Capítulo dezenove

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Gael

— Eva! — soltei o recipiente do poço, ouvindo-o chocar-se contra o chão, enquanto segurava ambos os braços de Eva. A chuva caía fina sobre seu rosto atordoado. — Eva, pelas barbas de Arão, não vá desmaiar novamente! — Exasperei-me ao vê-la empalidecer com a respiração entrecortada, os mesmos sintomas que precediam seus desmaios. “Maldição! Por que não sei segurar minha boca!?” Eu havia jurado pelos céus que ela jamais saberia, pelo menos não até eu ter certeza de que meus sentimentos eram recíprocos. Todavia, já estava farto de ouví-la falar da irmã, preferia perdê-la para sempre à continuar com essa farsa.

— Respire! — supliquei, simulando uma respiração forçada, sem tirar os olhos de seu rosto estarrecido. Ela tentou espelhar o gesto com dificuldade. — Eva, vamos… não foi lá uma surpresa o que eu disse, foi? Será que nunca havia notado? Será que a forma como… olho para você, não lhe diz nada? — Desta vez, seu rosto corou violentamente, ao passo que seus olhos saltavam das órbitas. Percebi nitidamente ela engolir em seco e em seguida abrir os lábios, motivada a dizer algo. Mas nenhuma palavra saiu. 

— Eva… — acariciei seus braços com os polegares, fazendo círculos intermináveis — diz algumas coisa…— pedi, gentilmente. Ela retribuía meu olhar no momento em que seus lábios voltaram a se abrir, indicando que ela diria algo. No entanto, fora um pigarro que ouvi. E não vinha dela. Eva direcionou o olhar para além de mim, piscando várias vezes, ainda mais atordoada. Girei o corpo para buscar de onde vinha o tal pigarro e quando minha mente constatou o que os meus olhos viram, senti meu corpo retesar e jurei ter ficado ainda mais estático do que Eva. 

— Peço desculpas por atrapalhar os pombinhos, mas precisamos de você Gael. — Uma voz grave ressoou do meio do que contei serem dez soldados. Todos vestidos com couraças de couro, braceletes, cinturões, espadas embanhadas, arco e flechas nas aljavas. Eram soldados de Davi, constatei. Os uniformes eram singulares e diferentes dos de Saul. Mas aquela tropa, não era a mesma que nos acompanhara no último ano. A não ser por dois deles: Aaron o soldado que tornou-se meu amigo e me ensinou tudo o que sabia sobre espadas e Samá o capitão e chefe de cem guerreiros de Davi. E era exatamente este que falara comigo novamente, ao ver-me emudecer. — Gael? Ora, vejam rapazes, atrapalhamos o nobre pastor e ainda o deixamos sem palavras — sorriu, olhando os demais que riram em uníssono. Samá aproximou-se, pousando uma mão amigável em meu ombro. — Shalom Gael, como estão as coisas por aqui? E a bela moça, quem é? 

— Como… como vocês… o que… por que…?

— Me chamo Eva, meu senhor. Sou serva de Abigail. — Eva apressou-se a dizer, com voz quase inaudível e tom vacilante, enquanto se encolhia atrás de mim, porém, sem tirar os olhos curiosos dos visitantes.

— Shalom, Eva — Samá cumprimentou-a com um aceno de cabeça. — Joabe! — voltou os olhos para a pequena comitiva, direcionando a fala para um deles, o qual julguei ser o mais altivo e experiente. Este deu alguns passos em nossa direção, o olhar era sisudo e não tão amigável quanto o de Samá — este é um dos pastores de ovelhas de Nabal — apontou para mim. O homem, cujo nome era Joabe, me analisou dos pés a cabeça com um vinco entre as sobrancelhas.— Gael, este é o nosso comandante. O general do exército de Davi. Ele veio pessoalmente para…

— Basta Samá. — Ergueu a palma de uma mão — Deixe que eu mesmo me apresente. — Atalhou, com voz naturalmente grave, deixando-me ainda mais atônito. “Comandante? General?” meus pensamentos formavam vários nós, enquanto eu engolia em seco. — Eu sou Joabe, como Samá já apressou-se em dizer. Aqueles dois à frente — apontou com o queixo os soldados que se pareciam com ele — São Abisai e Asael, meus irmãos. Os demais são soldados da tropa de Samá, que estão, também, sob minhas ordens. — Ele voltou o olhar para mim, esperando alguma reação.

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