SETE, a fita cassete da Tina que acabou com Genesis.

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Hold on my heart
Just hold on to that feeling
We both know we've been here before
We both know what can happen
So hold on my heart

— "Hold My Heart", Genesis.

ADRIANE GALISTEU, a borboleta.

Casa de Angra, Angra dos Reis. Sudoeste do Rio de Janeiro. Abril de 1990.

Despertei com o canto dos bem-te-vi, acompanhado com os arranjos musicais de alguma outra espécie vindo do lado de fora. Era reconfortante e completamente fora do comum ao mesmo tempo, quando minha realidade se tratava de um despertador barulhento e uma sinfonia desagradável de buzinas de carro, motos e até bicicletas rua abaixo do pequeno apartamento onde morava.

Mas o quarto andar de um prédio na Lapa não era exatamente o extremo espaço, tamanho e conforto que o quarto que estava hospedada na casa de Ayrton fornecia. Apesar de pequeno, era organizado graças a o milagre que era dona Zinha por uma vez na semana por um precinho dos deuses.

Rolei na cama, levando comigo o lençol que estava enrolado e amarrotado junto ao meu corpo, pura preguiça de deixar a cama me atinge antes mesmo de considerar abrir os olhos. A claridade vinda por uma ou outra fresta aberta por conta da brisa tardia fazia o sol escapar, caindo sob minha face numa tentativa frustrante de me acordar.

Não tinha a menor ideia sobre o horário atual, mas apostava todas minhas fichas que a manhã já tinha se despedido dando lugar a uma tarde calorenta de veraneio naquele paraíso particular.

Afundei o rosto no travesseiro, grunhindo antes de deitar de barriga pra cima. Eu aceitava meu destino de ser pelo menos um pouquinho responsável e não passar o resto do dia na cama ao invés de aproveitar o que aquele lugar que provavelmente só veria uma vez na vida, vivendo para sempre em minhas memórias.

Com aquele pensamento em mente, abri os olhos tendo de encontro o modesto lustre do quarto de hóspedes me encarando como ponto focal no meio de um teto num leve tom de amarelo bebê.

— Bom dia, boa tarde.

Foram as primeiras palavras que pronunciei para o teto, um bocejo escapando logo em seguida enquanto coçava os olhos, tirando os fios rebeldes de meu cabelo loiro fora da minha linha de visão antes de utilizar as mãos para me apoiar no colchão enquanto me impulsiona para cima, sentando na cama com toda a preguiça do mundo caindo em cima dos meus ombros.

Amava dormir, pegava no sono com facilidade e poderia muito bem hibernar por meses se me permitissem, mas minha vida não me dava aquele luxo. Fora que provavelmente perderia a graça se se tornasse algo trivial.

Precisava de um banho rápido, era a maneira mais fácil de despertar sem me render a cair no sono pelo resto da tarde, ou até parte da noite, esquecendo do mundo do lado de fora da porta daquele quarto.

Dispensei o lençol e fiz a marcha da preguiça até o banheiro, fazendo um coque com meu elástico de cabelo antes de me enfiar debaixo do chuveiro. Água gelada e tudo, nada melhor que aquilo antes de averiguar o que tinha sobrado do almoço pra mim beliscar ou ao menos fazer um lanche.

O mero pensamento de comida fez meu estômago roncar durante a ducha rápida, acho que só um lanchinho não iria resolver o buraco no meu estômago desde o churrasco na noite passada e as bobagens até umas duas da madrugada.

Pés descalços trilharam a distância do porcelanato gélido no chão do banheiro até a madeira envernizada do quarto, a toalha muito bem amarrada no meu corpo enquanto cantarolava o som de uma musiquinha que tinha ouvido na noite passada quando dançava com ele.

caminho das borboletas | ayrton senna & adriane galisteuOnde histórias criam vida. Descubra agora