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MARIANA

Quando ele voltou, uma mulher mais velha o acompanhava, ela tinha os cabelos grisalhos presos em um coque apertado.

Franzi a testa ao olhar para as roupas da senhora que deduzi ser Rute.

O vestido dela era feito de um tecido grosso, meio acinzentado. A saia ia até os tornozelos e era totalmente reta, sem nenhum detalhe. A parte de cima, fechada até o pescoço, tinha botões de madeira e mangas longas.

Ao lado dela, uma menininha loira e com grandes olhos azuis que aparentava ter uns seis anos, se escondia timidamente atrás da saia da senhora, e usava um vestido tão estranho quanto o dela. 

— Vocês são atores, por acaso? — tive que perguntar. Talvez aquela casa fosse cenário de algum filme de época.

"Um cenário bem detalhado", pensei, olhando para todos os lados, ainda meio impressionada com a riqueza de detalhes de tudo ali.

Rute olhou para mim com um olhar estranho, quase como se estivesse com pena. Colocou a mão na boca, chocada.

— Pobrezinha... — murmurou, com uma voz quase inaudível enquanto observava as minhas roupas. — Deve ter sofrido um trauma muito forte. Nem mesmo diz coisa com coisa.

Franzi o cenho. O que ela estavam insinuando? Olhei para o meu corpo, sem entender. Eu estava coberto de moletom e uma camiseta. Não havia nada de errado com o que eu vestia. Claro, não era a roupa mais elegante, mas não era como se eu tivesse aparecido de pijama!

— O que foi? — quis, cruzando os braços de forma defensiva. — Tem algo errado comigo?

Rute deu um passo hesitante à frente, ainda me olhando com uma expressão preocupada.

— Olhe para ela, senhor Valente. — disse ela, e seu olhar caiu sobre minhas roupas novamente. — Ela deve ter sido atacada ou... — começou a dizer, mas Augusto a interrompeu bruscamente.

— Ou está fingindo muito bem. — ele disse, com uma voz gélida, os olhos fixos em mim. — Eu não acredito que ela não saiba onde está, Rute.

Respirei fundo, tentando controlar a raiva. Eu estava prestes a explodir.

Rute se aproximou mais, ignorando o olhar cortante de Augusto, e olhou para as minhas roupas de perto, como se tentasse entender o que eu estava usando.

— Que roupas são essas, querida? — Disse, genuinamente confusa.

Aquilo já estava indo longe demais.

— É uma camiseta e uma calça de moletom. — respondi, com um tom sarcástico e cansado. — Nada que uma jovem normal não use em pleno ano de 2024.

Os olhos de Rute se arregalaram ainda mais. Augusto cruzou os braços, parecendo cada vez mais impaciente.

— 2024? — Rute olhou de relance para Augusto. — Essa menina não está bem, senhor Valente. — ela murmurou, balançando a cabeça lentamente. — Ela precisa ver um médico.

Augusto suspirou, claramente exasperado. Ele se virou para mim, cruzando os braços.

— Diga de novo. — tentei ele, com a voz dura. — Que ano a senhorita disse?

Eu rolei os olhos, sentindo a frustração crescendo ainda mais dentro de mim. Será que eles eram loucos? Será que eu tinha caído em algum tipo de armadilha bizarra? Isso só poderia ser uma pegadinha, e uma de muito mau gosto.

— Vocês são loucos? — explodir, sem conseguir mais me segurar. — Isso é algum tipo de brincadeira? E por que tudo aqui parece ter saído do século passado?

Augusto me encarava com uma expressão estranha, enquanto Rute parecia cada vez mais alarmada.

— Nós estamos em 1859. — Augusto disse, com uma calma assustadora. — Há algo de errado com o ano em que estamos?

Eu ri. 

— Isso é ridículo. — murmurei, passando as mãos pelos cabelos. — Alguém muito cruel deve estar por trás disso.

O dois me olhavam como se eu fosse louca.

— Aposto que isso é coisa do Fabiano e daquele bando insuportáveis da empresa onde eu trabalho. Eles deveriam achar que é engraçado me forçar a sair do luto pela morte da minha família... — murmurei, tentando racionalizar. — Mas isso não tem graça. Eu não estou gostando de nada dessa brincadeira!

Levantei a poltrona abruptamente e comecei a olhar ao redor, procurando alguma câmera escondida ou algo que me indicasse que aquilo era uma grande armação.

— Já podem sair! — gritei, olhando para todos os cantos. — A palhaçada acabou, ok?

Mas ninguém apareceu. Rute levou as mãos à boca mais uma vez, horrorizada, enquanto Augusto apenas me observava com os braços cruzados, um brilho severo nos olhos.

— Pobre menina. — murmurou Rute novamente, sua voz cheia de pena.

Augusto, agora mais sério do que nunca, deu um passo à frente.

— Vamos chamar um médico. Talvez deva descansar em um dos quartos, senhorita. — ele sugeriu, embora sua voz soasse mais como uma ordem.

Eu revirei os olhos, sentindo a raiva borbulhando.

— Não vou deitar porra nenhuma! — rebati, furiosa. — Eu quero ir para casa agora!

Rute arfou, escandalizada com o que eu disse, enquanto Augusto suportou o olhar.

— Senhorita! Cale-se imediatamente! — me repreendeu severamente. — Uma dama não deve falar desse jeito. — ele retrucou.

Dama? Senhorita?! Que droga estava acontecendo aqui? Eu estava prestes a explodir novamente quando meus olhos caíram sobre a menininha que ainda se escondia atrás de Rute. Ela olhou para mim com curiosidade, mas seus olhos ficaram assustados.

Meu coração amoleceu um pouco. Talvez ela fosse uma atriz contratada para essa brincadeira doentia, mas não era culpa dela.

— E você? — querendo, abaixando a voz e tentando ser mais gentil. — Você é uma atriz também?

A menina recuou imediatamente, escondendo-se ainda mais atrás da saia de Rute. A mulher olhou para mim, assustada, e deixou a criança para mais perto, como se eu fosse uma ameaça.

— Não se aproxime da minha sobrinha. — Augusto disse.

Eu levantei as mãos em sinal de rendição, sentindo minha cabeça girar.

— Isso é loucura. — sussurrei, mais para mim a mesma coisa que para eles. — Tudo isso... não pode ser real.

Augusto soltou um suspiro pesado e trocou um olhar com Rute.

Balancei a cabeça. Meu corpo parecia mais pesado, e o ar começou a faltar, como se algo invisível estivesse apertando meu peito.

Tentei dar um passo para trás, mas minhas pernas vacilaram. O som abafado de vozes, o ambiente carregado e aquelas roupas estranhas, a casa, o jeito que eles falavam... Como poderia?

Minha visão começou a embaçar, manchas escuras dançando diante dos meus olhos. Levei uma mão à testa, sentindo a vertigem tomar conta.

— Eu não estou bem. — disse, meio grogue. — Acho que vou...

— Senhorita! — a voz de Augusto tão distante, chamava em um tom preocupado.

Meus joelhos cederam, e o mundo à minha volta se apagou completamente enquanto eu caía, desmaiando nos braços do desconhecido.

Acordo com a Fera [Paixões Rurais - Vol.2]Onde histórias criam vida. Descubra agora