Capítulo 2

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Rain Bennett

⁠"Quando morre alguém, em geral necessitamos de motivos de consolo, não tanto para mitigar a dor quanto para ter uma desculpa por nos sentirmos tão facilmente consolados."

 - Friedrich Nietzsche

***

Meus pés estão doloridos e escorregadios, ficar plantada sob a marquise do hotel não estava nos meus planos. A chuva piorou tudo, as previsões diziam que o calor não sairia por nada, então não trouxe um agasalho.

A van ainda não chegou e ninguém atendia minhas ligações, mas felizmente, eu sei que vou embora daqui.

Minhas amigas planejaram uma viagem de verão, eu não poderia arrumar uma desculpa melhor que essa. Mackenzie me mataria se eu não fosse e Jude encheria meu saco por meses, parece que minha presença foi confirmada sem autorização ou vontade própria.

Minha burrice serviu como auxílio para o plano delas, ambas estavam agindo de maneira estranha esses dias, como se estivessem escondendo alguma coisa. Hoje pela manhã, Jude me ligou e disse que eu iria em uma viagem de final de semana, na verdade, a ideia delas é me convencer de que preciso "me divertir uma vez na vida".

Para elas, ler livros não é uma forma de se divertir e eu estou sendo entediante. Eu disse que não estava no clima, que viajar agora não faz sentido e obviamente não funcionou. Mackenzie veio com aquele jeitinho dela e disse que é exatamente por isso que eu preciso ir, nós três nos conhecemos quando éramos crianças e não desgrudamos mais.
Então, tudo tem uma forma de acontecer e eu nunca digo não, eu sabia que elas queriam me tirar daqui. Talvez eu me sinta melhor com elas e não fique me lamentando por dentro, só não sei se uma viagem vai mudar isso.

Inesperadamente, minha van finalmente surge no horizonte, ver seus faróis cortando a névoa era animador. Fiquei esperando por horas, meu corpo estava lutando contra o cansaço e quase gritava de sono. Pela primeira vez, eu estou feliz em sentir vento soprar meus cabelos para longe do rosto.
Quando a porta se abriu, eu notei que haviam pessoas demais naquele veículo:
"Olá senhorita, desculpe-me pela demora. Esses passageiros acabaram perdendo o horário de embarque" -Disse o motorista, ele parecia cansado e irritado com toda situação também.

"Tudo bem, estou sem pressa" -Respondi, tentando ser mais tranquila e educada possível, mas meus colegas de transporte pareciam ser diferentes. Eles me encaravam de cara amarrada e olhavam todas minhas bagagens com desgosto

Dentro da van, o ar estava pesado com uma tensão incomum, o único lugar vazio era aos fundos e tentei ser cautelosa ao observar a família à minha frente.

Tinham 6 pessoas ao total: um senhor e uma senhora de idade, uma mulher mais jovem, que acredito ser mãe da criança ao meu lado, um homem barbudo e um garoto da minha idade. A menininha ao meu lado me encarava ferozmente e ele falava algo nos seus ouvidos, mas não se preocupava em falar baixo. Sua voz era rouca e soava como um chiado, quanto mais tempo os cochichos duravam, seus olhos fixaram-se ainda mais em mim e davam a impressão de desconforto.

Além disso, a mãe dela me encarou por longos segundos, sem piscar.

Até que uma senhorinha quebrou o silêncio com uma pergunta curiosa, em outro idioma:
"Essa menina não estava no casamento na praia?" -Disse abruptamente, notei que minhas aulas de alemão finalmente vão me dar algum retorno.

"Sim, não se lembra dela? É a filha de Alina Bennett" -A mulher diz com certeza, enquanto o homem da barba imensa me encara.

"Ela não é muito velha? Achei que fosse o primeiro casamento dela." -A senhora parecia chocada, mas os outros não ficaram para trás.

"Ela traia o atual marido?" -Lançou o homem,  sacudindo a cabeça em negação e rindo.

"Ela é viúva, seu ex marido foi assassinado pelo cunhado." -Disse o garoto, tentando fingir desinteresse na conversa.

Escutar cada comentário, fazia meu coração disparar e lembrar da minha situação.

Eu só quero ir para casa e sair daqui, mas o trajeto parecia infinito. O ar dentro da van estava sufocante e as conversas ao redor estavam abafadas, tudo que eu consigo pensar é o momento em que finalmente vou mandar todos para casa do caralho e nunca mais vê-los.

Tiefen ( Em revisão de escrita)Onde histórias criam vida. Descubra agora