Capítulo 1 - As visões

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Engfa Waraha
Tailândia
Bangkok

Engfa conhecia aquele templo como se fosse a palma de sua mão. Tinha passado grande parte de sua juventude naquele lugar, afinal, onde os sábios a instruíram e a treinaram para que um dia, exercesse sua função da melhor maneira possível. Ainda sim, não conseguiu impedir que parte de si se entristecesse ao perceber o descuido cobrando seu preço.

O Templo do Amanhecer, como outrora fora conhecido, tinha sido uma bela e enorme construção com cinco torres com a do meio sendo a maior delas. De longe, o conjunto nas cores branca, verde, vermelha e dourada pareciam quase tocar o céu de uma maneira extremamente delicada. Um toque ínfimo e nada mais.

Um misto de sentimentos inundou seu peito, saudade sendo um dos principais. Sentia saudades de sua vida no templo: de seus colegas, com quem aprendera a lutar e a servir aos espíritos que os protegiam. Dos anciãos, que se tornaram sua família durante o todo o tempo em que estivera ali e do tempo em que milhares de vidas não dependiam de si. Sua vida era bem mais simples, mas isso não significava dizer que não estivesse satisfeita com tudo que conquistara desde que saíra vitoriosa de seu Conclave, tantos anos atrás.

— Está tudo bem, Khun Fa? — Engfa foi tirada de seus pensamentos pela voz suave de Meena, sua segunda em comando.

A comandante voltou sua atenção para a garota ao seu lado. Meena era alta assim como ela e detinha uma expressão calma.

— Sim, sim... São apenas as memórias que tenho deste lugar. Não sabia que ainda eram tão fortes. — A garota mais nova assentiu suavemente em compreensão.

— Entendo que não é um assunto da minha conta, mas sinto que preciso lhe dizer algo importante... — Seu tom saiu um tanto quanto ansioso, o que chamou a atenção da comandante.

Engfa a encarou com o cenho levemente franzido, indicando sua curiosidade. Meena geralmente era quieta e não se metia em assuntos para os quais não fora chamada, então se estava pendido autorização para falar algo a respeito de algo tão pessoal... deveria ser realmente importante.

— Diga — pediu suavemente, indicando que não estava irritada com o pedido.

Meena não respondeu de imediato, mas a comandante esperou pacientemente enquanto tentava esconder a curiosidade. Por fim, a mais nova finalmente respondeu, em um tom de voz que não era mais alto do que um sussurro.

— Vai ser diferente dessa vez.

Engfa quase se sobressaltou ao ouvir as palavras e se voltou completamente para a outra mulher. A comandante observou cuidadosamente, analisando a feição relaxada da outra guerreira. Havia algo de diferente em seus olhos, no entanto: eles pareciam distantes, como se estivesse vendo algo através dela.

— O que quer dizer com isso? — A pergunta soou mais nervosa do que pretendia, e ela se xingou mentalmente por isso. Não era como se a outra mulher precisasse saber disso.

Apesar da vontade de dizer mais, manteve-se em silêncio, procurando respeitar o momento e Engfa entendeu que ela não diria mais nada.
Ela suspirou e retirou as grossas botas antes de adentrar o local sagrado, deixando a outra garota de guarda do lado de fora.

Percorreu os corredores lenta e tranquilamente, se permitindo lembrar de quantas vezes realizara aquele trajeto quando ainda era apenas uma criança se preparando para um futuro que, na época, parecia estar tão distante. Um bolo se formou em sua garganta quando se lembrou dos risos compartilhados e das brincadeiras com as outras crianças.

Seu caminho a levou até o Bot — ou ambiente principal — onde encontrou a enorme estátua de Buda completamente banhada em ouro. Aos seus pés, não havia nenhuma flor ou incenso como de costume, mas Engfa não se permitiu pensar em mais nada relacionado ao passado, antes de se ajoelhar na frente da estátua, mantendo a coluna reta, e unir ambas as mãos na frente do corpo, na ancestral postura de reza que lhe fora ensinada.

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