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Eu cito o endereço para ela. Ela faz mais algumas perguntas
inúteis e me informa que um carro está a cerca de cinco minutos de
distância. Ela me pede para ficar na linha, mas eu não fico.
Eu desligo a chamada. Minha pequena sombra não vai ficar tempo
suficiente para que a polícia apareça e o pegue. Ele vai desaparecer na
floresta de onde saiu, e nunca será encontrado. Eu sei disso.
Não consigo ver seus olhos, mas sustento o seu olhar de qualquer
maneira. Com um último sorriso, ele digita uma mensagem rápida. Meu
telefone toca, mas não olho de imediato.
Estou muito assustada para isso.
E sem nenhuma preocupação na porra do mundo, ele se vira
lentamente e se afasta. A escuridão se estende e o agarra, engolindo-o
em suas profundezas até que ele desapareça completamente.
Quando o carro aparece, eu quero que ele vá embora. Por razões
que não consigo explicar, lamento ter chamado a polícia. Eu só... quero
que ele vá embora.
O policial é um homem gordo, com cabelo loiro curto e rosto
avermelhado. Parece que ele quer estar em qualquer lugar, menos aqui.
Eu me sinto exatamente da mesma forma.
— O que está acontecendo aqui, senhora? — pergunta ele,
bufando e ofegando ao subir a varanda da frente.
— Um homem estava do lado de fora da minha janela — digo
brevemente.
— O-ok — diz ele, enquanto se alonga. — Isto já aconteceu antes?
Eu digo que fiz vários boletins de ocorrência, mas que este homem
invadiu minha casa nos últimos meses. Depois de contar-lhe as
experiências anteriores, ele puxa um bloco e começa a escrever o
boletim.
— Você disse que seu nome era Adeline Reilly, certo?
— Sim.
Ele para de escrever e olha para mim como se estivesse vendo uma
pessoa diferente.

— Você não é aquela que fez o Archibald Talaverra desaparecer do
seu alpendre? — ele pergunta, olhando-me de cima a baixo, parando no
meu peito por um segundo longo demais, como se meus peitos fossem
lhe dar a resposta.
— Sim — retruco, ficando impaciente.
Ele resmunga algo e volta a escrever.
— Você acha que foi o mesmo cara?
— Seria uma merda se não fosse — murmuro. Quando o policial
só me olha de lado, eu suspiro. — Sim, eu acho.
Ele deixa de escrever depois disso e me faz mais algumas
perguntas habituais. Se tenho uma descrição, ou sei quem ele pode ser, e
assim por diante. Eu lhe dou todas as informações que tenho, exceto o
que é mais importante.
Eu não lhe falo sobre as mensagens de texto. Não sei por que, mas
elas parecem... privadas. O que é uma estupidez do caralho. Não faz
sentido, mas não posso me fazer dizer nada. O policial sai sem
absolutamente nenhuma informação útil. Mas ele ainda sai com um
boletim de ocorrência, e isso é o que é importante.
Só depois de tomar um banho quente e me ajeitar na cama é que li
sua mensagem.
DESCONHECIDO: Quanto mais você me desobedecer,
mais duro será o seu castigo.
***
— Vou encontrar esse merdinha de merda — Daya declara com
raiva, praticamente batendo as chaves em seu laptop, enquanto ela digita
Deus sabe o quê. Acabei de contar a ela os detalhes da noite passada.
Tomo um gole da minha bebida. Não é o suficiente, então tomo
outro. E depois acabo tomando a coisa toda.
Ambas estamos fazendo nossos respectivos trabalhos, mas ela não
quis me deixar sozinha em casa, agora que minha sombra está
começando a interagir mais.

— Merdinha e merda são a mesma coisa — digo eu. Ela olha para
cima, seu rosto refletindo exatamente meus pensamentos desde ontem à
noite. O que há de errado com você?
Eu encolho o ombro.
— Só estou dizendo. Você acabou de chamá-lo de merdinha de
merda.
Ela revira os olhos e me ignora, voltando a digitar no laptop.
Provavelmente invadindo algo, embora eu não consiga imaginar o quê. É
melhor não ser meu celular. Eu tenho fotos nua ali.
Meu rosto fica pálido. Ah, Deus, e se ele invadir e as encontrar?
Eu me inclino para pegar o telefone e apagar todas as fotos mais
picantes, e depois apagá-las uma segunda vez da lixeira.
Um pouco da minha ansiedade se acalma, mas não tudo. Ele já
poderia ter hackeado e eu nem saberia.
Vou ficar paranoica com isso pelo resto da minha vida.
Percebendo minha crise interna, Daya se concentra em mim, sua
testa franze com preocupação.
— Você está bem, garota?
Eu limpo minha garganta.
— Qual é a probabilidade de ele poder hackear o meu telefone e
encontrar meus nudes? — Os lábios dela se contraem e estou a dois
segundos de lhe esbofetear o rosto.
— Menina, aquele homem provavelmente já a viu ficar nua no seu
quarto mil vezes agora.
Meus olhos se arregalam ainda mais, não tendo ainda considerado
isso.
— Ai, meu Deus.
— Por que você pergunta? — questiona Daya, sua voz cheia de
desconfiança.
Eu aperto meus lábios, pensando. Neste ponto, a única coisa que
me impede de contar a Daya sobre as mensagens é sua raiva iminente.
Por fim, ganhando coragem, apresso-me para dizer:

Assombrando Adeline Onde histórias criam vida. Descubra agora