Daniel passa a mão no cabelo, os olhos focados em Gabriel no meio da sala. Os dois se encaram brevemente, ele não podia acreditar naquilo que Gabriel havia dito para ele, muito menos nas palavras de Filipe. Daniel fecha os olhos com força, como ele deixou isso chegar a tal ponto? Um policial infiltrado no meio deles como um aliado. Daniel suspira alto balançando a cabeça, o peso de suas ações pesam como uma âncora em suas costas.
Daniel tratou mal Rafael durante esse tempo, pensando que o moreno fosse um traidor. Mas na verdade ele sempre foi inocente, apenas estava no lugar errado e na hora errada. Ele não merecia aquele tratamento, aquela tortura psicológica que Daniel sempre fazia com ele.
Rafael balança lentamente a cabeça, admirado com o raciocínio de Filipe em analisar a situação toda.— Eu gostaria que ele falasse pessoalmente com você, mas sabe como o caipira é...dorme às 21:00 e acorda 05:30, essa hora da noite ele deve estar sonhando plantando os pés de maconha dele. — Gabriel brinca, ele sabia que seu melhor amigo, Daniel, estava com dificuldade para raciocinar tudo aquilo.
— Caralho… — Daniel sussurrou apertando a cabeça com as mãos. Ele morde os lábios, não conseguindo acreditar em nada daquilo. Gabriel se afasta, caminhando para a cozinha do apartamento, deixando Daniel e Rafael sozinhos.
Rafael levanta da poltrona e senta no sofá, ao lado de Daniel. Ele levanta a mão e toca no ombro do mais velho, esfregando suavemente, tentando confortá-lo. Daniel abre os olhos e vira a cabeça para o lado, ele estava envergonhado, mas não demonstrava.
— Está tudo bem, Daniel...vamos acreditar no Filipe, você mesmo disse que ele é alguém muito importante e de confiança. — Rafael sussurra olhando profundamente nos olhos de Daniel. O mais velho ri de forma amargurada. Ele revira os olhos tirando as mãos da cabeça.
— Eu odeio sua positividade. Eu odeio você, porra... você é... caralho, meu, eu odeio como você mexe comigo. Eu odeio esse seu sorriso estúpido. — Daniel sussurra a última parte, ele respira fundo e inclina-se para o lado, na direção de Rafael. O moreno apertou o ombro do mais velho, chamando sua atenção. Daniel olha para a mão de Rafael em seu ombro, seus olhos se desviam para o moreno segundos depois.
— Daniel...você é um filho da puta. E está pagando pelas consequências... você me magoou muito durante esses dias. Você não tem ideia do quanto eu queria chorar e desaparecer toda vez que você abria a boca...mas, eu gosto quando você é legal comigo, eu... sinto meu coração se encher de alegria quando você me trata como um ser humano e não um cachorro. Na verdade, acho que você trataria um cachorro melhor do que me tratou.
Daniel fecha os olhos com força abaixando a cabeça, sua consciência repetindo as palavras de Rafael vez após vez. Torturando. As mãos de Daniel tremem, ele coloca ambas nos joelhos e abre a boca para falar, mas as palavras permaneciam presas em sua garganta.
— Desculpa. — Era a única palavra que Daniel conseguia pronunciar naquele momento.
— Se desculpas pudessem curar, não existiriam médicos, Daniel...quando eu estava na Cidade de Deus, eu corria risco de tortura e estupro, diariamente esse era meu pesadelo. Infelizmente foi a minha realidade, tudo para proteger minha mãe. Você acha que eu, alguém que foi forçado a vender o próprio corpo, trairia vocês? Já tendo presenciado várias mortes e torturas pelos traficantes do Rio, você acha que eu sou masoquista a esse ponto? De desejar minha morte de uma forma tão cruel e sádica? Daniel, você nunca pensou direito, você sempre agiu por instinto, como um animal.
Daniel permanecia de olhos fechados, aceitando tudo que Rafael falava a seu respeito. O moreno toca na bochecha do mais velho e inclina-se ainda mais, os lábios tocam suavemente a orelha de Daniel.
— Você me fez sofrer mentalmente da pior maneira possível, e agora quer pedir desculpas? O que você é, Daniel? Me bate e depois pede desculpas? Achando que vou voltar feito um cachorrinho para você? Eu gosto do seu lado rebelde e atrevido, mas odeio ele também...porque me machuca. Quem devia odiar algo aqui seria eu, e não você. — Rafael se afasta levantando do sofá. O moreno virou, caminhando para perto da sacada aberta.
Um suspiro alto assusta Rafael, o moreno olha por cima do ombro, os olhos se encontram com os de Gabriel encostado no batente da porta da cozinha. — Será que estou atrapalhando o casalzinho? — Gabriel pergunta com uma sobrancelha levantada.
— Já terminamos de conversar...na verdade...eu não queria nem mesmo ter essa conversa com ele, mas foi preciso. — Rafael volta a olhar para frente, admirado com a vista dos prédios.
Gabriel se desencosta do batente e se aproxima de Daniel sentado no sofá, ainda atordoado com as palavras de Rafael.
— Daniel, você entendeu o que Filipe quer? Você pode descansar amanhã e no próximo dia começar a tatuar nossos aliados. Também as meninas, eu confio nelas, mas...
— Acredito que Filipe já saiba quem é o traidor. Mas só precisa da confirmação da sua hipótese. — Daniel finalmente fala, ele abre os olhos e levanta a cabeça, olhando para Gabriel. — São 3 códigos diferentes: o primeiro será o código de Traição, o segundo é um código qualquer, sem importância, enquanto o terceiro é o código do crime que foi cometido. Filipe quer forçar o policial a achar que ele está marcado para morrer, uma armadilha para que consigamos encontrá-lo.
— Sim, a polícia já sabe dos códigos, então eles virão ao nosso encontro...Filipe tem uns planos sádicos...por isso gosto dele. — Gabriel sussurra a última parte esfregando a mão no queixo, pensando na conversa que teve mais cedo com Filipe.
— E o RJ? Falou com ele?
— RJ está no mandelão com a namorada dele. Amanhã conversarei com ele, quando estivermos descendo para a baixada negociar a nova droga que estou planejando comprar. — Gabriel cruza os braços, caminhando pela sala de um lado para o outro.
Daniel acena com a cabeça, ele levanta e caminha em direção a sacada. O vento frio noturno entra pela porta de vidro aberta. Rafael inclina-se no parapeito, não acreditando no quão luxuoso era o apartamento de Gabriel. — Rafael?
Rafael olha por cima do ombro, ele desvia o olhar ao perceber ser Daniel chamando seu nome. O moreno volta a olhar para os prédios, anda chateado.
— Olha...não somos mais crianças, vamos conversar como adultos. — Daniel se aproxima mais, ficando ao lado de Rafael. Ele coloca as mãos no parapeito, encarando o moreno descaradamente. — Eu não podia abaixar a guarda, você devia entender isso. Mas...Rafael...vamos começar de novo. Como se fosse a primeira vez que nós dois nos conhecemos. Está bem?
Rafael pensa olhando para as pessoas caminhando na rua, ele fecha os olhos por alguns segundos e depois abre.
— Está bem, vamos começar tudo de novo...mas de vocês me tratar pior que um cachorro vou pegar essa arma e atirar em você, está me ouvindo, mermão?! — Rafael vira bruscamente, as mãos fechadas em punhos.
Daniel revira os olhos pela tentativa estúpida de Rafael parecer intimidante.
— Até parece que não estava gemendo feito uma puta enquanto apertava seu pescoço como uma coleira naquela noite, meu.
— Cala a boca, mermão! É diferente!
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[+18] Códigos do Crime
FanficRafael, um rapaz de 20 anos, mudou-se da Cidade de Deus, Rio de Janeiro, para conviver com sua tia na favela de Paraisópolis, São Paulo. Desconhecido das regras da comunidade paulistana, sua vida é forçada a mudar de direção quando foi classificado...