Estavam vivendo na casa a três dias - três dias longos de muito trabalho e cansaço mas também de muita realização. Estava ficando claramente com a cara dos dois, mesmo Ramiro não entendendo nada sobre decoração. Pra ele só a cama pra dormir e um sofá pra sentar tava de bom tamanho.
— Ramiro, é nossa primeira casa, eu não vou deixar nada aqui sem graça — disse Kelvin ao namorado quando ele disse que não precisava de tudo aquilo — ...ah depois que a gente voltar de São Paulo vamo ter que tirar um retrato pra pendurar na sala.
— Tá bão meu amor, faz o que cê achar melhor, certeza que de qualquer jeito vai fica bunito.
— Aham...e depois que voltar a gente precisa fazer um jantar pra nossos amigos, você chama a Aline, o Caio, o Dante e eu...sei lá trago a Angelina.
Kelvin riu mas esse distanciamento dos amigos do bar estava acabando com ele, chorava durante o dia quando ficava sozinho em casa e lembrava que a essa hora ele estaria fofocando e rindo com Iná e Zeza.
Não queria mostrar essa tristeza pra Ramiro, com medo de ele entender que estava insatisfeito com a vida ao lado do preto que apenas começou.
Por outro lado encarava essa viagem pra São Paulo como um escape pra seus pensamentos depressivos, estava ansioso pra finalmente ver gente e lugares diferentes.
Já Ramiro estava apavorado - depois da alegria que sentiu quando o patrão mostrou confiança em si ao dar tarefa tão importante a ele, começou a ponderar todas as possibilidades, teria sair da zona de conforto que criou em Nova Primavera e conhecer gente, falar de assuntos que ele entendia mas tinha medo de não conseguir por em palavras.
— Kevinho...se eu travar na hora de falar com os administrador lá da fazenda... cê me ajuda? — pediu ao namorado — cê sabe como que eu sô.
— Claro meu dengo — deixou o que estava fazendo e foi até Ramiro, o abraçou beijou o pescoço do preto — mas você vai se sair bem, você ta muito mais solto ultimamente, vai dar tudo certo.
Cada dia mais nossos pombinhos iam criando intimidade, Kelvin ensinava muito mais que letras a Ramiro, ensinava algo que o peão pensou não ser possível aprender era algo que não tinha nome, nem explicação mas ele sabia que estava ali.
O peão estava muito mais espirituoso ultimamente, ainda tinha seus momentos de querer se esconder no quarto longe de todos mas conseguia conversar com as pessoas, puxava assunto, sentia de verdade que as pessoas poderiam gostar dele, sentia que tinha uma personalidade.
Mas ainda abaixava a cabeça para o que as pessoas diziam, sem discordar, tinha medo de briga. A única vez que discordou de Kelvin foi por conta da cor de uma tinta que o loiro comprou pra pintar o quarto deles. Ramiro detestou a cor laranja, preferia a parede branca como já era, disse isso ao rapaz sem pensar muito antes.
'Não gostou Rams? jurei que você iria gostar, mas tudo bem, amanhã a gente pega uma que agrade nós dois' disse com uma carinha triste e o preto quis se bater por ter dito aquilo 'Tudo bem Kevinho, pinta com esse cor de laranja memo, eu num dô bola não' o que Kelvin respondeu com um rolar de olhos 'da bola sim Ramiro, você mesmo disse que não gostou e tá tudo bem'
~
— Essa é a última, pequetito — encaixou a mala no carro com certa dificuldade — pra quê esse tanto de coisa? vai ficar pra lá é? eu num deixo não viu..
— Sabe porque tanta coisa? — perguntou entrando no carro — tive que colocar coisas suas ai também, já que o bonito pegou três calças, três camisas, três cuecas e três pares de meia pra DEZ DIAS.
— Benzinho...
— Ramiro, você está errado — deu um olhar assassino para o homem e o fez calar na hora.
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inefável
RomanceRamiro, peão analfabeto recém chegado na cidade conhece Kelvin, garoto de programa. O sonho de Ramiro é aprender a ler e escrever para por em palavras o que tem em si. Kelvin conhece precariamente as palavras e mesmo assim é toda a ajuda que ele pr...