VII - As Areias do Tempo

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The sun is the same in a relative way

But you're older,

Shorter of breath and one day closer to death.

- Pink Floyd

Sentado ali, só, em meio às árvores, o velho meditava em busca de respostas. A sinfonia de pássaros ao seu redor dava o tom para seus pensamentos.

- O que pode ter sido aquilo? - sua mente remoia o que havia visto.

Durante seus muitos anos de existência, avistara muitas coisas, a maioria delas, estranhas, bem verdade, mas nada como aquilo. Tocar outra pessoa e presenciar outro mundo, outra existência... era algo novo para ele.

Tinha os olhos ainda fechados quando sentiu a atmosfera alterar-se. A densidade do ar modificou-se. Por um instante, se tornou mais difícil de respirar. Ele abriu os olhos e notou que não estava mais sozinho.

- Olá, Tempus. - sorriu o velho.

- Há quanto tempo, Marc.

O ser a sua frente era difícil de contemplar. Tinha uma aura poderosa ao seu redor, capaz de servir de farol em um oceano escuro. O capuz amarelado encobria o rosto severo, de feições brutas, que combinava muito bem com a indumentária tecnológica que vestia.

- Nunca me acostumo com a ideia do mechadeus!

- Qual a vantagem de viajar no tempo se eu não puder ter as tecnologias a minha disposição? - a entidade esboçou um sorriso. - Mas qual a razão de teu chamado?

- Creio que encontrei o garoto. - disse Marc aguardando por uma resposta. A sua frente, Tempus não alterou sua expressão indiferente, então o velho prosseguiu. - Aquele do qual me falou...

- Sim. - o deus virou-se de costas e deu alguns passos lentos. Suas costas eram cobertas por uma grande carapaça de metal que, Marc sabia, transformava-se em duas grandes asas quando abria ao meio. - Mas não há muito que eu possa falar, ou mesmo fazer.

- Nem mesmo uma indicação, um apontamento?

- A grande vantagem do livre-arbítrio, Marc, é justamente essa amplitude de opções. Yahweh concedeu essa benção aos humanos para que usem. Conhecer o futuro é perigoso, e estraga a surpresa. Palavras Dele, não minhas.

- Tampouco me acostumo à coisa do arauto. Não lembra em nada quem eu conheci um dia.

- Mesmo os deuses mudam, Marc. A longevidade facilita isso.

- Mas eu, mesmo depois de dez mil anos, me sinto quase o mesmo.

- Talvez porque se olha no espelho todos os dias. Eu viajei por muitas eras, meu amigo. Visitei períodos passados e vindouros. Passei por muitas épocas e posso lhe dizer: que fascinante essa coisa que chamamos de tempo. Substância incontrolável, a não ser por Yahweh, é claro. Mas, mesmo ele, deixa que tudo encontre seu sentido às vezes. Acho que gosta de ver as areias caírem livremente. É fascinante como, em um piscar de olhos, se vai o ontem e chega o amanhã.

- Ao menos você não envelhece. - disse o velho, fitando as mãos enrugadas.

- Todos nós envelhecemos, Marc. - disse Tempus, externando o primeiro sorriso em muito tempo, e aquilo abria as portas para algo maior em si. - Se não o corpo, a alma. Mas todos envelhecemos.

- Tem razão. - Marc se levantou. - Bem, já que não vou arrancar mais respostas de você, devo prosseguir em minha jornada.

- Boa sorte, velho amigo. Se for o garoto, sei que estará em boas mãos. Se não for, o tempo é uma criança. - e dito isso, a entidade partiu.


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