Imprevisíveis

Tudo acontece às sextas-feiras

"Você tem msn?"
Pedro perguntou e trocaram msn's. A aula acabou junto com o espaço no pequeno pedaço de papel que tinha dado início a conversa. Saíram do prédio conversando e se conhecendo mais um pouco.
- Por que direito? - Pedro repetiu a incansável e desnecessária pergunta feita por todos os professores durante a semana (que iria ser feito por todos os outros professores ao longo do curso).
- Me apaixonei pelo curso em um ano, além de gostar de argumentar e escrever! - Catarina media cada palavra para formar sua resposta.
- Paixões acabam! - Pedro lembrou-lhe.
- Por isso que no último ano estudei para obter uma boa nota no PSG e conseguir uma vaga no curso.
- PSG é furada. - Pedro bufou.
- Por que?
- Graças ao PSG eu atrasei a minha vida e só consegui entrar na faculdade após me desiludir com o método e prestar vestibular tradicional.
- Quantos anos você tem?
- Vinte. - Ele suspirou e se corrigiu. - Dezenove. Faço vinte daqui à quinze dias. Estou tentando me acostumar com essa idade. - Respondeu a pergunta que Catarina não fizera.
Ela riu.
- Eu agradeço ao PSG por estar aqui. Nunca fui a melhor aluna da sala para lembrar o conteúdo de três anos num único dia.
Foi a vez dele rir.
- Aonde você mora? - Ele perguntou.
- Ponta do Farol e você? - Ele arregalou os olhos com a resposta.
- Ah foi mal. Deixa eu ir pro São Francisco com meu ônibus que nunca me abandona. - Ela riu.
- Por favor. O São Francisco não é um bairro ruim. E eu não sou rica, se é isso que você está pensando. - Pararam em frente ao carro dela. - Quer carona? - Ela apontou para o carro parado.
- Já disse, vou com meu ônibus. - Ele demonstrou pela primeira vez seu orgulho infinito.
- Fala sério. Você vai pro terminal enquanto eu posso te deixar em casa! - Ela falou sério e ele riu.
- Tudo bem, prometo não te sequestrar durante o caminho.
- Eu sei que parece loucura fazer isso, mas sempre gostei de dar carona

***

Durante o caminho conversaram banalidades que fazia o clima de amizade entre eles crescer. Em momento algum Catarina disse que ele tinha dado em cima de sua amiga, assim como ele se manteve calado quanto ao assunto. Pedro parecia ser um garoto legal, daqueles que valia a amizade para a vida inteira. Aparentava ser estudioso e jogava futebol até enquanto dormia. Catarina deduziu que era o motivo do seu corpo ser tão atlético. Morava com a mãe, o padrasto e a irmã pequena de dois anos. Via o pai uma vez por ano, ou menos. Eram mais amigos que pai e filho.
Ao chegarem no bairro, Pedro orientou Catarina em como chegar ao seu prédio.
- Por favor. Estamos no Renascença! - Catarina explicou.
- No endereço daqui é São Francisco. - Pedro deu de ombros e desatou o cinto de segurança.
- Fala sério. - Eles riram. O silêncio tomou de conta do carro. Catarina não queria dar tchau, pois poderia soar grosseiro.
Pedro passou a mão entre seus longos cabelos e tomou a iniciativa.
- Então... - Ele disse.
- Então. - Ela finalizou as reticencias.
- Obrigado pelo ato singelo. - Ele disse, ainda tímido.
- Não tem de quê. - Mais uma vez silêncio.
- Você tem meu msn não é? - Ela perguntou.
- Sim, eu anotei. - Ele disse e apontou para a mochila nas costas, onde estava seu caderno com o msn da garota anotado.
- Então nos falamos.
Ela esperou ele entrar no prédio e deu a partida para sua casa. Ainda não entendia o que tinha acontecido. Catarina não era a pessoa mais experiente do mundo quanto a relacionamentos. Já tivera um ou outro namorico, dos tempos da escola. Dos tempos da escola. Parecia que a escola já estava longe demais após aquela semana na faculdade. Mas ela sabia que já tinha amadurecido um pouco. E que, caso ele quisesse, Pedro seria a melhor forma de fazê-la amadurecer mais.
Chegou em casa e pela primeira vez na semana esta estava silenciosa. A sexta-feira sempre fora o pior dia para a garota. Desde sempre passara o dia no tédio. Todos viajavam ou nunca voltavam cedo. Catarina morava com a mãe e os avós. A mãe viajava todas as sextas-feiras à trabalho. Às vezes os avós faziam o mesmo, mas apenas para passar uns dias na fazenda e aproveitar os dias de aposentados. Catarina preferia ficar em casa, no tédio, se enchendo de besteiras, ou lendo livros, à sair de casa. Com toda aquela ausência não via nos estudos a melhor companhia. E com uma semana de aula na faculdade não possuia tanto conteúdo para se preocupar.

Pôs o almoço para esquentar enquanto tomava banho. Ela tinha o tempo cronometrado para banhar e não deixar a comida queimar. Não entendia porque sua mãe não tinha comprado um microondas ainda. Fez seu prato e ligou o computador para ver se tinha algum recado no Orkut. Almoçava enquanto respondia os seus recados. Ao entrar no msn recebeu uma solicitação de amizade.
Pedrão (j_pedro_gato@hotmail.com) quer trocar mensagens instantâneas com você. Você conhece Pedrão?
Ela se agoniou e não acreditou quando viu que o garoto já tinha lhe adicionado no msn. Imediatamente aceitou e ele estava online. Não quis puxar conversa. Ia parecer desesperador demais. Então uma nova janela surgiu na barra de início e começou a piscar. Ela respirou e clicou na janela.
Pedrão diz:
oooooooi :)
Cat. 100% gata diz:
quanto tempo, não? rsrs
Pedrão diz:
você já almoçou?
Cat. 100% gata diz:
sim
na verdade estou almoçando
e você?
Pedrão diz:
estou fazendo o mesmo
não é o correto sabia?
Cat. 100% gata diz:
ainda bem que você sabe rsrssrsrs
Pedrão diz:
rsrsrs
Cat. 100% gata mudou seu nick para Cat. B.
Pedrão diz:
Cat. B.? B. de Barcelos? rsrsrs
Cat. B. diz:
não bobo, de Bogéa
Catarina Bogéa
Pedrão diz:
você sabe que é brincadeira
mas poderia não ser.
Ela piscou e não sabia o que responder.
Cat. B. diz:
como assim???
Pedrão diz:
você poderia ser uma Barcelos. Catarina Bogéa Barcelos. Que tal?
Cat. B. mudou seu nick para Catarina Bogéa Barcelos.
Pedrão diz:
kkkkkkkkk
Catarina Bogéa Barcelos mudou seu nick parar Cat. B.
Cat. B. diz:
pronto!
Fui por um milésimo de segundo sua Catarina Bogéa Barcelos.
Pedrão diz:
pena que você foi minha por pouco tempo.
Ela piscou. Releu a frase. Releu o minha. Aonde ele queria chegar? Era tudo brincadeira?
Pedrão diz:
ei. cadê você? se assustou com a minha posse?
Cat. B. diz:
oi, perdão.
sim
Você é louco
mal te conheço e já sou sua?
Pedrão diz:
depende de você querer ser minha ou não.
Ela não sabia o que estava acontecendo. Mal conhecia o garoto, e ele a envolvia com indiretas tão diretas. Ela não sabia o que responder, muito menos como reagir aquilo tudo.
Cat. B. diz:
você parece ser um bom proprietário. rsrsrs
Pedrão diz:
nunca reclamaram
você quer ser minha?
O que aquilo significava? Estava na hora de parar a brincadeira, pois poderia ser algo mais sério do imaginava.
Cat. B. diz:
o que você REALMENTE quer dizer quando pergunta se quero ser sua?
Pedrão diz:
não deveria ter dito isso
não deveria dizer isso por aqui
não sou o tipo de garoto que pede pra ficar com uma garota tão de repente mas, eu já disse
você quer ficar comigo?
Você quer ficar comigo? Você quer ficar comigo? Você quer ficar comigo?
Aquilo estava martelando a cabeça da garota, ela continuava paralisada em frente ao computador.
Pedrão diz:
pela sua resposta, ou falta dela, eu acredito que não.
Cat. B. diz:
você é meio rápido
Pedrão diz:
talvez não, passei uma semana te observando se você bem lembra
Cat. B. diz:
ah, você finalmente confessou que foi você?
Pedrão diz:
percebi que você é uma boa pessoa e hoje eu só tive certeza disso
gostaria que você aceitasse
kkkkk quem começou foi você!
Cat. B. diz:
obrigada. acho que não seria nada mal ficar com você
mas precisa ser logo?
Pedrão diz:
não precisa não
quando for pra ser, será.
Passaram a tarde inteira conversando barbaridades, talvez as mesmas que conversaram no carro, mas não ligaram, o papo fluía automaticamente. Pararam de conversar pois Pedro tinha combinado uma bola na praia com os amigos da escola.
Pedrão diz:
você não quer ir?
eu prometo não jogar e te fazer companhia
Cat. B. diz:
não se preocupe
não sou muito de sair às sextas-feiras.
Pedrão diz:
deveria
Bom, até mais
Bj
Xau.
Cat. B. diz:
txau
bjsss