QUATRO, conheço a garotinha do papai.

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De todo o meu passado
Boas e más recordações
Quero viver meu presente
E lembrar tudo depois

Nessa vida passageira
Eu sou eu, você é você
Isso é o que mais me agrada
Isso é o que me faz dizer
Que vejo flores em você

"Flores em Você", Irã!.


ADRIANE GALISTEU, a borboleta.

São Paulo, Capital. Quarta-Feira a tarde, 1990.

Cheguei a uma conclusão nada surpreendente: Eu não fazia ideia do que havia me metido.

Tudo bem, acho que carregava aquele pensamento fixo comigo desde o final de semana do Grande Prêmio do Brasil em Interlagos. Era inquietante, ponderando sobre todas as decisões que tinha tomado até aquele momento em específico, mesmo depois de repetir milhares de vezes que não queria nada com ele.

Mesmo assim, aqui estava eu... Dentro do mesmo Honda preto novinho que vi na manhã do dia anterior estacionado na porta da Elite, numa travessia que era realizada dentro das ruas da cidade até chegar no prédio da empresa da família Senna, onde o helicóptero nos esperava no heliponto particular.

É claro que tinham. Provavelmente nunca andaram de buzão na vida.

Agora eu tinha um carro velho, quase caindo os pedaços, que ainda cumpria fielmente sua missão de me transportar de casa pra Elite toda semana. Provavelmente não era nem completamente seguro, mas era meu. Comprado com meu dinheiro, dinheiro esse que foi adquirido com meu esforço e meu trabalho. Tinha orgulho de poder dizer aquilo, velho mas meu.

Voltando para o presente, meu cérebro ainda demorava a raciocinar, encontrando dificuldade no processo de armazenamento de informações. Fazia menos de cinco minutos que havíamos deixado o flat que Ayrton dividia com o irmão, Leonardo.

Antes de deixarmos o apartamento ele me pediu licença, disse que ia terminar de se vestir e pegar as coisas dele no quarto, que era pra mim ficar a vontade. Quando retornou, usava uma camisa polo branca, sapato social e seu fiel escudeiro, o bonezinho azul com o logo do banco Nacional. Chamei o elevador enquanto ele trancava o apartamento, molho de chaves singelo balançando entre os dedos, um silêncio agradável até o estacionamento. Pedi licença, me dirigindo até meu velho carro, abrindo o porta malas e retirando a mala que tinha preparado para a viagem de dentro.

Durante todo aquele processo, pude sentir o olhar dele queimando na minha pele, como se observasse curiosamente todos meus movimentos, trejeitos e até o nível de minha respiração em uma distância respeitosa.

Quando me virei, porta malas já trancado e carro que ninguém prestaria a atenção ali, fui o mais sossegada possível ao encontro de Ayrton, que não tardou a abrir o caminho até seu Honda preto, abrindo o porta malas e gentilmente retirando a mala de minhas mãos, colocando-a do lado das bagagens que ele levava ali. Algo que nem pude prestar a atenção, como se minha mente e corpo operassem no automático.

Nem registrei a ação de meus pés, andando despreocupada ao contornar o carro até a porta do carona. É claro que não tinha pretensão nenhuma de simplesmente ficar encarando aquele par de olhos castanhos, esperando que qualquer coisa fosse dita. Parecia que tínhamos voltado para a estaca zero, porque, de alguma maneira, a timidez ainda pairava sobre nós mesmo depois de horas de conversa.

Algo me tira daquele pensamento, bem no momento que minha mão pretendia encostar na maçaneta reluzente do carro, quando o calor de uma outra mão envolve a minha, um toque que provoca minha pele a se arrepiar.

caminho das borboletas | ayrton senna & adriane galisteuOnde histórias criam vida. Descubra agora