Capítulo 29 - Sorriso mordaz

366 37 111
                                    

Charlotte Austin
Tailândia
Terra dos Abençoados

Charlotte soube que algo estava prestes a mudar quando olhou o céu naquela manhã: estava ainda mais escuro do que o normal, mesmo que já fizesse quase um mês inteiro que não visse completamente a luz do sol.

É estranho, pensou, que eu tenha me acostumado a não sentir mas aquele calor que sempre tomei como algo certo e garantido em minha pele há tanto tempo.

As nuvens estranhamente carregadas e acizentadas enfeitavam a paisagem cotidianamente desde que chegara ali, mas naquela manhã em especial, pareciam ainda mais densas do que antes. Outra pista, foi não ter visto nenhum sinal da constante presença de Menino, Menina ou da anciã que sempre a esperava para o desjejum.

Não havia um único sinal de suas companhias, restando apenas um ambiente frio, quase tão inóspito quanto Charlotte acreditou que fosse quando o viu pela primeira vez. A diferença, era que aquela era a primeira vez que estava realmente sozinha naquele local.

A ômega chamou pela anciã e pelas crianças — embora não realmente esperasse conseguir uma resposta verbal dessas —, mas não obteve qualquer resposta. Tentou chamar por qualquer espírito que pudesse estar ali, mas nenhum deles respondeu ou enviou qualquer sinal de que estava sendo ouvida.

Todo o local pareciam novamente abandonado, apesar dos cuidados zelosos da ômega e da anciã, que o tinham transformado em algo próximo de um lar. Naquele momento, no entanto, era como se absolutamente nada tivesse mudado.

Charlotte engoliu em seco, mas se lembrou das palavras da anciã, alertando-a que deveria manter a mente aberta e para não abusar da boa vontade dos espectros caso quisesse evitar ser punida.

Retirou um pouco de neve do parapeito da janela, antes de ir ao pequeno aposento onde fazia regularmente seus méritos, mas algo chamou rapidamente sua atenção: um vulto rápido e alto que passou rapidamente de alguma parte daquele andar e surgiu novamente no pátio que estava há alguns metros abaixo, parando bem embaixo da janela, e encarando fixamente Charlotte com os olhos glaciais.

Acho que chegou a hora. Deixando o material, mas não a intenção, que usaria nos méritos para trás, desceu a pequena escada que levava até o primeiro nível o mais rapidamente que conseguiu, saindo do templo em seguida.

Foi quando percebeu que o pátio a céu aberto era muito maior do que pensara até então, visto que englobava uma pequena parte da floresta e uma pequena área na parte de trás da construção principal.

Charlotte se lembrou quando Davikah cogitou uma conversa com os monges quando ainda estavam em Bangkok, e ela foi prontamente contra a ideia. Naquele momento, perguntou-se se aquela não teria sido uma reação de seu subconsciente, por causa das visões que tivera na Lua de Sangue, ao que quer que estivesse prestes a acontecer.

Algo dentro dela talvez ja soubesse o que estava por vir naquela ocasião, mas como Charlotte não sabia absolutamente nada sobre suas habilidades, não foi capaz de compreender as imagens e a mensagem por trás delas. Tampouco conseguiu entender os sinais que seu próprio corpo e mente enviaram pra alerta-lá.

O espírito que a esperava preferiu adotar a mesma forma daquele que a visitou no quarto de Engfa, quase um mês antes. Os olhos fluorescentes a encaravam com a cabeça levemente curvada, a avaliando.

As mãos também eram levemente retorcidas em garras longas que pareciam feitas de gelo, mas a ômega pensou em como a entidade provavelmente as usava com inimaginável destreza.

Charlotte se aproximou até parar à sua frente, o encarando de uma maneira que deixasse claro o respeito que sentia, principalmente ao unir suas mãos na frente do corpo, um pouco acima da cabeça, e curva-lo lentamente em saudação.

Hiker Spirit (Englot version)Onde histórias criam vida. Descubra agora