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Marcella Rossi

25-01-2024

Estou de pé em frente ao espelho, ajustando meu cabelo com uma precisão quase obsessiva. A luz suave da manhã filtra-se pela janela da minha luxuosa casa em Verona, refletindo nas superfícies brilhantes e nas obras de arte que escolhi a dedo. Como executiva de vendas de luxo, cada detalhe é crucial, e hoje não é exceção. Construí uma vida de sucesso, cercada por marcas exclusivas e eventos glamorosos, mas, por trás dessa fachada perfeita, existe um vazio que me assombra. Desde o incidente na adolescência, aprendi a esconder minhas fraquezas sob uma camada de frieza e controle. Sou conhecida pela minha astúcia e determinação, mas poucos sabem da luta interna que carrego.

Enquanto preparo um leilão importante, olho pela janela e vejo a cidade acordando, cheia de possibilidades e segredos. A adrenalina começa a fluir, misturando-se à ansiedade. Preciso provar que sou mais do que apenas uma mulher de negócios; preciso mostrar ao mundo que posso ter controle total, mesmo que, por dentro, eu só queira desaparecer.

- Marcella! - ouço a voz animada da Francesca antes mesmo de ela bater à porta.

Sem esperar uma resposta, ela entra no meu quarto, trazendo consigo aquela energia vibrante de sempre. Está com o cabelo preso num coque bagunçado, uma blusa cheia de estampas de flores, típica dela, e um sorriso que não desaparece.

- Franci, eu estou ocupada. Tenho um leilão no dia 27, e ainda não terminei a organização. - Suspiro, largando o caderno da faculdade em cima da cama.

- Sim, sim, o leilão... - ela faz um gesto desinteressado com a mão. - Mas o que me importa agora é o teu aniversário! É dia 28, e não vais escapar este ano. Vamos comemorar, e não adianta inventar desculpas!

- Franci, tu sabes que eu não gosto de comemorar o meu aniversário.

- Pois é, por isso mesmo é que eu estou aqui, para mudar isso. - Ela pisca o olho, como se já tivesse um plano perfeito na cabeça. - Olha, já sei que vais estar ocupada até ao pescoço com o leilão, que, por sinal, vai acabar tarde, mas o que achas de no dia 28 a gente faltar às aulas? Podemos passar o dia a cuidar de nós, fazer umas massagens, arranjar o cabelo... E à noite vamos a um bar, só para relaxar. Seria o aniversário perfeito!

- Faltar às aulas, Franci? A sério? Tu sabes que eu tenho que estar a par de tudo na faculdade, não posso dar-me ao luxo de faltar. - Levanto-me da cadeira e começo a andar pelo quarto, tentando organizar os pensamentos.

- Não exageres, Marcella! Só um dia. Não vai matar ninguém. - Ela senta-se com as pernas cruzadas na minha cama, fitando-me com aquele olhar esperançoso. - Vai ser giro. Tu precisas disso. Precisamos as duas.

Suspiro de novo, sentindo a pressão crescer dentro de mim. O leilão, o trabalho, as expectativas. E agora Francesca, sempre com as suas ideias de festas e celebrações, empurrando-me para algo que eu preferia evitar. Desde pequena, nunca gostei de aniversários... Não depois de tudo o que aconteceu.

- Vamos lá, Mar - ela insiste. - Um barzinho no final da noite. Só nós duas, umas bebidas, talvez alguns amigos... Sem grandes confusões. Vai ser bom para ti. Prometo.

Olho para ela e, por um momento, hesito. Talvez ela tenha razão. Talvez eu devesse dar-me a chance de... respirar. De viver um pouco fora da rigidez que imponho a mim mesma. Mas ainda não estou pronta para concordar.

- Eu vou pensar no assunto - respondo finalmente.

Ela sorri, satisfeita, sabendo que esse "vou pensar" é quase uma vitória. "Boa. Agora, concentra-te no leilão. E no dia 28, vamos faltar às aulas." Solto uma risada baixa. Francesca sempre soube como me convencer, mesmo que eu relutasse em admitir.

Francesca é minha melhor amiga desde a primária, é como uma irmã. Às vezes, chego a pensar que meus pais gostam mais dela do que de mim. Ela está em design de moda e já usei alguns vestidos feitos à mão por ela em galas importantes. Já eu, estudo gestão de negócios, que é mais uma formalidade, pois já trabalho em um cargo bem importante. Sou executiva de vendas de luxo, e o que faço atualmente é organizar leilões, algo que realmente amo. Fui convidada para apresentar um leilão inteiro no dia 27, e isso me deixa bem ansiosa.

A minha família? Bem, meus pais são ambos italianos. Meu pai gerencia os negócios do meu avô, que era um renomado comerciante na região. Ele é filho único, e, como não tenho irmãos, sou neta única também. Minha mãe é educadora de infância, apaixonada por crianças e pelo seu trabalho. A minha avó materna não tem muito contato comigo; ela é divorciada e, a única vez que ouvi meus pais falarem sobre meu avô, foi que ele era alcoólatra e teve uma vida conturbada.

Enquanto sigo ajustando meu cabelo, a insegurança se mistura com a determinação. O leilão se aproxima e, apesar do peso que sinto, sei que é minha chance de brilhar. Mas, no fundo, a luta entre o desejo de controle e a necessidade de conexão continua a me atormentar.











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A Ironia do DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora