Por um segundo ou dois cogitei se deveria ficar em casa até a hora da aula, mas pensamentos não me deixaram dormir e aqueles mesmo pensamentos me fizeram estar na faculdade às onze horas, sendo que minha única aula do dia começava às duas, às duas da tarde, três horas depois daquele horário. Não tínhamos uma mesa, não éramos o centro das atenções no prédio de administração, mas eu e Lisa conseguíamos facilmente nos encontrar no meio de todas aquelas pessoas.
— Você não tinha aula só às duas? - Perguntou assim que me aproximei. - Por que essa cara?
Mesmo estando normal para qualquer outra pessoa, para ela eu posso ter chorado a noite toda e ainda ter passado maquiagem que mesmo assim perceberia que algo está errado. Afinal de contas ela me conhece a bastante tempo para saber qualquer uma de minhas manias e caras.
— Eu fiz uma coisa ontem.
— O que fez exatamente?
— Eu não estava conseguindo dormir e a imagem dela não saia da minha cabeça, eu tinha que fazer ou eu tinha que fazer.
— Prossiga.
Aquilo de certa forma era vergonhoso, não consigo explicar como.
— Ela estava de top e com um microshort quando cheguei e aquilo não saia da minha cabeça. Eu já tinha visto ela daquele jeito várias vezes, já a vi sem roupa e fiz coisas que não quero falar, mas ontem foi diferente. - Passei todos aqueles segundo de cabeça baixa, mas finalmente tive coragem para olhá-la. - Então eu fiz o que tinha que ser feito.
De todas as barbaridades que um dia já falei para a Lisa, em nenhuma delas fiquei com vergonha, mas dessa vez sim, eu me sentia terrivelmente constrangida em dizer algo tão comum, tão simples entre nós. Minhas bochechas de certeza ficaram vermelhas, assim como senti todo meu corpo se incendiando.
— Você se tocou pensando nela? - Afirmei e instantaneamente ela riu, riu com gosto e como raramente vejo.
— Ei, não ria, eu realmente estou me sentindo culpada.
— Não deveria, vocês já transaram. Além do mais, é super normal nos tocarmos pensando em alguém. - Ela não tinha isso, pelo menos parou de me relatar e constranger quando conheceu Park. - Bom, eu não preciso, porque ela faz isso por mim, mas pessoas na sua situação fazem.
— Minha situação? - Como assim minha situação?
— Sentir desejo e ser uma frouxa. - Certo, eu sou uma frouxa, mas só ela pode dizer isso.
— E o que eu deveria falar a ela? - Há tantas coisas, muitas coisas a serem feitas, mas tudo isso me leva ao questionamento se estou forçando algo. - "Ei Jennie, ontem a noite pensei em você enquanto estava me tocando e a ideia de transar contigo não sai da minha cabeça."
Aquilo parecia algo bárbaro, algo que um homem obviamente diria para alguém que nem mesmo chegou a beijar. Não sou esse tipo de pessoa e nunca pretendo ser, nem mesmo no auge de uma carência.
— Ou você poderia conversar sobre terem ficado e que foi bom, como uma pessoa normal obviamente faria.
— Não, ela pode entender isso de forma errada.
— Qual forma errada?
— Que para ficar lá em casa vamos ter que manter um relacionamento, não quero isso, pelo menos não dessa forma.
— É, de certa forma eu também entendo isso. - Ela conhecia todos os meus medos e sabia como isso me abominava, mas mesmo assim... - Vou pensar em alguma coisa, mas você pode perder o amor da sua vida se não tomar atitude em nenhum momento. - Ela sabia o quanto eu gostava da Jennie, o quanto eu queria tentar aquilo.
Em todas as vezes que fiquei com alguém só por um dia ou dois, nada se passava por minha mente depois, nenhum sentimento, nenhuma sensação de que aquilo deveria se repetir e morando ou não com ela eu sei que essas sensações nunca iriam existir, que eu continuaria a querendo se ela morasse ou não comigo. Eu continuaria a desejando com todas as forças do meu ser.
...
Acabei jantando fora, só para passar mais tempo fora de casa e mesmo assim quando cheguei ela ainda estava acordada, como se me esperasse. Eu bem que poderia apenas complementá-la e ir direto para o quarto, mas minha mania de olhar as panelas me impediu. Eu deixei avisado que não jantaria hoje, mas mesmo assim ela fez sopa de mandu, algo que venho ganhando gosto desde a primeira vez que fez há quase um mês.
— As minhas aulas acabaram hoje, então terça eu vou para a casa dos meus pais por umas duas semanas, caso não me veja aqui. - Falou, quebrando aquele silêncio que havia se estendido desde que nos cumprimentamos até o dito momento.
— Duas semanas?
— Sim, preciso de sol e de alguns dias sendo mimada. - Ela precisava disso, após dias turbulentos todo mundo merece ser mimado por algum tempo. - Eu vou na parte da tarde, então vou deixar o jantar pronto.
— Você...
— Nem ouse dizer que não preciso.
E não precisava, eu já achava demais quando ela fazia três refeições ao dia, deixar que fizesse o jantar quando já não estivesse mais aqui seria demais. Só que ela é mais teimosa do que eu, bem mais implicante também quando quer algo e acredito que ninguém nesse mundo possa lhe fazer mudar de ideia quando já está decidida.
Naquela madrugada eu acordei com fome, então aproveitei um pouco da sopa e também aproveitei um pouco para pensar. Algo que a Lisa me disse não saia da minha cabeça.
"Você pode perder o amor da sua vida se não tomar atitude em nenhum momento."
Eu poderia, poderia perder muita coisa, porque às vezes é melhor tentar do que passar a vida pensando no que iria acontecer, nas hipóteses que sempre continuaram sendo apenas hipóteses.
Diferente dos dois últimos finais de semana, aproveitei para dormir e não estudar, coloquei tudo em dia, cada gotícula de sono que ainda existia em meu ser por conta dos últimos dias. E pelo visto ela também fez o mesmo, não estava ali para o café da manhã às onze e tão pouco esteve durante o almoço às cinco e meia. O domingo não foi diferente e aposto que na segunda isso poderá se repetir. Como alguém poderia ter tanto sono como ela?
Diferente de ontem, hoje eu a vi, ela decidiu que seria uma boa ideia sair de sua toca quando eu estava escolhendo algo para assistir. Do seu quarto ela foi direto para o banheiro, apenas saindo de lá quando seu corpo exalava aquele cheiro gostoso de melancia e certamente me nocauteou.
— Recuperou o sono? - Perguntei.
— Só um pouquinho, preciso de mais dois dias para me sentir regenerada.
— Tem comida na geladeira, se estiver com fome.
Ela sussurrou um obrigada e logo depois correu até a geladeira, vasculhando entre as vasilhas e decidindo o que iria comer.
Ela tinha a opção de sentar no outro sofá ou até mesmo na mesa para comer melhor, só que acabou sentando no chão, perto da onde eu estava e se entretendo assim como eu. O filme em si era bom, mas eu não conseguia prestar atenção nele, parecia haver algo melhor para observar, uma coisa mais linda e atraente, algo que vem encantando meus olhos e que não sai da minha cabeça.
— Jennie. - A chamei, decidindo algo que nem mesmo eu tinha certeza.
— Oi.
— Será que podemos conversar quando você voltar de viagem? - Até então sua comida estava mais atrativa e acredito que continuaria se o que falei não tivesse sido tão chocante para ela.
— Algum problema comigo aqui?
— Não, de forma alguma, você é uma ótima colega de apartamento, o problema é outro. - Se houvesse de fato problema ele seria eu. - Não, não vem a ser um problema, é só que eu queria saber de algo.
— Está me preocupando.
— Não é nada demais, nem sei porque fiz todo esse alarme, posso esperar até que volte.
Eu poderia fazer isso agora, assim como sei que minha amiga me recomendaria, mas preciso de alguns dias para pensar no que falar, preciso ter a certeza que isso é de fato o que quero e não apenas um desejo tolo de algo que não consegui.
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Por conveniência - Jensoo.
RomanceSe apaixonar não estava em seus planos, muito menos morar com ela, se dando de bandeja a alguém que pouco viu e que a única intimidade que tinham se resumia a uma única noite em um quarto, sabendo apenas o nome uma da outra.