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Joana

Acordei com a luz suave do sol atravessando as cortinas do quarto, criando padrões dourados sobre os lençóis. Levei alguns segundos para me lembrar de onde estava e, quando meus olhos se ajustaram ao ambiente, me dei conta de que Marc ainda dormia no sofá. Sua respiração era leve, quase imperceptível, e o silêncio ao nosso redor contrastava com a agitação dos meus pensamentos.

A conversa da noite anterior ainda pesava na minha mente. A intensidade daquele momento, a confissão de Marc, e a decisão que tomamos de dar um passo para trás... tudo parecia tão claro naquela hora, mas agora, com a luz do dia, me perguntei se havíamos feito a escolha certa.

Levantei-me com cuidado, tentando não fazer barulho. Vesti uma camiseta e shorts, me preparando para enfrentar a manhã sem acordá-lo. Precisava de ar, de um momento só meu para processar o que estava acontecendo.

Saí do quarto e caminhei pelo corredor do hotel até o terraço. Quando abri a porta, o ar fresco de Barcelona me envolveu, trazendo um alívio imediato para a tensão que eu nem sabia que estava carregando nos ombros. A cidade estava viva, como sempre, o som distante dos carros, das pessoas começando o dia. Olhei para o horizonte, para as ruas que pareciam se estender infinitamente, e tentei acalmar a confusão dentro de mim.

Por que tudo entre Marc e eu tinha que ser tão complicado? Não era como se eu não sentisse algo por ele. Na verdade, era exatamente o contrário. O que me assombrava era a sensação de que, se nos entregássemos a isso agora, poderíamos perder algo essencial. E, pior ainda, perdermos a nós mesmos no processo.

- Joana?

A voz suave e rouca de Marc me tirou do transe. Me virei, vendo-o parado na porta do terraço. Ele vestia uma camiseta simples e jeans, o cabelo bagunçado da noite de sono. Seus olhos, embora ainda marcados pela conversa da noite anterior, estavam calmos. Ele se aproximou lentamente, parando ao meu lado.

- Desculpa - ele disse, com um sorriso hesitante. - Não queria te assustar. Eu vi que você tinha saído e pensei...

- Tudo bem - interrompi, tentando não transparecer a agitação que sentia. - Só queria um pouco de ar fresco.

Marc assentiu, virando-se para olhar a cidade ao meu lado. Ficamos em silêncio por um momento, mas não era o mesmo silêncio carregado de tensão de antes. Era mais leve, quase confortável. Talvez ambos estivéssemos tentando nos acostumar com essa nova dinâmica, com essa decisão de não complicar as coisas... pelo menos por enquanto.

- Eu não queria que a nossa conversa de ontem deixasse as coisas estranhas entre nós - Marc disse, quebrando o silêncio. - Na verdade, não sei se consegui expressar exatamente o que sinto.

Me virei para ele, encarando seus olhos sinceros, tentando entender o que se passava em sua mente.

- Não está estranho, Marc - eu disse com um sorriso pequeno. - É só... complicado.

Ele riu baixinho, balançando a cabeça.

- É, acho que complicado é a palavra certa para a gente.

Marc deu um passo para mais perto da mureta do terraço, apoiando os cotovelos ali e olhando para o horizonte. Fiquei ao seu lado, sentindo o calor do sol começar a aquecer o ambiente. A proximidade de Marc não me deixava nervosa como antes, mas ainda havia uma sensação de que estávamos navegando em águas incertas.

- Sabe o que é engraçado? - ele começou, sem me olhar diretamente. - Quando a gente se conheceu, nunca pensei que estaríamos aqui, nesse ponto. Na verdade, pensei que você fosse só... uma pessoa que cruzou meu caminho por acaso.

Eu sorri, lembrando de como tudo começou. Nossa amizade nasceu de encontros casuais, momentos descontraídos, e aos poucos, sem que percebêssemos, algo mais profundo foi surgindo.

- Eu também nunca imaginei - respondi, com sinceridade. - Mas a vida tem uma maneira engraçada de complicar as coisas, né?

Marc virou-se para mim, seus olhos finalmente encontrando os meus. Aquele olhar intenso que ele tinha, sempre cheio de perguntas não ditas, agora parecia mais claro, como se ele tivesse encontrado uma resposta, ou ao menos aceitado que nem tudo precisava ser respondido imediatamente.

- Joana, eu não quero que isso - ele fez um gesto entre nós - seja algo que nos consuma. Acho que a gente precisa deixar as coisas acontecerem no tempo certo. Sem pressa, sem pressão.

Eu assenti, aliviada por ele estar na mesma sintonia que eu. Estávamos ambos tentando entender como equilibrar nossos sentimentos com as realidades de nossas vidas, e, por mais difícil que fosse, havia uma sensação de que estávamos no caminho certo.

- Concordo - disse suavemente. - Vamos viver um dia de cada vez. E ver onde isso nos leva.

Marc sorriu, aquele sorriso que sempre me trazia uma sensação de paz, e estendeu a mão em minha direção, como um gesto de trégua, de entendimento.

- Um dia de cada vez - ele repetiu, enquanto nossos dedos se encontravam brevemente, num toque simples, mas cheio de significado.

E, assim, sob o sol quente de Barcelona, decidimos não forçar nada. Havia muito a viver, muito a descobrir, tanto sobre nós mesmos quanto sobre o que sentíamos um pelo outro. As entrelinhas ainda existiam, mas agora havia um acordo silencioso entre nós: o de respeitar o tempo e o espaço que precisávamos.

Quando voltamos para o quarto, a leveza da manhã estava conosco. Não havia mais aquela tensão sufocante, mas sim uma nova perspectiva. Sabíamos que, eventualmente, precisaríamos enfrentar o que estava acontecendo, mas por enquanto, bastava apenas estar presentes, sem pressa para definir o futuro.

E foi com essa tranquilidade que seguimos o dia, cada um dando um passo em direção ao desconhecido, mas sem medo do que estava por vir.

Alô-bernalOnde histórias criam vida. Descubra agora