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Gustavo Mioto

Com pouco dinheiro, conseguia mulheres todos os dias.

Era fácil, era prático.

E era indolor.

Ana Flávia Castela

Mais um dia.

Mais um pesadelo.

Com 20 anos eu era a mulher mais jovem da Casa de Tanya. Era também a novata. Todas lá já se conheciam de longa data, eram amigas e achavam que lá era o melhor lugar do mundo, já que se sentiam protegidas e desejadas.

Todas eram, de fato, desejadas. Algo comum em casas de prostituição.

Eu havia me mudado para lá havia duas semanas, fazendo com que aquela casa grande e até aparentemente aconchegante fosse tanto meu novo ambiente de trabalho como minha nova casa. Eu acordava, trabalhava e dormia dentro daquelas paredes. Minha vida se resumia praticamente a isso.

Quando Tanya me encontrou na rua, trabalhando independentemente, disse que poderia me oferecer uma grande oportunidade. Havia uma vaga em sua mansão, lugar que apenas homens ricos e poderosos freqüentavam.

Aparentemente, para ela, era um desperdício vender meu corpo por tão pouco.

Eu não era exatamente feia, tinha alguns traços delicados e uma pele, segundo alguns clientes, "de seda". Era tão clara que poderia ser facilmente confundida com uma boneca de porcelana, com a única diferença de que eu não era tão facilmente quebrável.

Não por fora, pelo menos.

Minha vida vinha sendo um inferno durante muitos anos. Quando eu tinha dez anos, meu pai Rodrigo foi vítima fatal de um assalto. Levou dois tiros no peito, embora não houvesse demonstrado resistência. Isso foi a gota d'água para que minha mãe Michele, viciada em fortes remédios anti-depressivos, se entregasse completamente à depressão.

Com o pouco dinheiro que tínhamos fui obrigada a abandonar a escola e me virar para tomar conta da casa, enquanto minha mãe passou a sustentar nós duas, arranjando um emprego de garçonete em algum restaurante de beira de estrada.

Cinco anos depois ela conheceu um sujeito que acabou com sua vida, apresentando-a ao mundo do álcool e das drogas. Além de ir morar conosco, ele gastava todo o dinheiro que minha mãe conseguia. Tudo isso levou à sua morte precoce, e minha consequente fuga para o mundo com 17 anos.

Embora tentasse de todas as maneiras levar uma vida digna e estável, não me era possível tornar qualquer sonho real. Descobri que minhas tentativas para arranjar emprego nunca davam certo, e só então entendi que minhas virtudes como pessoa não importavam, mas sim minha aparência e meu corpo. Sem bons estudos e com poucas opções, já estava cansada de viver uma vida vazia. Embora a vida que estivesse prestes a agarrar apagasse totalmente minha dignidade, ao menos eu poderia alugar uma casa, saindo dos abrigos em que ficava durante as semanas.

Passei então a cobrar por "favores sexuais". Sim, era algo extremamente humilhante e asqueroso. Depois de todo tempo, minha visão desse quadro não havia mudado em nada. Me sentia suja e digna de pena em cada pequeno e vazio dia da minha vida. Mesmo assim consegui encontrar e manter um apartamento pequeno, com um colchão, uma TV e uma geladeira velha. Não era muito, mas eu tinha um lugar para morar.

Até que Tanya me encontrou em uma certa noite, me propondo mudanças. Então, lá estava eu. Trabalhando para Tanya, cada uma de nós ficava com 55% dos lucros provenientes dos clientes, enquanto ela ficava com os 45% restantes para manter a casa. Acabou se tornando um bom negócio para mim, já que estava acostumada a cobrar bem menos pelos programas que oferecia.

Mesmo abrindo mão de quase metade do meu salário, eu mantinha condições de vida melhores. Era bem tratada, atendia clientes sempre muito elegantes e morava em um lugar confortável. Era algo que eu conseguia manter.

Ainda assim, era algo que me matava aos poucos. A cada maldito dia da minha vida.

A cada maldito dia da minha vida

De repente...Amor / MiotelaOnde histórias criam vida. Descubra agora