Parte 22

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Condenado a persegui-la por todos os lugares como uma alma que perdeu o direito de descansar sem nem mesmo um olhar de reconhecimento, enfraqueço meus ossos nessas ruas escuras. A lua outrora vangloriava seu luar com as estrelas pelas ruas simplórias, na suavidade todos se encantavam com a sublime claridade, agora desaparece pelas nuvens carregadas de sentimento. Será que eu apenas retratei como me sinto na paisagem ou elas percebem o semblante do meu olhar vazio? De qualquer forma, os meus ossos estarão corroídos nos vermes escondidos na terra antes que a tempestade resplandeça no meu espírito. Ah, como fui deixar enganar pelos meus olhos que alimenta os prazeres da carne antes mesmo de constatar os alicerces do seu coração corrompido pela sua imoralidade? Entretanto, como me coloco na posição de julgar, se com esses mesmos olhos, afastei a pureza e sublime sentimento da pessoa que amou mesmo antes de me tocar? Ah, vida! Roubou metade da minha juventude com lamentações sobre o destino do meu espírito, porque não foi o suficiente a mancha encrustada na alma, porque as feridas deveriam refletir diretamente sobre minha pele. Ah, céus! Que agora se comove, pela minha carcaça ambulante flagelada, sei por que as nunca estiveram nuvens escurecidas em tamanha expiação o seu temor sobre minha redenção. Uma risada, um sinal explicito sobre a indiferença do sofrimento alheio, ecoa das redondezas em deleite porque seu espírito se renova de esperança dia após dia. Eu reconheço a pessoa quando se aproxima; Vivienne caminha abraçada numa silhueta engolida pela má iluminação. E ela que esta indiferente.

-- Nos divertimos muito.

-- E ainda ira pela surpresa que preparei para esta noite. 

Eles comemoram entre risos e abraços. Eu reconheço essa voz grave, mas ela está diferente. Falta-se Um toque de arrogância velada com a sutileza, como se o dono dominasse suas características para usá-la quando necessário. Minhas acusações foram embasadas; Alberto estava caminhando com uns dos braços adornando a cintura de Vivienne. A convicção impera sobre seu olhar de que essa noite seria inesquecível, ela sorria ingenuamente apoiada em seu ombro. Assim que me viu não conteve a empolgação.

-- Caio – Ela me abraçou. -- Eu não me recordo se você chegou a conhecer o Alberto ou se afinidade foi só de vista, mas agora você irá poder conhecê-lo. -- O seu incomodo e visível; seus músculos estão retraídos em sua pele enquanto ele tenta esboçar simpatia.

-- Acredito que já nos conhecemos, mas permita-me dizer, sua pessoa não é forte o suficiente para ser lembrada – Ele apertou a minha mão.

-- Eu falei muito de você para o Caio, até mostrei umas de suas cartas... são todas impecáveis! Digo que são simplórias comparadas ao resplendor que transborda em seu coração, entendo perfeitamente sua agonia para transmitir majestosamente a sua devoção.

-- Eu me lembro – Disse, fixei meu olhar para compreender suas emoções, mas ele e imóvel como uma pedra para que eu detectasse algum desconforto. -- Eu até comentei de que palavras lindas deveriam ser executas pela tamanha maldição que carregam... pois não e fácil mostrar o tempo todo o sentimento que unicamente nutri por alguém.

-- Como uma de suas várias demonstrações vamos assistir uma encenação de teatro que ele me concedeu – Vivienne disse animada. -- Venha conosco, você não atrapalhará de modo algum.

Alberto permaneceu calado o tempo todo. Eu sabia que ele estava escondendo alguma mancha vermelha, porque suas palavras perfeitas o condenam, entretanto nunca imaginei que seria algo tão leviano. Onde estaria Rebecca? Será que ela obtém conhecimento do seu caso extraconjugal? O interior do teatro me fascinou, as paredes eram adornadas em ouro com pequenos detalhes que pareciam ser desenhados a mão. Os bancos da plateia eram revestidos em pele de cordeiro tingido em vermelho carmesim, o chão era mármore branco polido como se os caminhos ligassem diretamente as passagens do céu. O paraíso para alimentar os caprichos humanos. Agora o que não entendo; por que com anos mirando nessa cidade nunca frequentei lugares de revestimentos clássicos como nos últimos dias? Alberto parecia estar muito familiarizado enquanto ele nos acomodava nas poltronas do centro, proporcionando uma visão completa de todos os elementos do palco. Vivienne ficou entre nós. Era visível seu incomodo, tanto que ele pediu licença e foi para atras do palco com a desculpa de olhar a preparação. Não conseguia olhar de outra forma sem sentir pena dela, pois está muito encantada com as palavras doces da pessoa que julga ser seu amado que não consegue nem passar pela sua mente a ideia de estar sendo enganada. Entretanto, de qual forma sem ser gentil que ela esperaria ser tratada pelo homem que escreve cartas escorrendo paixão? Caberia a mim dizer que essas palavras são tolas e seu amor e impiamente concebível no seu coração quando não consegue livrar sua alma das impurezas da carne? Teria eu o direito de condenar o seu corpo a imoralidade e seu coração a dor da rejeição? Não, mesmo que fosse certo... não posso trair sua felicidade de forma errônea. Algumas pessoas aceitam a realidade que são condizentes o tamanho da forca do espírito. Porém, e se fosse uma forma do destino prover minha carta de liberdade me mostrando que coisas levianas não podem permanecer debaixo do pano? Eu não poderia contar nada... se somente a Rebecca soubesse...ela estaria com o coração livre para reconhecer a paixão que venero por ela. Todo mundo sairia ileso das trapaças do destino. O que April pensaria para resolver uma situação como essa? Digamos que se fosse eu, e alguém estaria no seu caminho atrapalhando seu objetivo, não mediria esforços para estar comigo... bem, mesmo depois de morta não desistiu. Ah, afasta de mim esses pensamentos que insistem alimentar a própria felicidade... egoísmo estupido!

Aqueles Dias CinzentosOnde histórias criam vida. Descubra agora