Capítulo 5 - Janeiro, 2021

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Depois que fiquei com Rafaela, finalmente deixei de me sentir a estranha, a anormal. Com ajuda da terapia e das conversas com Luana, a minha homossexualidade foi se assentando na minha cabeça e fui me sentindo cada vez mais confortável com o fato de ser lésbica.

Luana ficou empolgadíssima com a minha "nova descoberta" e queria que eu recuperasse o tempo perdido. Mesmo com nossa vida corrida de médica, ela queria que eu fosse para muitas festas e bares e pegasse todas as mulheres possíveis. Consegui me esquivar de algumas, mas acabei indo a outras. Conheci algumas mulheres e fiquei com poucas, mas só uma delas acabou na minha cama. Foi na festa de Réveillon. Roberta também era divorciada de um homem e tinha uma filha. A categoria mãe-divorciada-lésbica parecia que não era tão incomum como eu pensava.

Dia 05 de janeiro foi meu aniversário de 29 anos. Apesar de ser uma terça-feira, consegui folga do hospital. Então, resolvi não levar Dudu para a escola e passei o dia com ele na casa dos meus pais. Meu pai tinha até conseguido trocar o dia dele no trabalho para poder passar o dia comigo. Pois é! Meu pai ainda era porteiro, mesmo nós, os filhos, insistindo para que ele deixasse o emprego. Ele relutava toda vez que a gente tocava no assunto, dizia que gostava do trabalho dele, se sentia útil e não conseguiria passar o dia em casa sem fazer nada. E, claro que apoiamos a decisão dele. Nessa altura, Guma e eu tínhamos conseguido comprar para eles uma casa maior, melhor e num bairro mais tranquilo. Finalmente, realizamos nosso maior sonho: melhorar as nossas vidas.

Apenas Martim ainda morava com meus pais. Estava no último ano da faculdade de Engenharia de Software na Universidade Federal e era o verdadeiro nerd da família. Estava com 22 anos e namorava uma garota que estudava com ele. Formado há três anos em Direito também na Universidade Federal, Guma tinha passado, um ano depois da formatura, num concurso e se tornado promotor de justiça. Estava noivo de Carla, uma psicóloga que era irmã de um amigo de faculdade.

Depois do almoço, meu pai foi tirar um cochilo com Eduardo e minha mãe e eu ficamos conversando na sala. Nesse momento, recebi uma mensagem de Rafaela. Depois que ficamos, nos falamos algumas vezes, por telefone e por mensagens, mas não deu certo nos encontrar, porque ela viajou logo depois, passando, inclusive, o Ano Novo fora da cidade. A mensagem me desejava felicitações pelo aniversário (ela sabia meu aniversário, porque tínhamos conversado sobre signos), informava que ela estava de volta na cidade e, por fim, dizia que queria muito me ver. Após lê-la, espontaneamente sorri, o que não passou despercebido por minha mãe.

— Que sorriso bobo é esse, hein, filha?

Tomei um susto com a pergunta. Desfiz o sorriso e travei o celular sem responder.

— Nada demais. Um meme que vi aqui no Instagram.

Ela deve ter acreditado, porque mudou de assunto. Minutos depois decidiu fazer café. Aproveitei a ida dela à cozinha e respondi a mensagem:

"Obrigada! Que bom que vc tá de volta. Quero te ver tb. Pode ser hj? Podemos comemorar meu aniversário no fim do dia. Que tal?"

"Só dizer hora e lugar"

"20h, minha casa"

Assim que minha mãe retornou com o café, perguntei se ela poderia ficar com o Dudu naquela noite, porque queria sair com alguns amigos. Menti de novo e não gostava disso. Eu não era mais adolescente. Era uma mulher adulta e independente, que não tinha motivo para esconder nada. Mesmo assim, julguei que aquele dia não seria um bom dia para comentar com minha mãe que eu era lésbica.

No meio da tarde, Guma e Martim chegaram na casa dos meus pais e ficamos conversando em família até o início da noite. Esses momentos eram tão bons para mim. Me revigorava demais. Amava a companhia deles. O dia estava virando noite quando meu pai saiu para fazer umas compras no mercantil mais próximo e minha mãe levou Dudu para o quintal que tinha atrás da casa para brincar com ele e mostrar a linda horta que ela tinha feito lá.

A+B=∞ - A expressão de um amor improvávelOnde histórias criam vida. Descubra agora