21° capítulo

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Encarando seu perfil intimidador, em sintonia com a sua expressão fria e os olhos gélidos, tomo coragem, mesmo com a garganta apertada e em dúvida se minha voz vai sair em um tom audível. Finalmente pergunto o que me perturba desde o momento em que saí daquele salão.

– Você vai cancelar o nosso contrato? – murmuro. A voz, assim como imaginei, sai quase sem força.

Ele não responde de imediato. Em vez disso, joga a cabeça para trás no banco e fecha os olhos por um momento, levando as mãos para cima da cabeça, como se estivesse tentando conter a explosão que parece prestes a acontecer. E, no momento, por incrível que pareça, eu desejo que ele exploda, ou ao menos que diga qualquer coisa.

– Laura... – Ele solta um suspiro pesado, finalmente se virando para mim. – Me diz uma coisa. Você tem ideia do estrago que fez hoje?

Engulo em seco, as palavras morrendo na minha garganta.
Parece que todo o discurso que pensei em fazer desapareceu e, em minha cabeça, há um eco de palavras soltas.

Ele inclina o corpo na minha direção e, antes que eu possa responder, faz um gesto amplo em direção ao volante, como se estivesse mostrando algo invisível.

– Isso aqui – ele começa, apontando para o vazio, como se quisesse colocar em palavras a bagunça da noite. – Isso aqui... não é brincadeira. Eu apostei alto nesse contrato, nesse plano, nessa... – Ele para, como se a palavra estivesse pesada demais. Mas não é difícil parar para pensar o que ele iria dizer. – Nessa farsa.

– Eu sei que estraguei tudo – digo, tentando manter a voz firme, mas falhando miseravelmente. Estou tentando pensar com a cabeça dele e imaginando o que eu faria se estivesse do outro lado da moeda.

Ele acaba soltando uma risada curta, sem humor, e balança a cabeça.

– Estragar não é nem o começo, Laura. Você colocou tudo em risco. Tudo.

– Eu só... – tento falar, mas ele me corta.

– Só queria ajudar seu pai, certo? – Ele me encara, e o sarcasmo em sua voz é quase palpável. Se fosse em outro momento, provavelmente eu o estaria xingando, mas agora, como eu poderia? – Pois saiba que agora você estragou a única chance que tinha de fazer isso.

Eu abaixo os olhos; a vergonha queima no meu rosto e, junto dela, o desespero.

– Eu posso consertar isso – digo, quase como uma súplica. Eu preciso consertar.
Perder meu pai não é opção e, se eu tiver que implorar de joelhos a ele, eu o farei.

Ele bufa, esfregando o rosto com as mãos, como se tentasse controlar a própria frustração. Sinto que, a qualquer momento, ele vai explodir.
Seus belos olhos agora contêm uma fúria e um desgosto que eu jamais vi antes neles.
Saber que a culpa é minha só piora a situação.

– Laura, você entende o que está em jogo aqui? – Sua voz é mais baixa agora, mas ainda afiada como uma lâmina. – Isso aqui... – Ele aponta novamente para o vazio, o gesto mais enfático dessa vez. – Isso aqui não é só sobre você.

Eu sei, porra, penso comigo mesma, mas só de fechar os meus olhos eu vejo aquelas duas lá me humilhando. O sentimento de ódio ainda está totalmente presente em mim, e o pior é saber que quem brigou naquela festa não foi a Laura de 22 anos, mas sim a de 15, se defendendo do bullying.

Engulo em seco, pois me sinto totalmente incapaz de responder.

– Amanhã. – Ele respira fundo, desviando o olhar para o para-brisa. – Amanhã a gente vai descobrir como sair dessa.

Fico em silêncio e tento a todo custo encontrar alguma coisa pra dizer, mas, novamente, ele corta o meu raciocínio.

– Sai, Laura – ele diz, com a voz mais fria e cortante que alguma vez usou comigo.

Faço o que ele manda, mas fico parada na calçada enquanto ele acelera e desaparece na noite. Não consigo fazer com que suas palavras parem de ecoar em minha mente: "Isso aqui não é só sobre você."

Com o coração apertado e a mente inundada de arrependimento, só consigo pensar em uma coisa : amanhã pode ser minha última chance de consertar tudo.
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