EPÍLOGO

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Olhar a professora Simone por tanto tempo nunca me pareceu loucura. Ela tinha a maestria para lecionar, sua voz rouca e firme explicando os conteúdos me faziam compreender pelo menos uma parte de cada assunto.

Já fazia duas semanas que ela me dava aulas, mas ainda não tínhamos nos falado, Simone parecia sempre ocupada com aquela sua expressão séria. Eu sabia quem era seu pai, o Presidente do Senado: Ramez Tebet. E ela parecia muito com ele, a forma como falava e a oratória impecável, quando tinha tempo sempre ligava a televisão no canal do Senado para assistir as sessões e me ajudava a estudar nas aulas de direito.

Mas, Simone me encantava não só por ser impecável nas explicações, era por algo a mais que ainda não consigo denominar. Teve uma vez na primeira semana desse semestre, que encontrei com ela nos corredores da faculdade, mas Simone apenas acenou com a cabeça e tentou me chamar pelo nome, mas tudo que preferiu foi: Olá, senhora Soraiane…? Até mais.

Depois do encontro vergonhoso, decidi não falar mais com ela para não haver constrangimento.

Entretanto, hoje seria o dia, teria que pedir ajudar em uma questão do trabalho que deveria ser entregue, e somente a professora Tebet poderia responder. Então, quando nos despediu e todos já recolhiam os materiais, eu fiquei ali a olhando.

A sala esvaziou, Simone escrevia alguma coisa com sua mão canhota. Ela é canhota? Sacudi a cabeça e caminhei até ela, com a bolsa no ombro e segurando os cadernos na mão. Parei em frente a sua mesa, sentindo um calor me tomar e uma ansiedade fazer minhas mãos suarem. Tebet elevou os olhos junto com a cabeça para cima e deu um sorriso cordial.

— Oi, alguma dúvida da matéria?

— Sim, quer dizer, não. — Gaguejei, e queria me xingar por aquela atitude infantil. Ora, essa, eu já era uma adulta — Preciso em relação ao trabalho, a senhora quer manuscrito ou digitado?

Simone riu, disfarçadamente e bem baixinho. mas riu. Eu sei que minha pergunta era idiota, mas estava tão visível que estava tentando puxar assunto?

— Da forma como preferir, entregando na data. Só isso? — Ela se levantou, seu perfume invadiu minhas narinas e achei um absurdo aquilo, estava zombando de mim e ainda tinha me expulsava?

Mas, não seria fácil me vencer, já tinha ido longe demais. E o que proferi foi uma surpresa até para mim.

— Não. Quer dizer, queria te convidar para sair? É, ir no bar que abriu por aqui.

— Ah, sim…

Pela primeira vez seu olhar cruzou verdadeiramente com o meu, e sentia a intensidade daquele olhar tão negro. A sua respiração estava ofegante, e vi a pele ficar levemente vermelha. Mas, eu tinha que tentar, poderíamos sair e conversar, talvez até virar amigas ou algo além…

— Infelizmente, terei que negar, tenho compromisso com meu marido. Vamos na consulta da Mafê. — Sorriu nervosa, colocando a mão em sua barriga e foi só aí que notei que está a volumosa demais para não ser algo e redondinha para não ser só gordura. Estava grávida.

Meus olhos foram até sua mão esquerda e vi a aliança dourada que havia ali. Sorri tentando disfarçar a tristeza eminente, mas estranhei como aquilo me afetou.

Mas, por quê? Deve ser por que só queria socializar naquele lugar, mas tudo bem.

— Tudo bem, deixa para uma próxima. — Disse eu, para não deixar o ambiente mais constrangido ainda.

— Sim.

Não haveria uma próxima, eu nunca mais iria passar por aquele constrangimento. E aquele sentimento estranho que surgiu em mim, seria acalentado pelo amor de Carlos César.

Apenas me despedi, ajeitei a bolsa no braço, deixei a sala e Simone Tebet ali, com todos os sentimentos que poderiam surgir.




— Havia um tempo, distante e frio
duas almas solitárias
Só se aqueciam quando se encontravam
Houve um tempo
Onde essas almas descobriram que
O calor entre elas poderiam queimar
Suas asas
Há um tempo, hoje
as almas já não se queimam mais e aprenderam
A serem frias e quentes sozinhas
A dolorosa dor do amor
— autora.

Destino: Simone & SorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora