capítulo 21

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Heloísa Sampaio

Ter tido pela primeira vez na vida a sensação de ser indiferente para Stênio, mexeu com o mais profundo do meu ser, e me fez odiar tudo.

Odiava vê-lo me tratando dessa forma, odiava assistir enquanto ele fingia que do dia pra noite não sentia mais nada por mim. Odiei ainda mais quando ele negou dormir comigo, ou quando não quis sentar ao meu lado no sofá.

Odiei toda essa distância, muito mais do que eu fingi odiá-lo por todos esses anos.

O ódio é um sentimento muito mais fácil e simples de ser sentido, também é mais fácil de ser explicado. Por isso, eu que sou sempre muito prática em todos os aspectos da minha vida, preferia mil vezes mais fingir sentir o ódio.

E assim que fiz isso por todos esses anos de separados, fingindo odiar o homem que sempre foi  responsável por acelerar o meu coração e me deixar boba. O único que foi capaz disso em toda a minha vida, mas também o único que eu fugia como se fosse pecado amá-lo.

Sendo sincera, assumir que ainda amo um homem que um dia me traiu, que um dia olhou no meu olho e mentiu, é complicado. É uma ferida para o meu ego de mulher forte, de imbátivel.

Mas não posso ser injusta e dizer que não enxerguei as mudanças de Stênio nesses anos todos, inclusive no seu caráter. Ele não é mais o homem imaturo com quem me casei, com quem enfrentei uma briga na justiça pela guarda da nossa única filha.

É difícil pra mim assumir que as pessoas mudam, quem dirá pra melhor. Mas Stênio é um bom exemplo de que isso é possível, de que dá pra se transformar em um homem muito melhor do que um dia ele foi.

No trabalho, para a filha, para a neta e também para mim.

Só que eu só me dei conta de tudo isso no momento que ele começou a se fazer de indiferente, quando começou a se afastar de mim como se não se importasse mais comigo.

Me doeu ver ele longe, não ver ele todo espaçoso querendo ocupar espaços que não são dele.

E isso foi o suficiente para dar um estalo na minha cabeça e me fazer querer mudar também, afinal, da mesma forma que ele mudou um pouco, eu também preciso dessa mudança.

Ser um pouco mais carinhosa, mais prestativa e principalmente, saber assumir meus sentimentos.

Por isso, decidi que não iria permitir que ele se afastasse de mim dessa forma, pelo menos não de um jeito fácil. Se ele quer realmente me ver longe dele, vai ter que se esforçar muito mais.

Porque agora eu entrei para o jogo e não pretendo sair fora, não enquanto eu não o tiver comigo de novo.

— Vamos dormir, pequena? Já tá bem tarde pra criança estar acordada. — permanecia abraçada em Serena no sofá do apartamento, depois de assistirmos mais um filme que ela escolheu. — Amanhã é domingo... sabe que dia é?

Fiz suspense, sabendo o quão animada ela fica nesse dia por um motivo em específico.

— Dia de pastel na feira! — a criança ficou em pé imediatamente, parecendo até que a energia tinha voltado pro corpo. — Me coloca pra dormir, vô. Que eu quero que amanhã chegue logo.

Stênio que nos olhava do outro lado do sofá, deu um sorriso pra ela enquanto se aproximava para pegá-la no colo.

— Dá um beijo na vovó. — abaixou o corpo dos dois, deixando a criança na minha altura.

Mas para além disso, deixou os nossos rostos bem pertinhos, o suficiente pra eu sentir sua respiração quente ficando ainda mais acelerada com a aproximação.

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