CAPÍTULO 8

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Polina caminhou até a parede, onde várias armas estavam expostas como troféus, e pegou uma pistola desmontada. Sem dizer uma palavra, começou a manusear as peças com cuidado que era quase hipnótica. Se eu me lembrava bem das aulas na escola, ela mexia em uma Glock, montando cada parte com a mesma calma de uma garotinha que monta uma casa de bonecas. Mas, ao contrário da inocência de uma brincadeira, havia uma tensão em seus movimentos.

O silêncio ficou inquebrável. Cada clique da arma ecoava no quarto, fazendo o ar vibrar com uma expectativa incômoda misturada à minha culpa. Eu podia sentir a raiva de Polina, mesmo que ela não dissesse uma palavra. Seus dedos ágeis moviam-se rapidamente, havia algo diferente — seus pés descalços batiam no chão repetidamente, um sinal claro de seu nervosismo. Atenta, veloz, imparável. Canalizando toda a frustração e raiva na tarefa de montar aquela pistola.

Eu observava, impotente. Os segundos se passavam e faziam o nó na minha garganta apertar mais. Não aguentava mais ser uma mera espectadora do nervosismo dela. A tensão estava prestes a explodir, e o silêncio que Polina mantinha me deixava ainda mais à beira do desespero. Eu queria que ela falasse, queria que gritasse, que me xingasse. Qualquer coisa seria melhor do que essa distância crescente, aquele abismo que eu não sabia como atravessar.

— Polina... — arrisquei. — Fala comigo, por favor.
Ela não respondeu de imediato, suas mãos continuaram trabalhando na Glock, ignorando minha presença. A precisão com que ela manuseava a arma era um reflexo exato da pessoa que ela era — controlada, implacável, mas, agora, também vulnerável de um jeito que eu nunca havia visto.

Finalmente, com a arma montada, ela parou por um momento, respirando fundo. Não olhou para mim. Eu sabia que ela estava à beira de uma explosão, e eu queria, precisava, enfrentá-la.

— Se você quer me xingar, fazer o que for, faça. — Não pude esconder o nervosismo. — Mas não fica assim, quieta. Eu não suporto isso.

Polina soltou um suspiro pesado e, pela primeira vez, olhou para mim. Seus olhos estavam vermelhos, prestes a chorar — raiva, decepção, e algo mais, talvez uma dor que ela vinha sufocando há muito tempo.

— Você acha que montar uma arma me acalma? — Ela balançou a cabeça, a frustração transbordando. — Eu faço isso porque é a única coisa que ainda me dá controle. Porque tudo entre nós... tudo isso... saiu do meu controle há muito tempo.

Eu nunca tinha pensado que Polina, sempre tão fortesentisse que havia perdido o controle. E de alguma forma, isso me fez perceber o quanto eu havia contribuído para essa perda.

— Polina... — comecei, mas ela me interrompeu.
— Não, Yelena. Eu cansei de ficar esperando você resolver o que quer. Se vai continuar fugindo ou se vai finalmente me encarar e ser honesta.

Ela segurava a pistola na mão, mas dessa vez, não era a arma que causava medo — era a intensidade nos olhos dela, a verdade crua que ela jogava na minha cara. E, pela primeira vez em muito tempo, percebi que não havia como escapar disso. Eu tinha que fazer uma escolha.

Levantei do puff, o estômago revirando de nervosismo, determinada a fazer algo. Eu não podia mais ficar parada. Fui até Polina. Entre ela e o alto da parede, havia uma espécie de cabine com óculos de proteção e fones que, claro, Polina nunca usava. Ela nunca se preocupou em seguir todas as regras. Eu conhecia bem esse lado dela.

Quando cheguei perto da mesa, me posicionei e fiz um sinal com a cabeça, indicando que queria a arma. Era o único jeito que eu conseguia imaginar para ajudá-la a extravasar o que estava sufocando por dentro. Polina precisava liberar essa raiva de algum jeito, e eu estava disposta a ser parte disso, como antes.

Por um momento, ela me olhou com aquela expressão severa, seus olhos faiscando de frustração e incredulidade. Ela claramente não gostava da ideia de me ver ali, tentando tomar controle da situação. Mas não disse nada. Apenas deu um passo em direção a mim, seus pés descalços fazendo pouco ruído no chão de mármore frio.

Red Snowfall: Edição em PortuguêsOnde histórias criam vida. Descubra agora