Capítulo 21

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— Será que ela vai entender isso? — Perguntei pela décima vez, enquanto pegava um pote de chocolate com bisnaguinhas.

— Sim, meu amor. — Attor suspirou, com um sorriso escondido entre seus lábios brancos.

— Mas Rachel é teimosa.

— Ragna também.

— Não sei se isso vai dar certo. — Gemi descontente, imaginando várias probabilidades daquilo dar errado. — Ela parecia machucada e pode se sentir muito assustada. — Pensei em Rachel com seus cabelos vermelhos vivos e sua face voraz. — Pensando melhor...acho que ela pode assustar ele.

— Fica tranquila, Cassi. Ragna não vai encostar em sua amiga para machuca-la.

— Mas ela pode entender errado e piorar as feridas com movimentos bruscos.

— Ele tem tudo sobre controle. E pode ser muito insistente quando quer algo.

— E nesse exato momento ele quer a minha amiga? Não sei se deveria me sentir bem com isso. Rachel odeia...— Tentei encontrar uma forma menos ofensiva de me referir aos androids. —...a diferença entre nossas espécies.

— Cassi, não precisa ser tão modesta. Sei que aquela mulher nos odeia.

— E como seu amigo foi se apaixonar por ela?

— O despertar não é tão simples.

— O que é exatamente o despertar? — Attor me lançou um olhar de insegurança, voltando a prestar atenção no caminho pelo qual seguiamos para uma mesa em sala pública. — Eu estou com vocês, Attor. — Peguei em seu pulso, equilibrando os alimentos na outra mão. — Estou com você. Não vou deixa-lo.

— O despertar...— Ele me olhou com certo medo, mas pareceu acreditar em mim. —...é como se fosse um choque de realidade. É quando um android começa a desenvolver sentimentos mais fortes. Nossas salvadoras são como chaves que iniciam esse processo. Depois que temos ele, é difícil simplesmente ignora-lo. E quanto mais contato, mais nos sentimos...obcecados.

— Então...eu sou sua...salvadora? — Tentei não fazer careta com o som da palavra. — Em que momento te salvei? Ou melhor, despertei?

— A emoção mais forte que pode controlar alguém e leva-la a fazer coisas irracionais é a paixão. O mesmo serve para nosso despertamento. É como amor a primeira vista, mas sempre está associado a algo.

— Espera, associado ao que?

— A algo...no passado de cada um. — Attor parecia desconfortável com o rumo da conversa, desviando os olhos de mim.

Passado? Androids tinham algum passado alem da vida que levaram ao serem criados? Eu vi a criação de Attor desde seus primeiros passos. Ele veio para mim como uma completa máquina de aço, sem olhos, boca ou nariz. Fui eu que o modelei para tomar uma forma humana. Mas ao me dar aquela explicação, parecia que se referia a um tempo mais diatante do que sua chegada até mim.

— Eu te relembro de algo da sua fabricação? Você teve muito contato com tinta? — Tentei brincar com ele, dando um leve empurrãozinho com meu cotuvelo em seu braço. Mas não tive resposta alguma. — Attor? — Olhei para ele, e me surpreendi em encontrar suas pupilas robóticas dilatadas. — Foi uma brincadeira. Desculpe.

Devagar ele abriu um sorriso, lento como uma preguiça, mas ele não chegou aos seus olhos. Se não o conhecesse, diria que se tratava de um psicopata observando sua vitima, mas sabia que essa era uma mania de quando sua mente estava longe.

— Attor? Você está aqui?

— Sim? Oh, me desculpe. — Suas pupilas voltaram rapidamente ao normal, então soube que ele estava de volta para mim.

Minha Bela Criação - Trilogia Androids Que AmamOnde histórias criam vida. Descubra agora