A luz cheia brilha no céu noturno, o céu estrelado sem nenhuma nuvem. Rafael balança as pernas sentado no muro na entrada de Paraisópolis, olhando atentamente para os carros passando na Avenida. Ele suspirava alto, faziam-se horas que ele estava esperando Daniel retornar, rezando para que ele ficasse bem.
Rafael olha para o chinelo branco, era verdade que a princípio ele odiou a ideia de ter uma babá como Daniel, mas o tempo que passou com ele, as brigas e discussões fúteis trouxeram um ar divertido na vida dele. Ter um mal-humorado como companheiro às vezes parecia divertido. Talvez tenha sido aquela noite de luxúria na casa de Filipe, que trouxe sentimentos românticos pelo rapaz mais velho.
Rafael levanta a cabeça, os olhos encaram o ônibus parar no ponto. Ele segue com o olhar o veículo voltar a andar, levando algumas pessoas para outro lugar da cidade. Rafael suspira pesado, como se tivesse um peso em seu peito, sufocando sua respiração.
— O que eu falei sobre o toque de recolher? — A voz irritada de Daniel força Rafael a olhar para o lado, seus olhos brilham vendo o rapaz ainda vestido com o uniforme da ROTA. Daniel joga a bituca de cigarro no chão e se aproxima, a marca vermelha de bala na bochecha e orelha.Rafael ainda se sentia culpado pela ferida. — E desde quando o policial sabe sobre o toque de recolher? — Rafael brinca assistindo Daniel parar na frente dele. O mais velho coloca a mão no rosto do moreno e o empurra para trás, fazendo-o cair para trás com uma risada maliciosa. Rafael cai no chão sentando, ele revira os olhos e levanta, batendo as mãos na bermuda.
— Cala a boca. Tá parado aqui por que? Tava esperando o papai aqui? — Daniel brinca com uma risada no final da frase.
— Estava esperando o Gabriel, mas ele ainda não voltou do hospital, ele foi ver o Filipe. — Rafael explica se aproximando um pouco, os dois se encaram por alguns segundos. Daniel suspira pesadamente, ele desvia o olhar para o lado. Aquele dia foi corrido até para ele, que está acostumado com a perseguição. — Você está bem?
A pergunta de Rafael tira Daniel dos pensamentos, ele passa uma mão no rosto, cansado. — Deixei o carro na Berrini e vim de ônibus...eles querem mesmo acabar com a gente. Meu, se eles matarem o Filipe já era pra gente, ficamos vulneráveis, sem os planos dele não teremos como pensar rápido. —Daniel fala caminhando lentamente para dentro da favela. Rafael segue ao lado.
— Filipe é tão importante assim?
— É ele que faz os planos...ele chegou junto com Gabriel neste lugar. A princípio fiquei receoso de confiar neles, já que eram de fora da quebrada, mas com o tempo eles receberam meu respeito. Filipe rapidamente conseguiu mostrar ser um grande estrategista, talvez pelo fato dele ter vindo do interior, sabe, caipira...vaqueiro...ele sempre tem umas ideias absurdas. — Daniel dá de ombros olhando para frente, os olhos cansados, o corpo querendo descansar daquele dia.
— É...ele falou que ia me ensinar a cavalgar...
— Vai tomar no cu, não vai cavalgar com ele não, mano!
— E quem falou que você manda em mim, mermão?
— Eu.
— Sua palavra é igual vagabunda, ninguém quer algo sério.
Daniel lança um olhar irritado para Rafael, que responde com o mesmo olhar. O mais velho cruza os braços e levanta a cabeça, tentando mostrar superioridade, o brasão da ROTA se mexe um pouco. — Vai brincando com a sorte, filho da puta. Vou fazer você engolir todas essas porra de palavras. — Daniel ameaça avançando um pouco sobre Rafael, o empurrando, sem tocar, para o muro de tijolos.
— Sai daqui, Daniel! Você é insuportável. Você sabe que falo a verdade. — Rafael tenta rebater, ele bate as costas no muro e levanta os braços. Ele fecha os punhos olhando profundamente nos olhos castanhos de Daniel, preparado para iniciar uma luta corporal. Mesmo não tendo altura ou força para ir contra Daniel, ele ainda tentaria segurar o máximo possível dos possíveis socos ou agressão.
— Não me vem com essa, meu, eu estou desconfiado que você está xisnovando a gente. Desde o dia que você apareceu na quebrada só vem polícia aqui, fala a verdade, eu não vou matar você agora, vou esperar você explicar para depois encher de bala. — Daniel ameaça, ele descruza os braços. Rafael engole em seco, ele estava aprisionado entre Daniel e o muro, mesmo que ele quisesse correr para os lados, Daniel teria o total controle dos movimentos. Podendo-o pegar com facilidade.
— Daniel, acredite em mim! Eu não sei o que está acontecendo, é sério, eu não estou falando nada. Nem mesmo minha tia sabe onde estou e no que estou me metendo. É sério, Daniel, eu não estou caguetando vocês pra ninguém. — Rafael fala, os olhos desviam do rosto de Daniel para a pistola na cintura dele. O medo de ser morto a sangue frio pelo mais velho cresce como um fogo na floresta.
Rafael começa a tremer, rezando mentalmente para Daniel ter pena dele. O mais velho estreita os olhos, não convicto da resposta. Ele agarra o pescoço de Rafael e o levanta com facilidade, os dedos apertam, enforcando o menor. O moreno segura no braço de Daniel, tentando fazê-lo soltar o pescoço.
— Daniel…por favor…
— Escuta seu filho da puta, eu mato você se estiver falando da gente. Não pensa que terei pena de uma puta como você, porra. — Daniel aperta ainda mais o pescoço, o rosto de Rafael fica vermelho, as lágrimas aparecem em seus olhos. Daniel abre a boca para continuar falando, mas fecha ao ouvir o barulho do carro se aproximando.
— Bolacha? Entra no carro, quero conversar com você. — A voz rouca de Gabriel faz Rafael suspirar de alívio. O mais velho solta o pescoço do moreno, deixando-o cair no chão para recuperar o fôlego. Rafael tosse alto colocando a mão dominante no pescoço, ele fecha os olhos respirando fundo, pegando o máximo de oxigênio possível.
— O que você quer? — Daniel olha por cima do ombro e depois para o moreno em sua frente, ele hesita, mas se afasta. Gabriel olha de canto de olho para Rafael, que estava tremendo de medo agora que finalmente conseguiu recuperar o fôlego perdido.
— Filipe está bem, ele fez a cirurgia e retirou a bala alojada, vai ficar alguns dias no hospital em observação até receber alta...entra no carro, quero conversar com você sobre uma coisa. — Gabriel bate os dedos no volante, impaciente com a teimosia de Daniel.
— Estou ocupado, Ratão. Estou fazendo esse garoto confessar que está traindo a gente. — Daniel range os dentes olhando para Rafael no chão.
— Não temos um x9, Bolacha...temos um policial no nosso meio. Deixe o moleque em paz...ele não é quem estamos procurando. Entra logo no carro...e traga ele.
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[+18] Códigos do Crime
FanfictionRafael, um rapaz de 20 anos, mudou-se da Cidade de Deus, Rio de Janeiro, para conviver com sua tia na favela de Paraisópolis, São Paulo. Desconhecido das regras da comunidade paulistana, sua vida é forçada a mudar de direção quando foi classificado...