Capítulo 25

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Gustavo Mioto

Ela não sabia de nada.

Não fazia a menor idéia do que havia acontecido comigo, mas eu sequer poderia culpá-la. Também não poderia culpá-la se ela me odiasse agora, se tivesse tanto nojo e raiva de mim que quisesse se manter afastada.

No final das contas, eu pedi por isso, porque agi como um cafajeste.

Eu poderia aceitar quase qualquer coisa, mas teria que fazer com que ela acreditasse que esse tempo em que nós estivemos separados foi muito mais difícil para mim do que ela imaginava. Não porque eu queria ter meu momento de mártir, mas porque ela precisava saber o mal que a falta dela me fazia.

Ao sair da Casa de Tanya no dia em que havia visto Ana Flávia pela última vez, tentei convencer a mim mesmo que manteria distância dela "para o meu próprio bem". Obviamente, aquilo se mostrou uma idéia tão imbecil que, sem exagero algum, quase me matou.

A primeira coisa que fiz ao chegar em casa foi abrir duas das minhas melhores garrafas de whisky e simplesmente acabar com elas. A culpa de ter feito o que tinha acabado de fazer e a dor que eu sentia como consequência das minhas decisões foi o que me convenceu de que encher a cara quase a ponto de entrar em coma alcoólico talvez fosse uma boa saída.

A tarefa de lidar com o desespero que minhas atitudes trouxeram mostrou-se difícil, então, como o perfeito covarde que eu sempre fui, me refugiei em várias doses. Foi só no dia seguinte, vítima de uma ressaca que beirava à sensação da morte, que eu me dei conta de que a brilhante idéia de usar o álcool para esquecer meus problemas não tinha sido tão boa assim.

Any ligou algumas vezes para o meu celular, talvez querendo saber o motivo que fez o chefe de uma empresa não ir para o trabalho em plena terça-feira ensolarada. Não me importei com as chamadas e me permiti afundar na tristeza de um ex-bêbado com dores de cabeça durante todo o dia.

Para fugir das lamentações, esquecendo da estupidez em que se resumia a minha decisão de usar duas garrafas de whisky como remédio para problemas sentimentais, repeti o erro outra vez, fazendo com que o final daquele dia se tornasse esquecido no teor alcoólico em excesso que circulava em meu sangue, mais uma vez.

Não era totalmente estupidez. Na verdade, eu não me importava com o que estava fazendo. Por isso, e por saber que aquilo me fazia esquecer dos problemas, mesmo que me castigasse depois, me permiti usar esse remédio com uma maior frequência.

Dia após dia, até completar uma semana.

Any me ligava diariamente, talvez querendo saber se eu finalmente havia morrido. Atendi uma chamada sua na quarta, apenas dizendo algo como "não vou trabalhar, problemas pessoais" e desligando depois. Esse deve ter sido o motivo pelo qual ela decidiu não ir atrás de mim até a minha casa, e eu não sabia se aquilo era bom ou ruim.

Seria bom porque eu não teria que aturar ninguém. Não que eu tivesse que "aturar" Any, é claro, ela era minha melhor amiga e quase sempre muito bem vinda, mas naquele momento eu não estava com cabeça para quem quer que fosse. Eu sabia que ela me perguntaria o que aconteceu, e sabia que ela exigiria os mínimos detalhes de mim, como todas as mulheres resolvem fazer quando se dispõem a escutar.

Mas falar sobre aquilo doeria muito, porque só pensar já era doloroso.

Eu teria que lidar com aquilo sozinho, já que havia tomado aquela decisão sem a ajuda de ninguém. Eu precisava ser forte e não encher a cabeça dos outros com os meus problemas.

Ainda assim, eu sentia a falta dela, porque embora eu não quisesse falar sobre o que estava acontecendo comigo, ela era possivelmente minha única válvula de escape, a única pessoa com a qual eu poderia dividir um pouco do meu sofrimento. Mesmo que isso significasse contar a ela aquela história desde o início, e mesmo que eu tivesse quase certeza de que ela me odiaria por não seguir seus conselhos, talvez fosse bom desabafar com alguém.

De repente...Amor / MiotelaOnde histórias criam vida. Descubra agora