Capítulo X

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— Poderia parar de me olhar como se tivesse arrancado meu coração e se arrependesse? — O estudante de Sumeru arqueia uma sobrancelha.

— Foi quase isso o que aconteceu… — murmuro.

— Bem… — Lança os papéis sobre a mesa, fazendo-os deslizar um pouco, espalhando-se por ela. — Não tenho tudo em mãos, mas as anotações dos estudos deles. O que conseguiram salvar. E, mais importante… — Retira um caderno de couro da bolsa e empurra-o sobre a superfície para que chegue até mim.

Neuvillette pega algumas das folhas e começa a estudá-las enquanto abro o caderno. Diário de Cheshire - O experimento que deu certo.

Abro na primeira página.

Dia 1: A criança escolhida como cobaia nº18 é prole da mesma genitora da cobaia nº17. Raven é promissor, mas não é como queríamos. Por isso, sua irmã, a mesma a qual apelidamos "Cheshire", foi levada das ruas depois de…

— O quê?! — questiono, ao mesmo tempo que Neuvillette.

— Parece que chegaram na parte que eu queria. — Alhaitham alisa o queixo, pensativo. — Ao que tudo indica, todos os experimentos são crianças que foram abandonadas pelas ruas de Fontaine, e não deixadas na Casa da Lareira. Provavelmente, quando a água subiu, algumas das cobaias conseguiram, de algum modo, fugir e pararam, por fim, no orfanato.

Neuvillette por um segundo parece chocado, mas mascara o choque com sua expressão de sempre.

…ser abandonada pela genitora. Como os outros, chegou a nós antes que a Casa da Lareira pusesse as mãos nela. Sem novas informações.

Dia 2: O jovem corpo de Cheshire reagiu imediatamente ao soro. Diferente dos outros, que demoraram semanas e até meses para manifestarem escamas ou qualquer coisa que remetesse ao Dragão Hydro.

Arquejo.

— Parece que o que eles injetavam nos experimentos era algo relacionado com o Dragão Hydro.

Minhas mãos começam a tremer e eu decido dar uma pausa e empurro o diário.

— Como eles conseguiram…?

Alhaitham para o caderno de couro a deslizar e suspira.

— Da mesma forma que alguém já conseguiu a água do mar primordial — responde. — Acredito que existam vestígios da existência do Dragão Hydro ainda presentes em terra, ou até mesmo no mar, que podem ainda hoje ser encontradas e utilizadas.

Neuvillette nos esquadrinha, o mesmo olhar sem expressão de sempre.

— Posso ler?

Alhaitham assente e empurra para ele.

Fecho os olhos, pensativa.

Eu e Raven somos, de fato, irmãos. Uma espécie de soro doentio produzido com algo do Dragão Soberano Hydro foi injetada em nós quando novos e nossos corpos reagiram de modo diferente.

— Então tudo isso é uma mistura de cientistas loucos com um dragão morto? — Massageio as têmporas. — Ótimo.

Olho pela janela de braços cruzados, observando a intensa chuva que cai no exterior.

Neuvillette está em seu escritório, resolvendo seus problemas enquanto o principal deles está em seu quarto refletindo sobre experimentos e assassinatos e memórias perdidas e afins.

Com um longo suspiro, decido ir ao escritório do Iudex.

A melusine na porta não me barra, provavelmente fora alguma ordem do próprio juiz me deixar passar em qualquer situação e, dadas as circunstâncias, mais uma vez, ele tem razão.

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