𝚁𝙴𝙱𝙾𝚁𝙽

𝟏𝟎

Pov Vance Harper:

O primeiro dia de aula na nova escola era algo que Vance não esperava com ansiedade, muito pelo contrário. A ideia de ser "o novo aluno" lhe causava um desconforto profundo. O fone de ouvido já estava em posição, abafando o máximo possível dos sons ao seu redor, enquanto ele caminhava ao lado de Jonathan e Jordan em direção ao prédio da escola.

Os irmãos estavam animados, conversando entre si sobre o treino de futebol e as novidades do colégio, mas Vance apenas os seguia em silêncio. Ele ainda sentia que não pertencia àquele lugar. A escola parecia grande demais, com gente demais, e barulho demais. Tudo demais.

— Vai dar tudo certo, cara — disse Jonathan, percebendo o nervosismo de Vance enquanto eles atravessavam os corredores movimentados. — Todo mundo aqui é legal, e, como você vai ver, tem alguns professores ótimos também. Se precisar de ajuda, pode contar com a gente.

Jordan assentiu, sorrindo de leve.

— Sim. E se precisar de um tempo sozinho, pode me procurar. Sei como é difícil se ajustar, principalmente no começo.

Vance apenas deu um meio sorriso, ainda se sentindo deslocado. Ele realmente não queria estar ali. O único pensamento reconfortante era que, se tudo ficasse insuportável, ele poderia voltar para casa e mergulhar nas pinturas, onde o mundo exterior parecia não existir.

— Valeu... eu... vou tentar não surtar — disse Vance, sem muita convicção.

Quando eles chegaram ao pátio da escola, Vance olhou ao redor, tentando se familiarizar com o novo ambiente. Havia grupos de alunos por toda parte, rindo, conversando, e aquilo só aumentava sua sensação de ser um estranho. Ele estava prestes a se encolher e colocar os dois fones de ouvido para se isolar completamente quando algo chamou sua atenção.

Perto da entrada principal, um garoto estava encostado na parede, observando tudo com um olhar afiado e misterioso. O cabelo preto e liso caía levemente sobre sua testa, e seus olhos verdes penetrantes pareciam analisar cada detalhe ao seu redor. O garoto parecia completamente alheio ao que acontecia à sua volta, mas, ao mesmo tempo, parecia notar tudo.

Vance franziu a testa, curioso. Ele nunca havia visto alguém com uma presença tão... marcante, e ao mesmo tempo tão afastado do mundo. Jonathan seguiu o olhar de Vance e sorriu.

— Ah, outro novato. Chegou hoje também. Ouvi dizer que ele é de Gotham — comentou Jonathan, em tom de curiosidade. — Acho que o nome dele é Damian.

Jordan o olhou também, mas manteve o tom mais neutro.

— Parece ser meio... sombrio. Mas quem sabe ele é gente boa.

Vance não respondeu, mas algo naquele garoto o intrigava. Sem saber exatamente por quê, ele sentiu uma conexão quase imediata, uma sensação de que havia algo mais naquela história do que apenas um novo aluno vindo de Gotham.

O primeiro período foi uma sucessão de apresentações embaraçosas. Professores o chamavam na frente da turma para se apresentar, o que Vance odiava com todo o seu ser. Ele ficava nervoso, as palavras não saíam direito, e ele conseguia sentir os olhares curiosos sobre si. Pior ainda era o burburinho sussurrado assim que ele se sentava. Ele sabia que era diferente, sempre soube, e a sensação de não pertencer só se intensificava.

Finalmente, durante o primeiro intervalo, ele encontrou um canto mais afastado do pátio para se esconder. Colocou seus fones de ouvido e abriu o caderno, começando a rabiscar distraidamente. Desenhar era uma maneira de escapar, mesmo que por um momento. Enquanto sua mente mergulhava nas linhas e formas, ele quase não percebeu alguém se aproximando.

— Então... você também é novo por aqui.

Vance ergueu os olhos rapidamente e viu o mesmo garoto de mais cedo, Damian. Ele estava parado na frente dele, com uma expressão neutra e os braços cruzados. Vance franziu a testa, tirando um dos fones de ouvido.

— Sim... E você também, pelo que ouvi — respondeu Vance, tentando parecer indiferente, mas ainda sentindo uma leve tensão no ar.

Damian deu de ombros e sentou-se ao lado de Vance no banco de concreto, sem pedir permissão, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.

— Essas escolas do interior... são diferentes das de Gotham — comentou Damian, com uma voz calma, mas que carregava uma certa intensidade.

— Já estudou em muitas? — perguntou Vance, curioso. Damian não parecia o tipo de garoto que se encaixava facilmente em qualquer lugar.

— Mais do que eu gostaria — respondeu Damian, desviando o olhar por um segundo, como se aquele assunto fosse trivial para ele.

O silêncio pairou entre os dois, mas não era um silêncio desconfortável. Vance olhou para o caderno no colo e, em seguida, para Damian. Por algum motivo, sentiu-se compelido a perguntar:

— O que você faz aqui? Tipo... Gotham é uma cidade grande. Por que veio para Smallville?

Damian olhou para Vance por um segundo, avaliando-o com aqueles olhos verdes afiados, antes de dar uma resposta vaga.

— Meus pais acharam que eu precisava de uma mudança de cenário. Mas eu não me incomodo. Às vezes, é mais fácil se esconder em lugares assim. Menos atenção, entende?

Vance sentiu uma leve conexão com aquelas palavras. Ele também entendia o desejo de se esconder, de ficar em segundo plano, de não ser notado. Talvez por isso, ele se sentiu um pouco mais à vontade ao lado de Damian.

— E você? — perguntou Damian, quebrando o silêncio novamente. — Por que está aqui?

Vance hesitou. Ele não sabia como responder a isso sem contar toda a história complicada de sua vida — sobre sua mãe, sobre Clark Kent ser seu pai, e sobre o caos que isso trouxe para sua vida. Então, ele apenas deu de ombros.

— As coisas mudaram. Agora estou morando com... uma nova família.

Damian não pressionou. Ele parecia entender o peso das palavras não ditas, e isso, de certa forma, fez Vance se sentir um pouco mais confortável.

— Eu gosto de desenhar — disse Vance, mudando de assunto, apontando para o caderno no seu colo. — É o que me ajuda a esquecer o resto.

Damian olhou para o caderno, sem muita reação, mas depois assentiu levemente.

— É bom ter algo assim. Todo mundo precisa de uma válvula de escape.

Eles ficaram em silêncio novamente, observando o movimento da escola à distância. Para Vance, a presença de Damian era estranhamente reconfortante. O garoto não falava muito, não fazia perguntas demais, e parecia respeitar o espaço alheio. Talvez, de alguma forma, eles fossem mais parecidos do que imaginavam.

Antes que o sinal para o próximo período tocasse, Damian se levantou, colocando as mãos nos bolsos do casaco.

— Se precisar de algo, me avise. — Ele disse, sem muito alarde, mas com uma intensidade que Vance não esperava.

Vance assentiu, surpreso pela oferta. Ele não estava acostumado a que as pessoas fossem tão diretas ou oferecessem ajuda de maneira tão... simples. Mas talvez fosse isso que ele precisava.

— Valeu — respondeu Vance, enquanto colocava o fone de volta no ouvido e assistia Damian desaparecer pelo pátio.

Ao se levantar para seguir em direção à próxima aula, Vance não pôde deixar de sentir que, talvez, aquele novo lugar não fosse tão ruim assim. Talvez, só talvez, ele não estivesse tão sozinho quanto pensava.