XI

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Dia seis.
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A grama úmida pressionava os pés descalços do argentino, enquanto a chuva, leve mas constante, escorria pelos seus ombros e se perdia entre os fios escuros de cabelo. O peso no seu corpo era quase insuportável, como se cada gota de água aumentasse o fardo que já carregava no coração. Rodrigo olhava ao redor, absorvendo o cenário à sua volta: a casa que havia construído com tanto esforço, a sua família, o time que representava com orgulho. Tudo aquilo que definia quem ele era, tudo o que tinha conquistado... podia desaparecer num instante, como um castelo de areia sendo levado pela maré.

Rodrigo sempre fora o mais tranquilo, o mais equilibrado, mesmo nas fases mais difíceis da vida. Ele tinha esse amor inabalável pela família, uma base sólida que o sustentava em qualquer tempestade. Quando soube que seria pai, sentiu-se preenchido de uma alegria que mal conseguia explicar. Foi um dos momentos mais felizes da sua vida. Finalmente, acreditou que poderia deixar sua marca no mundo, sua história continuaria através de outra vida. Teria um menino - alguém com quem ele sonhava compartilhar sua paixão pelo futebol, ensinar a chutar uma bola e a admirar Lionel Messi, o maior ídolo argentino, mesmo que, quando crescesse, o craque já estivesse aposentado. Garro imaginava a criança conhecendo as histórias de Messi e aprendendo a amar o futebol como ele.

Quando Felipe nasceu, Garro ganhou uma nova missão: apresentar ao filho o Brasil, o país onde havia nascido. Embora fosse um argentino típico, com seu orgulho feroz e desdém pelo país vizinho, queria ensinar ao menino que o Brasil era especial. Era diferente, vibrante. Ainda que criasse Felipe com o amor inabalável pela Argentina, sabia que talvez o menino aprendesse a amar o Brasil também - e isso o fazia sorrir.

Esse sempre foi o sonho de Rodrigo: formar uma família. Ter um filho que pudesse confiar nele, que dividisse segredos, alegrias e temores. Ele também sonhava com uma filha, alguém que protegeria de tudo e de todos. E ele tinha essa família. Tinha uma esposa. Mas agora, ali sentado, encharcado pela chuva, não entendia como havia chegado a esse ponto. Não entendia as decisões que tomara, decisões que só serviriam para feri-la, para dilacerar o coração dela. Eles estavam juntos havia mais de seis anos, e ele sabia, sem sombra de dúvida, que a amava. Isso era inegável. Mas por que, então, cometera erros tão graves? Ele não entendia... Nada fazia sentido.

As gotas de chuva aumentavam, encharcando suas roupas e esfriando sua pele, mas ele não se movia. Ficava ali, parado, encarando a casa. Se sua esposa estivesse ali, provavelmente teria aparecido na porta, insistindo para que entrasse e não pegasse um resfriado. Mas ela não estava. A única pessoa naquela casa agora era Raniele, alguém que ele não via desde que chegara a São Paulo. E, para ser sincero, ele sequer queria vê-lo.

Rodrigo fechou os olhos, desejando por um momento voltar para os braços de sua família. Queria sentir o calor do abraço de sua mãe, queria se ajoelhar diante do pai e pedir desculpas. Mas sabia que, se abrisse a boca, tudo desmoronaria. Ele, que sempre fora o orgulho da família, o filho que iluminava os olhos de todos, se tornaria a maior decepção. Apenas a ideia disso o enchia de dor, uma dor que ele não sabia como suportar.

E ali ficou, deixando que a chuva lavasse seu corpo, enquanto sua alma continuava carregada de culpa e arrependimento.

"Uma das mãos de Raniele pressionava firmemente a cintura de Rodrigo, mantendo-o próximo como se temesse que o momento escapasse. Rodrigo, com os pés na ponta, buscava altura para alcançar o outro. O brasileiro, ligeiramente inclinado, parecia moldar seu corpo para completar a distância entre eles. Os lábios dos dois se moviam em um compasso hesitante, mas cheio de desejo. Era impossível ignorar a química que pulsava ali, uma força que os atraía e que nenhum deles queria romper.

Algo loco- Raniele & Garro ⚣Onde histórias criam vida. Descubra agora