Um velho amigo

19 2 0
                                    

- Filho! Que lindo seu quarto, e ainda está com vista pro mar, uau!- Cassandra exclamou ao entrar no quarto do filho.
- Mãe já falei pra bater antes de entrar. - disse Willian cobrindo o peito nu com uma toalha.
- Ora! Sou sua mãe, e não há nada de mais aí- disse Cassandra apontando com o dedo indicador para o filho que se cobria com uma toalha da cintura pra baixo, e com a outra, que antes secava os cabelos úmidos pelo chuveiro, tentava tapar os ombros.
- Vire-se, que colocarei uma roupa.- ele pediu, e assim que sua mãe o fez pôs uma velha camisa de malha.
- Coitada! Mesmo que ela tenha saído da crise sei que ela sofre.- disse Cassandra, enquanto olhava pela janela, esperando que seu filho terminasse de se vestir.
- Ela estava horrível hoje! Emagreceu muito, tanto que conseguimos ver seus ossos do rosto e clavícula. E o modo que tratou os criados durante esse tempo foi terrível. Não sei como não a abandonaram.- disse Willian enquanto terminava de colocar uma calça jeans surrada.- Pronto mãe, pode se virar.
- Não acho que você devia julgá-la dessa forma, afinal você mesmo disse que se não entendesse seus motivos não seria cavalheiro o suficiente.- Cassandra provocou enquanto se virava novamente pra contemplar seu filho.
- Sei mãe. Sei que você queria me apresentar a sua meia "filha"- ele fez aspas com a mão- na intenção de que me apaixonasse por ela, isso não vai acontecer. E você sabe que já estou apaixonado por Kathrine.- disse ele colocando os tênis.
- Ela não é dama o suficiente pra você. E você sabe disso. Sabe que a aparência não é tudo, olhe um pouco mais com o coração Willian! - Cassandra falou enquanto seguia seu filho que se dirigia a porta.
- Mãe! Com todo o respeito... Se Kathrine não é dama o suficiente, Maryanne não será.- e dito isso saiu pelo corredor, se dirigindo ao primeiro andar. Antes que ele descesse as escadas Cassandra gritou:
- Eu não diria isso! - mas ele não deu ouvidos.
                                                               ###############################
- Querida o que faz aqui?- Cassandra se aproximou de Mary.
- Gosto de vir aqui e sentir o vento, ele é úmido e salgado. Foi o meu companheiro durante três anos.- disse Mary pegando os saltos que estavam na areia da praia e se movendo em direção à água.
- Sei... Deve ter sido horrível ficar aqui esse tempo todo, mas me pergunto por que você so deixou que eu falasse com você? Por que não deixou que Cintia, por exemplo, o fizesse?- Cassandra falou enquanto tentava equilibrar-se no salto que penetrava na areia fofa.
- É melhor tirar os sapatos se não irá acabar caindo... E o que aconteceu com você? Engordou desde a última vez que a vi.- Mary respondeu fugindo do assunto.
- Sabe como é... A vida mudou, eu não trabalhei tão duro depois que fui embora. Vida de mulher que tem tudo mão beijada.Mas no final meu marido faleceu de um jeito ou de outro.- Cassandra falou olhando pro horizonte.- Mas não fuja do assunto...- ela fitou Mary.
- Acho que eu meio que esperava que você viria, e parecia que você era a única que podia me fazer sair da cápsula que eu formava em volta de mim, que me afastava de todos.- Mary disse levantando a barra do vestido que usava até a altura dos joelhos e colocando os pés na água.
- Minha pequena, sempre espirituosa.- Cassandra falou, como se Mary fosse uma criancinha.
- Pois é! Essa Mary sempre esteve aqui esses anos, só não queria sair.- Mary sorriu, enquanto apontava pro seu coração.
Elas andaram, conversando, pela margem do mar. Mary de pés descalços e Cassandra tentando se equilibrar no salto, que apesar de não ser nem um pouco alto, penetrava na areia, fazendo com que ela perdesse o equilíbrio e se escorasse em Mary, que por sua vez quase caía também.
                              ####################################
- ...depois ponha o tempero na panela e...- Wllian explicava como fazer um prato que aprendera no seu estágio para o cozinheiro chefe da casa, mas parou ao ver, pela janela da cozinha, Mary e Cassandra entrando pela porta de trás, sujas de areia e meio molhadas, e sentando-se na mesa da cozinha. As duas riam muito, enquanto tentavam limpar-se.
- Não acredito que fizeste isso comigo, Katia demorou a arrumar meu cabelo. Você sabe como é difícil tirar areia de cabelo cacheado?- Mary disse fingindo, em vão, ficar brava.
- Primeiramente seu cabelo não é cacheado, é ondulado. E não tem areia no seu cabelo mocinha, tem água.- Cassandra falou com o dedo indicador apontado pros cabelos de Mary, que agora não estavam mais presos, e sim todo soltou, com alguns fios caídos por seu rosto.
- Me desculpe senhora Cassandra, mas na água iídiche, que é a que se encontra no meu cabelo, tem areia e eu...- Maryanne falava, tentando se justificar, mas Willian saiu pela porta rindo da cena, com os braços cruzados.
- Como nos velhos tempos! Vocês duas rindo como se fossem duas menininhas.- ele falou chegando mais perto. Se aproximou de sua mãe, se abaixou e pegou a barra do vestido dela, observando com um sorriso.
- Mãe?! Mais que...- então ele levantou-se e observou os cabelos emaranhados de Maryanne, tocando-os nas pontas- O que vocês estavam fazendo?- ele perguntou sério, mas caiu na gargalhada. Maryanne e Cassandra o olhavam com intriga, mas ao perceber do que o filho ria, Cassandra começou a rir também. Os dois olhavam pra Mary que já estava ficando corada de vergonha.
- Do que riem?!- Mary perguntou num fiapo de voz.
Os dois então, ao perceber a decepção nos olhos de Mary, pararam de rir. Então Wllian tirou do topo da cabeça uma alga, e mostrou pra ela. Ele e Cassandra esperavam que Mary saísse chorando de vergonha, como uma dama normal faria, ou pelo menos ficasse irritada, mas ao em vés disso Maryanne começou a rir, rir tanto, a ponto de ficar vermelha e sair lágrimas pelos seus olhos. Ela sentou-se, pois começou a sentir dor nas costelas, enquanto os dois a olhavam com a dúvida estampada em seus rostos.
- O que foi?!- Mary consegui perguntar depois que se acalmou.
- Hum... Acho que não esperávamos essa atitude!- falou Cassandra. Wllian assentiu com a cabeça, embasbacado.
- Não sei por que estão tão assustados, eu não sou uma boneca. Também sei rir!
- Sim... Sabemos disso... Agora. Mas a questão é que na sua situação não era de se esperar que uma dama fizesse o que fez...- Wllian comentou.
- Por que não?
- Não sei bem por que, mas é o que toda a dama não o faria.
- Sim, mas não sou como todas as damas. Sair brava por que um fato que me aconteceu ser engraçado é muito menos digno de uma dama do que rir da situação, não acha?!- Wllian arregalou os olhos, com a resposta de Maryanne.
- Hum... Eu...- Cassandra o interrompeu com uma gargalhada.
- Querida, não seja tão grossa com meu menino- Cassandra Deus uns tapinhas nas bochechas de Willian, e depois abraçou Maryanne- ele não está acostumados com damas de verdade como você. Só com damas como Kathrine...- o final da frase foi dita em sussurro de forma que só Willian foi capaz de ouvir.
Cassandra guiou Mary para sala principal
- Não dê ouvidos ao que ele diz. Ele esteve fora de si nesses dias. Ele era pra estar no último ano da faculdade, mas falei que viria pra cá, e ele disse que viria comigo, enato teve de trancar o último ano, e isso tem afetado ele.
- Ele faz faculdade de que?
- De... Quer saber de uma coisa, por que vocês não conversam uma hora dessas!?- Cassandra falou quando parou em frente ao seu quarto.- Vou falar com Wllian pra convidá-la para um passeio.
- Não sei se será uma boa ideia.
Mary continuou no corredor e subiu para o  terceiro andar, onde seu quarto estava. Ela observou os empregados correndo de um lado pro outro com as coisas do quarto de seu pai, e outros subindo com as suas coisas, da sala de artes.
Mary entrou no quarto tomou um banho e deitou-se na cama para ler um pouco onde passou o resto da manhã. Ao meio dia bateram na porta. Era Katia com o almoço de Mary, que logo a chamou pra jogarem cartas e lerem juntas, mesmo Katia dizendo que tinha serviço pra fazer.
No final da tarde quando as duas já haviam cansado de jogar, e agora liam sentadas no chão, ouviram uma batida na porta.
- Mary, deixa que eu abro e...- Katia ameaçou levantar-se quando Maryanne a puxou pra sentar-se de volta na almofada que elas tinham colocado por todo o chão.
- Seja quem for tem braços.- Mary falou olhando pra Katia, e logo que está se sentou novamente, Mary olhou pra porta e gritou- Pode entrar.
A pessoa do lado de fora pareceu um pouco receosa, mas abriu.
- Uau! Noite do pijama meninas.- Wllian falou observando o quarto. A cama estava desarrumada, a mesinha que ficava entre dois sofás num canto do quarto fora puxada pro meio do quarto, cheia de cartas e copos de suco, o chão estava com almofadas pra todo lado.
- Você não mudou nada né Willian. Continua o mesmo chato. Seus comentários não me servem de nada, sabia!?- Mary falou se levantando.
- Você também não mudou muito, Maryanne. Eu ia te chamar pra um passeio pela praia, mas parece que você está muito ocupada com o escrito de...- ele olhou pra capa do livro de Mary.- Jane Austen. Este livro é muito bom.
- Você já leu orgulho e preconceito?- Katia falou intrigada.
- Oi Katia! Não tinha te visto aí no meio de tantas almofadas, continua bem madrinha. Como sempre.- Willian fez uma careta divertida.
- Willian você não mudou nada mesmo.- Katia levantou e se dirigiu para a porta. Willian deu passagem pra Katia, que parou e o olhou nos olhos.- Achei que os cinco anos iriam te amadurecer, mas parece que não.- Então ela fez uma careta, e desceu as escadas.
Willian, que a observava, virou-se pra Mary que o olhava fomos olhos semi cerrados.
- Achei que quando as visse, vocês estariam mais educadas, mas parece que estava errado.- Willian disse já entrando no quarto e chutando algumas almofadas- Hoje de manhã na cozinha, quando nos  vimos pela primeira vez depois de cinco anos, eu não te reconheci, nem pela aparência, nem pelo comportamento, parecia uma mulher, mas depois, um pouco mais tarde, você me respondeu daquele jeito, e ainda estava toda suja de areia, lembrei-me de quando você era criança e eu percebi que havia sido um equívoco.  E foi.- falou se virando pra Mary.
- Acho que você precisava ver que eu não mudei, e nem mudarei. Eu sou assim e sairei assim. Se continuar me visitando vai ter que se acostumar.- Mary falou enquanto se abaixava pra pegar algumas almofadas e jogava em cima da cama. Depois se abaixou do lado da mesinha e recolheu as cartas, fazendo um montinho   com elas, e colocando-as em uma caixa, que logo depois colocou num armário. Willian ficou observando-a, encostado na parede ao lado da porta do banheiro da suite, até que todo o quarto estivesse arrumado.
- O que foi?!- Mary perguntou enquanto tentava esticar o cobertor na cama, que era muito grande. Com a pergunta Willian acordou de seu momento observador e ajudou, se pondo do lado oposto da cama esticando e dobrando o cobertor nas partes necessárias.
- Nada! Eu só estava te observando. Você tem tantos empregados e você mesma arruma o quarto?!- ele disse terminando de por umas almofadas em cima da cama.
- Não vejo nada de errado nisso...- ela respondeu sem olhar pra ele, que a fitava.
- Sim... Na há nada de errado nisso, mas não é normal. Só isso!
- Ja não te disse hoje de manhã que não sou como as outras damas!?
- Disse... Mas ...- ele olhou pra cima pensativo e então voltou a fitá-la com os olhos brilhantes.- Deixa pra lá, acho que nunca vou entendê-la.
- aAcho que desistir de me entender é o melhor que você faz, afinal nem eu mesma me entendo... Mas afinal, por que veio aqui mesmo?!- Maryanne falou colocando a última almofada do chão na cama, deixando, assim, o quarto todo arrumado.
- Eu ia te chamar pra... -mas um trovão o fez interromper a frase.- Quer saber... Acho melhor marcarmos outro dia. Não quero ficar gripado.- ele disse ainda olhando pra porta de vidro que dava pra sacada, onde escorriam os primeiros pingos de chuva.
- Você por acaso é feito de açúcar?- Mary falou pegando umas roupas no armário.
- Não...- Willian a observava enquanto procurava alguma coisa no armário gigantesco.
- É feito de papel?
- Não...- Willian começou a rir da situação.
- Então não sei por que o medo... achei.- Mary virou-se com um monte de roupas penduradas no braço e uma escova de cabelo na outra mão. Então ela pegou as roupas e jogou dentro do guarda roupa, e fechou rápido para que as roupas não caíssem. Ao perceber que Willian a observava com intriga ela tratou de explicar-se.- Sabe como é... Estou a três anos sem mexer nesse armário. Esqueci onde ficam algumas coisas.
- Sei... Então Aceita ir comigo pra algum encontro... algum dia?- disse Willian vendo que a chuva só aumentava.
Maryanne o olhou nos olhos e fez uma careta engraçada, que fez Willian rir, e então disse
- Sim, aceito. Agora me dê licença, eu tenho que trocar de roupa, para ir pro jantar.
- Sim, senhorita te espero na janta.

Presa no PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora