Capítulo 3 - O Desejo

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A chuva não dava trégua. E eu sabia que o verdadeiro show estava prestes a começar. Com um estômago tão vazio quanto uma cripta abandonada, eu, um vampiro faminto, não conseguiria mais conter meus instintos.

- Oops! O que é isso? - gemi, ao sentir a fria base de aço do Jipe ceder sob meus dedos ávidos por sangue.

- Ai, droga, me cortei! - reclamou Jessy, enquanto seu pai, mais rápido que um morcego em busca de uma veia suculenta, rasgava um pedaço da camisa para estancar o sangue.

Macoy, o velho, estava tentando ser o herói aqui, mas era tarde demais para salvar o dia. Como se um pedaço de pano fosse capaz de deter o frenesi que me dominava!

- Caio, se afasta, vai embora! - gritou Macoy, com a voz mais tensa que um fio de cabelo em um vampiro careca.

- Eu... não consigo... - sussurrei, lutando contra meus próprios instintos sedentos.

Enquanto eu me debatia com minha sede insaciável, Jessy estava lá, sem entender bulhufas, apenas observando seu pai fazer um curativo improvisado mais rápido que um vampiro caçando sua próxima vítima.

- Leve-a para longe, Macoy! Rápido! - minha voz tremia, minhas presas querendo sair e fazer um buraco no meu lábio.

Sem hesitar, Macoy arrastou Jessy para longe, enquanto eu me via lutando para manter a compostura. Com a distância, eu consegui controlar minha ânsia por sangue.

- Pronto, chegou a hora - disse eu, abrindo a porta do carro com um estrondo e assustando Macoy - Vamos lá! Preciso que você dê uma carguinha na bateria do Jipe - gritei, tentando soar calmo apesar da situação caótica.

- Ok... ok! - Macoy suspirou aliviado, colocando a mão em meu ombro - Caio, você conseguiu controlar seus instintos! Isso mostra que é possível ser civilizado, mesmo sendo um vampiro!

- Não tão rápido, Macoy! - retruquei, olhando para Jessy dentro do carro - Posso sentir o cheiro dela a quilômetros de distância. Não me compare com os vampiros comuns. Meus olhos quase pegam fogo só de sentir o doce aroma do sangue. É quase insuportável! Não sei como consegui ou se conseguirei resistir a esse desejo avassalador.

A verdade é que sabia o porquê de não me saciar. O fato de morrer após provar seu mel soava bem. Mas por outro lado, eu morreria sem provar seus lábios que poderiam ser tão doces quanto seu sangue.

Enquanto eu focava em descobrir os planos de Jessy, o garoto no banco de trás não escondia seus sonhos por ela. Me enojava sempre que tentava tocá-la. Aquela aproximação me deixava enfurecido. Minha vontade era de quebrá-lo ao meio, jogá-lo no porta-malas e lançar o automóvel ribanceira abaixo.

Será que ela gosta dele? Bom, pelo menos não demonstrava.

Tentei mais uma vez dar partida e nada. O motor afogava. Por um momento de fúria, esmurrei o volante, desci do Jipe e chutei sua roda dianteira. Não muito distante, deparei-me com as luzes de um suposto caminhão. Sinalizei para Macoy sair da pista. Notei que Jessy estava inquieta. Ninguém sabia o que eu pretendia fazer. Provavelmente pensariam que estaria me suicidando. O certo era que nem mesmo eu sabia! Eu não tinha força suficiente para tirar o veículo do meio da pista. Estava sem me alimentar, me sinto humano demais. Tentei três vezes acionar o motor, mas sem sucesso. Macoy ligou seu carro e seguiu em frente. Jessy não retirou os olhos do Jipe.

Minha atenção voltada as conversas do carro:

"O que aquele louco está tentando fazer? Está tentando se matar? Aquele caminhão vai levar o que tiver pela frente!"

"Calma, filha. Ele sabe o que fazer, é bom nisso."

"Nisso o que? Tentar suicídio, idiota... papai tem que fazer alguma coisa, deve estar fora de si..."

Dois Mundos: Sangue e MagiaOnde histórias criam vida. Descubra agora