Capitulo 1

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- Oh vidinha sem sentido.  Estou farta deste local onde nada presta e não acontece nada!

- Não digas isso minha filha.  Aqui pelo menos temos paz.

- E isso o que me interessa.  Mato-me a trabalhar para chegar a meio do mês e andar a contar os tostões.  Hoje tive que comprar fiado o pão e o leite.  Achas isso bom, mãe?  Se não fosse a tia Rosa do mercadinho ter pena de nós, morriamos à fome.

- Vou rezar já uma novena.  Deus há-de ter compaixão de nós.

- Isto já não vai com novenas.  Nem cem missas nos salvam.  Essa tua fé ainda nos faz pior.  Essas moedinhas que deixas na missa fazem-nos falta, mas fazer o quê?

- Que blasfémia filha.  Desde quando deixaste de acreditar em Deus?

- Desde que me mato a trabalhar e a ver todos os dias iguais.  Olha ali aquele tanto de roupa para lavar!  Eu chego da farmácia e ainda tenho este encargo.  Podias ajudar mais, mas levas o dia de terço na mão e eu que me f@da.

- Juliette do céu!  Isso é coisa do demónio.  Não foi essa a educação que te dei.  Eu sei que te criei sózinha, mas sempre na fé de Deus.  Se não fiz mais, foi porque não pude.

- Está bem.  Vou lá por a roupa no sabão, que amanhã tem que ser entregue lavada e engomada.

- Vou terminar a sopa.  Hoje não tem muita coisa, mas dá para matar a fome.

- Ao menos isso, né mãe.  Já que sobra tudo para mim.
Um dia largo tudo e vou para S. Paulo.

- Lá é terra do demo.  Aquelas gentes vivem todas enfeitiçadas.   Tenho visto na televisão.  Mulheres quase nuas e os homens, uns autênticos demónios.

- São os tempos de hoje, mãe.  Aqui neste lugarejo é que ainda vivemos como no século passado.

Juliette vivia com a mãe desde sempre.  Após fazer o ensino secundário e o pai as ter abandonado,  ficou sem outra opção a não ser trabalhar para prover o sustento da família o que cada dia era mais difícil.

A mãe com o desgosto, refugiou-se na igreja e de lá não saía.

Aos 20 anos, Juliette acumulava o trabalho na farmácia local e ainda aceitava roupa para lavar e passar.

O dia dela começava por volta das 5 horas da manhã e por vezes terminava às 11 horas da noite.

Hoje era mais um dos dias difíceis e ela praguejava com tudo e todos.

Quando finalmente terminou o trabalho, mal conseguia abrir os olhos de tão cansada que estava.  Comeu a sopa e atirou-se para cima da cama ainda vestida.   Não tardou muito e já mergulhava num sono profundo.

Uma dose de saudadeOnde histórias criam vida. Descubra agora