Capítulo 16
A noite estava fria, e o silêncio no casarão de Salvatore parecia sufocar os pensamentos de Thamy. Deitada na cama, seus olhos fitavam o teto, mas sua mente estava em outro lugar, perdida nas lembranças que a assombravam. O peso no peito aumentava com cada suspiro, e ela soube que não conseguiria dormir.
Incerta, Thamy levantou-se, vestiu um casaco e saiu discretamente para o jardim. O ar gelado da noite tocou seu rosto, e as estrelas, brilhantes no céu escuro, pareciam observá-la com indiferença. Seus passos eram leves, mas dentro dela havia um turbilhão. Sentia-se afogada nas lembranças, como se cada passo adiante fosse arrastado de volta ao passado.
Os últimos dias tinham sido confusos. Ela se via presa entre duas realidades: o que havia deixado para trás e o que se encontrava diante de si. Seus traumas a seguiam, sombras silenciosas que ecoavam as humilhações que ela havia suportado. A dor de ser vista apenas como um objeto de desejo, o desprezo da sociedade, os olhares de julgamento. Parou perto de uma fonte no jardim, as lágrimas enchendo seus olhos sem permissão. Tudo parecia ser demais.
Com um soluço preso na garganta, Thamy abraçou a si mesma. Estava exausta. Seu passado parecia gritar cada vez que encontrava um momento de paz, como uma ferida que jamais cicatrizava. A sensação de solidão era esmagadora, mesmo agora, cercada pela beleza do jardim e o silêncio da noite.
Foi então que ouviu passos. Seu corpo enrijeceu, mas, ao virar-se, encontrou Salvatore. Ele a observava, a expressão indecifrável, mas seus olhos carregavam algo que ela não conseguia evitar. Ele havia visto suas lágrimas, e isso a fez sentir-se ainda mais vulnerável.
— Não consegui dormir — disse ele, a voz baixa e suave. — Vi você aqui fora... e achei que talvez quisesse companhia.
Thamy virou o rosto, limpando apressadamente as lágrimas, tentando manter a compostura. Salvatore, no entanto, aproximou-se sem pressa. Não a forçava a falar, mas sua presença era inevitável.
— Às vezes, a noite piora as coisas — murmurou ele, parando ao lado dela. — Faz a gente lembrar do que preferiria esquecer.
Ela não respondeu de imediato. Estava exausta demais para lutar contra as emoções que ele despertava. Quando finalmente falou, sua voz era um sussurro hesitante.
— Eu me sinto... perdida, Salvatore. Como se... como se o passado ainda estivesse me perseguindo, e eu nunca pudesse me libertar dele.
Ele não disse nada por um longo momento. Em vez disso, gentilmente, passou um braço ao redor de seus ombros, puxando-a para perto. O calor de seu corpo contrastava com o frio da noite, e, mesmo relutante, Thamy deixou-se relaxar contra seu peito. A sensação de ser vista, de ser compreendida, era ao mesmo tempo reconfortante e assustadora.
— Você merece mais do que o que a vida te deu até agora — Salvatore sussurrou contra seu cabelo. — Eu vejo quem você é, Thamy. E isso... é mais do que suficiente.
Ela fechou os olhos, sentindo o peito dele subir e descer. Como ele conseguia entender sua dor com tão poucas palavras? Salvatore também tinha suas próprias cicatrizes, ela sabia disso. Havia algo em sua presença que despertava nela a sensação de aceitação, algo que nunca tinha experimentado antes.
— Eu não sou perfeita — murmurou Thamy, as lágrimas ainda escorrendo. — Eu não sei se posso confiar... em você, ou em qualquer pessoa.
Salvatore suspirou, mas não se afastou.
— Não estou pedindo sua confiança agora. Só estou pedindo que não se feche. Deixe-me estar aqui, pelo menos esta noite.
O silêncio se instalou entre eles, mas não era desconfortável. A mente de Thamy fervilhava de perguntas, de dúvidas sobre o que estava acontecendo. Por que Salvatore a afetava tanto? Ele representava perigo de tantas formas, mas também era o único que a fazia sentir-se visível.
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Salvatore Romero: Dançado com o perigo
Ficção GeralMartina Moretti sempre encontrou na dança sua maior paixão e liberdade. Raptada ainda bebê e levada da Itália para o Brasil, foi criada com o nome de Thamy Costa por uma família adotiva que jamais lhe deu amor. Crescendo em um ambiente de desprezo e...