Anelise
Desço sob os olhares de escrutínio dos vapores. Em cada esquina que passo, sinto que estou sendo avaliada. Isso se deve ao tirano desse morro, mas não vou abaixar a cabeça. Essa não sou eu. É como se eu estivesse vivendo em uma realidade paralela, tudo o que eu jamais imaginei está acontecendo e não é bonito. Eu odeio isso aqui, não a comunidade em si, mas o dono dela.
A padaria já está aberta, por isso apresso o passo até lá.
O local parece vazio, a não ser por seu João atrás da caixa registradora. O idoso me olha com pesar, parece triste ainda assim cumprimenta com um bom dia.Seu João me chama várias vezes, contudo desiste do que quer falar, apenas diz que depois conversamos.
Próximo a hora de eu sair, Dinamite entra com seu olhar afiado.— E ae coroa, já mandou a real pra mina?
— Pra ameaças cê acha o caminho, né filho ingrato? — o homem rebate desgostoso.
— Só tô fazendo meus trampo. — se defende com sentando na mesa próximo a entrada.
Olho de um para o outro tentando ver semelhança. Quem diria que Dinamite é o filho que seu João disse.
— O que está acontecendo? — me faço ouvir e os dois olham em minha direção.
— Você está demitida,Anelise. — o senhor comunica.
— O quê? Porque? Fiz alguma coisa de errado? — questiono atônita.
— Não filha. A ordem veio de cima e não posso ir contra o Ghost mesmo que eu queira.
Nessa hora a ficha cai. Ele realmente vai fazer da minha vida um inferno. Eu quero ir até aquela m'aldita casa e plantar uma bala na testa do infeliz. Mas tenho que me controlar para não piorar a situação.
Fecho a mão algumas vezes respirando fundo.— Ele veio aqui? — pergunto depois de um tempo.
— Não! Nós nem sabemos quem ele é, mas o recado chegou e...
— Tudo bem, eu entendo.
Dinamite assiste tudo com um olhar indecifrável.
— Satisfeito? Vocês conseguiram tirar a única pessoa que realmente ajudou. — João lamenta com uma carranca. — E agora Davi? Sua mãe já tá velha, eu também, teremos que fechar as portas e viver do que?
— Eu banco os dois. — responde apenas.
— Com dinheiro sujo? Não, nós não te criamos pra isso.
— Eu já estou indo. — comunico deixando o avental e o boné sobre o balcão. — Obrigada por ter me contratado.
Dou as costas aos dois, mas antes de alcançar a saída, João volta a me chamar.
— Senhor?
— Ghost vai dar uma festa para sua fiel amanhã, ele contratou nosso serviço e exigiu que cê fosse trabalhar. — percebo o quão constrangido ele está — Se não for ele mandou dizer que a Nina e eu vamos sofrer.
— Inacreditável. — eu rio em descrença.
Olho para Dinamite que parece nem se importar com os pais e vou até ele ficando cara a cara.
— Deveria se envergonhar, deveria proteger seus pais, não deixar que um…um…tirano sem coração ameace eles porque está com o ego ferido.
— Qual é princesa? Cê acha mesmo que meus coroa tá correndo perigo?
— E você acha que não?
— Cê não sabe de nada.
Decido não argumentar mais. Digo a João que irei na tal festa da fiel e saio de lá rapidamente. Preciso colocar a cabeça no lugar e essa comunidade está me deixando louca.
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Ghost
RomansaAnelise ansiava por seguir a carreira de seu pai. Aos vinte anos a garota vê sua vida desmoronar diante dos seus olhos e recorre aquilo que ela cresceu odiando. Ghost, o dono do morro foi o único que lhe estendeu a mão, mas ela teria que ser dele. D...