que tu pegava na adolescência, Victória. Eu sou o Pedro, seu Pedro e voltei pra ficar. Tu sabe que estou em você e você está em mim, não fica com medo. Eu estou aqui.-Ele me abraçou e eu sou conseguia chorar

Depois de muito tempo assim, nos desvencilhamos do abraço e sentamos na sacada para provavelmente conversar.

Pedro: Eu me odiava muito.-Começa a balança as pernas-Todas as partes de mim. Minhas espinhas, o cabelo oleoso, minhas unhas, meu pênis, minhas manchas na coxa, meus lábios, nariz, mas principalmente meus olhos, essa porra de tique fudeu minha adolescência. Todos me chamavam de pisca-pisca quando eu passava e meu sonho era ser invisível, e não é como se eu fosse a porra da trajetória do Kanye West, mas hoje isso é minha marca, eu meio que sou a porra do Pisca.-Gargalho e ele passa a mão no meu braço, onde as cicatrizes (que por um mistério as vezes ainda ardiam) ficavam como se soubesse- Eu me sinto um lixo por nunca ter percebido, porque faria o que fosse possível pra poupar minha sol desse sentimento, eu me cortaria no seu lugar, daria um jeito de passar tudo isso pra mim, mas estava cego demais com a porra das minhas futilidades pra ver minha garota, eu de fato era um merda, mas agora eu estou aqui e darei tudo de mim para não sair.

- Cê era só um moleque...-Digo com uma voz baixa, porque estava segurando o choro

Pedro: Quando estávamos perto um do outro, eramos outro bagulho, sabíamos da responsabilidade que tinha nos sentimentos da nossa relação...

- Se soubesse a quantidade de vezes que eu estaria chorando, mas estava sorrindo porque você estava comigo, saberia que você foi sim o suficiente.-Ele se aproxima e passa a mão nos meus olhos, depois na minha bochecha e depois na minha boca
Passa os dedos na minha nuca e solta duas piscadinhas e uma risadinha, e seus lábios chocam com os meus.
Era como se nós voassemos, passei a mão pra nuca dele e ele pra minha cintura, trazendo um arrepio pra todo meu corpo, a dança do nosso beijo era a coisa mais gostosa do mundo e eu poderia passar horas ali. Deitamos no chão com ele por cima de mim ainda me beijando com os dois braços sobre minha cabeça.

Pedro: Você é linda pra caralho.

- Obrigada, mitinho.- Ele gargalha jogando a cabeça pra trás e deitando ao meu lado

Pedro: Eu não vou te deixar mais, Victória, a não ser que você peça, não saio daqui.

- Pedro, não promete o que você não pode cumprir.

Pedro: Vic, eu não vou embora.-Enlacei ele com minha perna e mãos e apoiei minha cabeça no peito dele

- Tô me sentindo muito cansada.

Pedro: Vamos entrar então, po.

☆2hrs depois☆

Subimos e estávamos comendo pipoca assistindo filme abraçados.

Pedro: Eu acho que você seria o tipo que desenvolveria uma síndrome de estolcomo.

- Desculpa falar isso, mas que cringe.

Pedro: Você é extremamente cringe, Victória. Esse cabelo todo colorido na minha cara não é meu e pode provar meu ponto.

- Meu pinto, cara. Não vou me render ao sintema e ficar com um cabelo castanho escuro sem graça porque tenho mais de 18 anos.

Pedro: Mitou. Mas eu amo seu cabelo, foi o que me chamou atenção pra te encher o saco lá na praça.

- Você pintaria o cabelo pra ficar igual a mim?

Pedro: Nem fudendo.

- Por que!?

Pedro: Porque você fica bonita fácil, até careca. Eu fico feio sem muito esforço, a sorte é que eu gosto.

- Tu tá sempre gostosinho.

Pedro: Agora eu tô porque malho, mas vê se diziam isso quando eu era gordo e fudido.

- Diziam mesmo assim, tinha um monte de edit sua.

Pedro: Droga, você me melou de mitadas outra vez.-Eu ri

- Nossa, tô com um cansaço da porra.

Pedro: Tu tá comendo direito? Percebi você mais magra, mas achei que não me cabia falar do seu corpo assim.

- Pior que tô, deve ser só a rotina corrida, nem todo mundo "trabalha" de streamer e ganha R$45.000,00 por mês.

Conversávamos bobagem enquanto o tempo passava e mais uma vez, dormi com o som dos batimentos dele.

☆☆☆☆

curtiro?

Uma loucura e meiaOnde histórias criam vida. Descubra agora