Um

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1 mês depois

Toda vez que se via refletindo sobre a vida, chegava a mesma conclusão: era muito curta para ter medo e fazer tanta merda inconsequente, coisa que o morto à sua frente fez de rodo. Um conhecido de algum tempo, um velho cliente ganancioso e poderoso. Sempre achou que tais pontos como ganância, ambição exacerbada, poder e entre outros não trouxessem algo de bom, pelo contrário, trazia à tona o pior do ser humano.

Olhava para o corpo deposto no caixão de luxo, não tinha nenhum tipo de pena ou remorso sobre o que aconteceu entre eles, estava tudo sob seu controle e contrato. Parou para observar ao seu redor, a esposa se encontrava sendo consolada por seus filhos, coitados, pensou Ayla. Sempre pensou se a família sabia o que seus clientes faziam, mas no final das contas, sequer era importante para ela.

Arfou cansada daquele local pesado. Arrumou seus óculos escuros e saiu do local ao som do batuque de seus saltos, choro e de algumas pessoas fofocando algo que ela mesma já sabia e não dava importância, adoraria se aquelas informações rolarem soltas. Sorriu com a própria maldade.

— Ao menos não foi antes do meu dia de pagamento. — murmurou guardando seus óculos no porta-luvas de seu carro. Sentiu seu celular vibrar no bolso de seu blazer, atendendo sem pressa. — Alô?

  — Bom dia, meu amor. Tudo bem?

Sorriu ao ouvir o som da voz de sua tia. Colocou o cinto de segurança enquanto conectava seu celular ao Bluetooth do carro para poder dar partida.

— Bom dia, tia. Tudo sim, acabei de sair do enterro do sr. Lee. E com a senhora?

— Nossa, que pena... Eu fiz bolo, vai vir aqui, não é? Faz dois dias que a senhorita não dá as caras.

— Ah, sim, sim. Pretendia passar aí na saída daqui. A senhora fez aquele bolo de chocolate que eu pedi?

Salivou pensando no bolo que sonhava fazia algumas semanas e sempre ficava na vontade.

— Claro, me perturbou tanto.

Ayla riu.

— Chego em alguns minutos, senhora Celeste, estou dirigindo.

— Cuidado nesse carro! Menina irresponsável, viu, Hong? Ela está no telefone enquanto dirige de novo! — Ayla conseguiu ouvir seu tio reclamando de fundo para que ela prestasse atenção no trânsito. Ela riu. — Tchau! Dirija com cuidado.

Não deu tempo de responder antes que a senhora desligasse. Antes de continuar o caminho até a casa de seus tios, parou em um supermercado e comprou o doce favorito de sua tia, como sempre fazia quando ia visitar. Deu continuidade ao trajeto até chegar na casa onde viveu por 5 anos antes de se mudar para seu primeiro apartamento. A nostalgia sempre se fazia presente quando subia nos poucos degraus que levavam até a entrada da casa que se destacava por seu estilo latino, ao contrário das outras que eram típicas coreanas.

Ayla buscou seu molho de chaves destrancando a porta sem rodeios. A entrada era decorada com pinturas que ela própria tinha feito no ensino médio em sua época artística, que infelizmente não durou muito.

— Cheguei.

Colocou sua bolsa em cima da mesa ao lado da porta e manteve apenas a sacola e adentrando a casa bem decorada. Não tinha mudado muito desde que se mudara, tirando poucos detalhes que dona Celeste atualizava de tempos em tempos.

— Trouxe aquele doce de banana do supermercado brasileiro? — Ayla assentiu, sorrindo fechado. — Oh, que beleza!

Celeste não demorou muito para alcançar sua sobrinha, primeiro buscando seu tão amado doce e depois abraçando forte a mulher. Os cabelos cacheados da tia cheiravam a shampoo brasileiro – algo que Ayla sempre tentava importar para elas, a qualidade de shampoo para cacheadas era muito inferior na Coreia.

— Ayla, querida, você vai deixar sua tia diabética — Hong, esposo de tia Celeste, disse.

— Cala a boca, Hong — Celeste se afastou. A pele negra da mulher estava reluzente, e Ayla pensou em como ela não tinha mudado quase nada nos últimos anos. Havia apenas alguns fios de cabelo brancos acumulados na sua têmpora. — Ayla apenas está demonstrando como me ama, isso se chama inveja.

A pequena briga se estendeu até a cozinha, Ayla os seguiu rindo a todo momento.

— Da próxima vez trago paçoquita pro senhor.

Bateu carinhosamente no ombro do senhor rindo e passando pelo mesmo para se sentar em uma das cadeiras da cozinha. Dona Celeste não demorou para guardar seu pote de doce e pôr na mesa o bolo de chocolate de sua sobrinha.

— Tia... A senhora é a melhor do mundo. — Não esperou para ser servida, ela mesma apanhou a faca de serra e se serviu. Suas papilas gustativas gritaram de felicidade pelo gosto familiar. Sentiu que tinha ido ao céu e voltado em segundos. — Já falei hoje o quanto amo a senhora?

— Falou agora. — a senhora se sentou ao seu lado. — Você fica tão fofinha suja de chocolate. Me lembra quando chegou aqui.

Ayla parou para olhar para sua tia que a olhava boba. Mas ela nunca tinha tempo de responder a mais velha, pois sempre Celeste a interrompia e mudava de assunto.

— Mas me diga, do que aquele senhor faleceu?

— Celeste...

— Hong, deixa de ser chato! Eu sei que você também está curioso.

O senhor deu de ombros e voltou a preparar seu café para depois de sentar junto com sua esposa e sobrinha. Ayla terminou de engolir antes de começar a falar.

— Parece que ele teve uma parada cardíaca na noite anterior e foi encontrado pela esposa. — Levou mais um pedaço do bolo para sua boca.

— Nossa! Ele era tão novo... — Celeste apoiou seu rosto em sua mão. — Mas ele te pagou, não foi?

— Celeste! — Ayla ria sem parar. Nunca se cansava de ver seu tio tentando conter a esposa sem limites.

— Pagou, sim.

— Menos mal. — Levantou ignorando a expressão de indignação do marido. — Eu fiz algumas coisinhas para você levar, não é bom seu hábito de comer comida rápida, senhorita Cecília!

Concordou sem pestanejar, seria loucura negar comida caseira do seu país natal. Passaram o resto do dia conversando e assistindo reality de idols na sala e no final da tarde Ayla chegava em seu apartamento com as mãos lotadas de sacolas com potes enormes de comida e sendo recebida pela gata de pelagem clara e longa que miou logo ao ver sua dona. Correu até a cozinha para colocar as sacolas na bancada para pegar a gata nos braços.

— Oi, Tequila, sentiu falta da mamãe? — Tequila miava em resposta enquanto Ayla checava se o comedor e o bebedouro, ambos automáticos, estavam cheios e funcionando de acordo. — É mesmo, meu amor? Que dia difícil você teve, bebê.

A gata continuava miando manhosa agarrada como um bebê em sua dona. A mulher entrou em seu quarto e foi até seu notebook levantando a tela, ainda carregando Tequila conversando em seu colo. Abriu seu email para checar novas mensagens e a primeira do topo chamou sua atenção.

De: jeonjungkook@cypher.com
Para: aylacavalcante@email.com
Assunto: Solicitação de reunião.

Não se deu ao trabalho de abrir, sabia do que se tratava e preferia lidar com aquilo mais tarde. Colocou Tequila na cama a contragosto dela para que pudesse alcançar seu maço de cigarro.

Tinha total noção que era um hábito que alguma hora precisaria mudar, sua tia havia a repreendido mil vezes, mas sempre dava a desculpa de que era controlada e fumava apenas para relaxar – o que era verdade.

O cheiro de nicotina invadiu suas narinas e os efeitos começaram a chegar em seu cérebro. Pensou no semestre que se iniciaria naquela semana e consequentemente teria menos tempo para trabalhar, levantou seu olhar para a cidade estava especialmente linda naquele início de noite, as luzes se acendiam aos poucos e Ayla encostava calma na varanda. Ficou triste quando seu cigarro acabou, mas o apagou para entrar e ouvir o miado alto.

— Tequila, às vezes queria mesmo saber falar gatês para entender o que tanto você mia.

Sorriu andando até o banheiro da suíte sendo acompanhada pela gata. Ayla gostava de sua vida e não mudaria algo apesar do passado não ser dos melhores, pelo simples motivo de sempre ter em sua cabeça que o que importava era o presente e justamente era isso que já estava ótimo para ela.

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