Alice Macedo
Quando abri os olhos, o quarto ao meu redor parecia irreal. Por um breve momento, meu corpo estava pesado demais para reagir. A sensação de dormência se misturava ao calor pegajoso do sangue seco em minha pele, e a memória da cena brutal me atingiu como um golpe. O segurança caído, o tiro... o sangue. Olhei para baixo e vi minhas roupas manchadas de vermelho, e o terror começou a se infiltrar novamente.
Eu estava sozinha na cama, mas conseguia ouvir barulhos vindos do banheiro. O som da água correndo e o ruído leve de algo sendo movido me fizeram sentir uma pontada de alerta. Meu corpo estava tenso, o medo ainda correndo nas minhas veias como um veneno. Por mais que eu quisesse me mover, parecia que minhas pernas estavam coladas ao colchão.
De repente, a porta do banheiro se abriu e Júlio saiu com uma toalha úmida nas mãos. Ele olhou para mim por um momento, sua expressão estranha.
— Você está acordada — disse com uma voz séria, aproximando-se devagar.
Assim que vi seus passos se aproximando, meu coração acelerou. A imagem do tiro, do corpo caído, voltou com força total. Ele estava vindo em minha direção e o pânico começou a tomar conta de mim de novo. Meus pulmões se apertaram, a sensação de sufocamento me dominando. Ele se ajoelhou ao lado da cama, a toalha ainda nas mãos, tentando se aproximar.
— Alice, calma. Eu só quero limpar o sangue.— disse sério ao ver o meu estado nervoso.
Mas as suas palavras não conseguiam me alcançar. Minha mente estava em outro lugar, presa entre o medo da punição e o terror de ser arrastada de volta para aquele ciclo de dor. Minha respiração ficou cada vez mais rápida, e o ar parecia insuficiente. Eu me movi instintivamente para trás, me afastando dele o máximo que pude.
— Não... não — murmurei, minhas mãos tremendo enquanto tentava desesperadamente criar alguma distância entre nós. — Não chegue perto de mim.
Júlio franziu a testa.
— Alice... você não precisa ter medo. — A voz dele era firme, mas havia uma urgência nela que eu nunca havia ouvido antes. — Eu não vou te machucar.
Mentiroso.
Ele sempre me machucava. Eles sempre me machucavam.
Eu não acreditava. Como poderia? Já conhecia bem o ciclo. Primeiro a calma, depois a dor. Minhas mãos se apertaram contra o lençol, meus olhos fixos na porta do banheiro, calculando a distância.
Antes que qualquer um de nós pudesse fazer algo, a porta do quarto foi aberta com violência, batendo contra a parede com um estrondo. O som ecoou pelo quarto e fez meu coração pular na garganta. Daniel entrou como uma tempestade, os olhos cheios de fúria.
— O que está acontecendo aqui?! Por que tem um corpo no corredor? — ele rosnou. Até que seus olhos param em mim e no sangue espirrado em minha roupa — Quem caralhos fez isso com você? — falou furioso enquanto se aproximava.
O impacto da entrada de Daniel me atingiu como uma onda de pânico. O barulho alto, o tom de voz dele, tudo parecia um aviso de que a violência estava prestes a começar de novo. O som reverberava na minha cabeça, e, sem pensar, eu saltei da cama. Meu corpo se moveu por puro instinto de sobrevivência.
— Não! — gritei, minha voz quebrada pelo medo enquanto corria em direção ao banheiro.
Minhas pernas quase cederam, mas eu consegui alcançar a porta do banheiro, trêmula. Com as mãos desajeitadas, fechei a porta atrás de mim, virando a chave antes que qualquer um deles pudesse me seguir.
Minha respiração estava descontrolada, ofegante e dolorosa, e eu me afastei da porta, escorregando para o chão e abraçando meus joelhos enquanto as lágrimas finalmente caíam.
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Os irmãos Savóia
General FictionAlice Macedo, uma talentosa e criativa joalheira, vive uma vida tranquila dedicando-se à sua paixão: criar joias deslumbrantes e únicas. Sua rotina pacífica, no entanto, é abalada quando ela se torna alvo da perigosa obsessão de Daniel e Júlio Savoi...