Capítulo I

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Aisha Radjaram — New Delhi, Índia

Está ficando cada vez mais difícil sobreviver. Recursos como a água estão cada vez mais raros. Graças a uma invenção minha e de meu pai, conseguimos filtrar um pouco deste líquido tão precioso, tirando a água de um córrego imundo que corre perto de nossa casa.

Mas não é só a água que é escassa. A comida também. Li em algum livro velho que achei no lixo que houve uma época em que as pessoas podiam tomar banho e beber água à vontade, e que comiam até suas barrigas ficarem pesadas. Mas estamos em 2152, e sobreviver vem se tornando um desafio.

18:30.

Já está na hora de ir atrás de comida. Pego uma sacola e coloco uma garrafinha já bem suja, mas que contém a preciosa água dentro. Tentarei trocar por algum alimento. Dou boa noite ao meu pai moribundo e subo rumo à colina, em direção ao mercado de pulgas. Em um mundo tão turbulento, a venda de alimentos ou qualquer tipo de artigo se tornou um ato ilegal, então muitos comerciantes optaram por vender suas mercadorias clandestinamente.

Eu repito este ritual todos os dias, desde que me entendo por gente. Antes eu só precisava acompanhar, e meu pai que fazia todo o resto, mas depois que ele contraiu uma doença pulmonar para a qual já não existe cura, tive que aprender a me virar sozinha, já que não há nenhuma esperança de recuperação para ele, pois não existem médicos, que dirá tratamento.

Não posso reclamar. Ele praticamente me criou sozinha desde que minha mãe morreu, quando eu tinha três anos. Ele nunca me contou a causa da morte dela, e não insisto porque ainda é um assunto delicado de se discutir, mesmo depois de treze anos.

Já está bem escuro quando volto pra casa esta noite. Estou caminhando pelo último beco que leva em direção ao barraco onde eu moro, quando ouço um barulho além do vento nos telhados de lona. Aperto o passo e seguro com força a sacola que contém algumas frutas murchas que consegui nesta noite. Faltam apenas 5 metros até o fim deste beco, quando sinto algo gelado espetando minhas costas.

— Encosta na parede — sussurra uma voz grossa em meu ouvido.

Obedeço e, à luz fraca da lua, posso distinguir que é um homem, apesar de não conseguir ver seu rosto com clareza. Analiso minhas opções. Eu não poderia gritar, porque sei que ninguém viria ao meu socorro. Se saísse correndo, ele me furaria.

— Passa a sacola — ele diz, agora mostrando a lâmina.

— Não — digo com firmeza.

— Não? Você quer perder esse rostinho lindo? Passa a sacola antes que eu te mate aqui mesmo, sua vadiazinha.

— Eu já disse que não — rebato.

Anos morando no subúrbio de Nova Delhi me fizeram adquirir uma coragem anormal.

Ele avança com a faca apontando diretamente para meu pescoço. Com a minha mão livre, empurro seu peito com toda minha força, sinto um calor vindo da palma da mesma, e ele se afasta com o impacto. Quando eu acho que ele me atacará novamente, ele larga sua faca, aterrorizado.

— S-sua bruxa! — Ele fala, com os olhos esbugalhados, e corre em direção ao caminho que veio.

Não espero ele, provavelmente, retornar com sua gangue. Corro até o final do beco e chego na entrada da minha casa. A porta está escancarada. Entro com cuidado, pois meu pai certamente não a teria deixado aberta.

— Pai? — pergunto, analisando com cuidado o primeiro e único cômodo da casa. E então eu o acho, deitado de bruços.

— Pa... — não consigo gritar. Tudo fica escuro.

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