O tempo acabou

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Com o passar do tempo, a neve diminuiu um pouco. Você supôs que a primavera havia chegado naquele lugar, mas discretamente, como se o próprio sol fosse inimigo da bruxa, como se não quisesse iluminar a paisagem com seus raios.

Depois da primeira semana de espera, nada havia mudado. Tudo estava como sempre, calmo, talvez calmo demais. Apenas alguns telefonemas normais interromperam sua solidão pacífica.

Alcina, ou Karl, ligava de vez em quando com a desculpa de saber como estava sua família. Segundo eles, era o comportamento habitual. Você sabia que aquelas ligações eram mais do que isso. Eram verificações de rotina de que tudo ainda estava no lugar e nada havia mudado.

Depois de tantos dias, você quase teve a ilusão de esquecer. Se você não conseguia ver Miranda, ela não existia. Não faria sentido você estar assustado, alerta, dormindo com uma faca debaixo do travesseiro. Não, essa não era a maneira de passar o que claramente seriam seus últimos dias de vida.

Donna, concentrada em suas solas e bonecas, ficou um pouco desestabilizada, sofrendo crises cada vez mais frequentes. Era demais para ela. Você não podia forçá-la a viver uma vida normal, a não gritar o nome da filha enquanto ela batia a cabeça. Era um panorama sombrio, que você conseguia controlar graças aos seus poderes.

Você precisava dela bem. Você precisava da amorosa e sorridente Donna, então decidiu esquecer tudo isso por um tempo. Pelo bem dela, pelo bem de todos.

Para sua surpresa e deleite, funcionou, tranquilizando sua esposa. Bem, esposa por meio de palavras, mas esposa mesmo assim. Você não precisou de nenhum documento absurdo para se casar com ela. Você fez isso há muito tempo. Valeu a pena para ela, valeu a pena para você também. Vocês seriam esposas para sempre.

Com a ajuda inestimável de Angie, aos poucos a casa voltou à relativa normalidade. A pergunta era a mesma de todo aquele tempo, a mesma que você se fazia quando rolava na cama, antes de se entregar ao sono: Por quanto tempo?

“Mas estique-os bem”, protestou Donna, colocando uma fita métrica sobre seus braços enquanto você zombava dela se movendo.

“Ok, ok…” Você disse sorrindo, finalmente obedecendo ao seu estranho pedido. “Ei, o que você está fazendo?”

Donna sorriu maliciosamente, mordendo o lábio enquanto escrevia alguns números em um pedaço de papel.

“Estou medindo você, tesoro . Achei que pareceria óbvio...” Ela disse suavemente, virando você, passando a fita em volta da sua cintura.

“Bem, sim, é bem óbvio…” Você disse suspirando.

“Não se mova”, ela disse, ela estava séria, focada. Você adorava o jeito como ela trabalhava, aquele olhar intenso e estudioso. Ela era tão meticulosa…

“Desculpe, desculpe,” você disse, permanecendo rígido enquanto ela murmurava coisas que você não entendia. “Sério, Donna, por que você está fazendo isso?”

“É uma surpresa”, disse a senhora de preto, sorrindo, escrevendo mais números naquele papel.

“Ah, bem, se é uma surpresa...” Você respondeu com algum humor. “Talvez eu tivesse ficado mais surpreso se você não estivesse fazendo isso.”

  “Eu... Bem, eu não tinha suas medidas,” ela sussurrou, um pouco envergonhada.

“O que você vai fazer para mim? Algo gostoso?” Você perguntou com uma voz intrigante, quase como uma criança na véspera de Natal.

“Quero fazer um vestido para você. Um especial…” Donna finalmente reconheceu, rolando a fita métrica em suas mãos, com uma expressão derrotada.

The Hell I want to stay inOnde histórias criam vida. Descubra agora