you dont know me.

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stu macher.

O fim da aula chegou e o corredor estava um caos, cheio de gente indo pra casa, mas, para mim, só uma pessoa importava. Billy estava parado ali, encostado na parede, o rosto tenso, como se estivesse a mil quilômetros de distância, mesmo estando no mesmo maldito corredor que eu. Não sei por que, mas tinha algo nele hoje que me fazia querer mais do que a provocação habitual. Algo na forma como ele se isolava de todo mundo, até mesmo de mim, me irritava. E, bem, eu precisava cutucar.

- Ei, Loomis - chamei, me aproximando com aquele sorriso que eu sabia que o incomodava. Billy levantou os olhos lentamente, mas o olhar dele era vazio, distante. - Amanhã tem festa na casa da Tatum. Vai colar?

Nada. Ele só continuava me olhando, como se estivesse esperando eu me enrolar nas minhas próprias palavras. Não era exatamente novo, mas hoje parecia diferente. Mais pesado.

- Mickey, Nancy, todo mundo vai estar lá - continuei, tentando soar leve. - E você devia vir também, sabe, pra tirar a cabeça dos livros. Vai ser divertido, até você precisa disso, não é?

Billy continuava em silêncio, mas dava para ver o desconforto nos ombros dele, a maneira como ele apertava a mandíbula. Ele estava prestes a explodir, e eu estava curioso pra ver até onde poderia empurrá-lo.

- Vamos, cara - insisti, dando de ombros como se não fosse grande coisa. - Um pouco de diversão. Um pouco de álcool. Quem sabe você até sorri uma vez.

Finalmente, ele abriu a boca, mas o que saiu foi como uma bofetada.

- Eu não vou andar com você ou seus amigos. - ele disse, com a voz baixa, porém firme. O olhar dele me perfurava, como se estivesse exausto de mim. De tudo.

Droga, parece que ele acordou virado no giraia hoje. Que porra, será que homens têm TPM?

Eu arqueei a sobrancelha, tentando manter a postura despreocupada, mas aquilo me pegou desprevenido. Ele não estava apenas dizendo "não". Aquele filho da puta estava cuspindo desdém.

- E o que tem de errado com eles? - perguntei, mais defensivo do que pretendia. - Não são tão diferentes de você, quer dizer, esteticamente sim... Mas você me entendeu.

Ele me encarou, os olhos estreitos, cheios de uma frieza que me dava nos nervos.

- Não, Stu. Eu não te entendi, como pode achar que eu sou parecido com eles em algum grau? - ele disparou, a voz cheia de desprezo. - Essa gente só faz merda, vocês vivem brincando com coisas que não entendem. Eles não têm ideia do que estão fazendo com a vida deles. E nem você.

Meu corpo inteiro ficou tenso. Quem ele pensa que é pra falar dos meus amigos assim? Como se ele fosse alguma coisa além de um garoto mimado, escondido atrás de uma fachada de frieza e controle. No fundo, talvez eu soubesse o que estava realmente acontecendo. Ele estava tentando me colocar no meu lugar. Me fazer sentir pequeno como se estivesse acima de tudo isso. E isso me irritava de um jeito que eu não conseguia controlar.

- O garotinho da mamãe acha que é melhor do que todo mundo, né? - respondi, um sorriso amargo surgindo no meu rosto. - Eu já vi esse filme antes, mano, e você só se fode. Sempre se achando superior, olhando de cima como se fosse alguma coisa especial, mas não passa de um moleque mimado. Você nem sabe o que é viver de verdade. Fica aí, preso no seu mundinho de porcelana, fingindo que é melhor do que todo mundo.

Os olhos dele faiscaram, eu sabia que tinha atingido um ponto sensível.

Billy Loomis nunca falava de sua vida. Falou poucas coisas na última noite, talvez estivesse confortável naquela hora. Mas talvez não houvesse imaginado que tudo o que ele escondia, estava mais estampado em seu rosto do que nunca.

Stuart não era idiota. Se aquele rapaz queria brincar com fogo, então Stu Macher jogaria álcool na pequena chama.

- Nunca precisei dessas festas ridículas pra me sentir vivo! - ele rebateu, a voz mais alta agora, carregada de frustração.

- É óbvio que não, você nem ao menos sente algo! Como pode falar alguma coisa de mim desse jeito?!

- Tá vendo? Você vive achando que tá no controle de tudo, é o centro das atenções. Cara, se liga, você não é tão importante assim.

Aquilo me atingiu fundo, e eu senti a raiva subindo como um calor intenso. Ele não tinha o direito de falar isso. Ele não sabia nada sobre mim. Sobre o que eu sentia.

- Ah, é? E você, Loomis? Grande coisa que você é - soltei, cruzando os braços, o tom venenoso. - Um cara que nem consegue enfrentar os próprios demônios sem se esconder atrás dessa pose de fodão. Acha que não dá pra ver? Você tem tanto medo de sentir alguma coisa que prefere se afastar de todo mundo. Me diz, Billy, o que isso te dá? Acha que tá no controle porque fica bancando o insensível? Se toca, cara.

Ele me olhou com uma raiva que eu nunca tinha visto antes. Por um momento, achei que ele fosse me bater. E, parte de mim, queria que ele tentasse. Mas talvez só estivesse magoado. Realmente magoado. Talvez tanto que nem conseguia me responder, ou talvez eu que não havia lhe dado a chance.

Ficara ali, me encarando com aqueles grandes olhos castanhos e um semblante aborrecido, suas linhas de expressão estavam menos marcadas agora, como se estivesse apenas me esperando terminar com aquele show.

Mas de algum jeito, eu não conseguia.

Ele havia me ofendido. Como um cara como eu podia deixar isso passar? Deixar todo o meu orgulho e amor próprio de lado, incluindo a lealdade aos meus amigos e ao meu estilo de vida alternativo, apenas por causa de Billy Loomis? Eu acho que não.

- Sabe o que mais, Billy? - Falei, me aproximando, na verdade, quase colando meu rosto ao dele. - Você acha que é tão diferente, mas tá tão perdido quanto qualquer um de nós. Só que você é covarde demais pra admitir isso. Enquanto você se esconde nas sombras, a gente tenta descobrir quem realmente somos. Ao contrário de você, que fica sempre preso à suas notas acadêmicas e qualquer outra merda desse tipo.

Billy ainda me fitava, a respiração pesada, os olhos cheios de uma mistura de ódio e algo mais. Ele abriu a boca, pronto para soltar outra ofensa, mas parou. Ficamos ali, cara a cara, como dois animais prontos pra brigar. Mas, no fundo, eu sabia que não era só raiva. A linha entre o que a gente sentia era tão tênue que era difícil saber onde terminava o ódio e começava.. Aquela outra coisa.

- Você não me conhece, Stu.. - ele disse, a voz mais baixa, quase como um sussurro agora. - E nunca vai conhecer.

Ele deu as costas e saiu, me deixando ali, com um nó na garganta que eu não conseguia desatar. Eu queria gritar alguma coisa, qualquer coisa, mas as palavras ficaram presas. E, pela primeira vez em muito tempo, me senti pequeno diante dele. E eu odiava isso.

Que porra. Eu fodi com tudo mais uma vez.

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