Capítulo 6: Das Cinzas à Verdade

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_O que?!

_Deixe-me terminar de dizer agora que finalmente tive de coragem suficiente para revelar. Sua mãe e eu éramos felizes, tínhamos uma vida abençoada e tranquila. Como você sabe, ela era camponesa, e eu era filho do barbeiro. Foi seu avô quem iniciou esse trabalho. Nosso casamento havia sido uma troca de favores mútua; eu teria essa casa e a barbearia como herança, e seria conveniente pra ela que detestava a vida nos campos. Ela poderia vir morar na vila e se dedicar a cuidar dos afazeres domésticos ao invés do trabalho exaustivo nas plantações, e eu estava passando da idade para me casar. Os dois sairiam ganhando. Alguns anos depois, quando estávamos esperando seu nascimento, eu comecei a reparar um comportamento estranho por parte dela, não queria ir à igreja, e saia escondida no meio da noite para a floresta. Certa noite eu decidi que a seguiria e desvendaria o mistério, e assim o fiz. Eu a segui até uma cabana na floresta; a princípio imaginei tratar-se de adultério, mas quando entrei, percebi que havia ali um altar dedicado a divindades pagãs, nas paredes, havia símbolos que eu nunca saberei o que significavam. Eu a trouxe de lá imediatamente, ela tentou explicar e implorou para que eu não a entregasse ao conselho. Estava grávida, então concordei. Então você nasceu, foi uma grande alegria pra nós. Entretanto eu não poderia perdoá-la, se o fizesse estaria sendo cumplice. Então, assim que terminou o tempo de amamentação, eu a denunciei ao conselho. Levei-os até a cabana, e os sinais da bruxaria dela estavam ainda intactos naquele lugar. Incendiamos a cabana com sua mãe dentro, ouvindo seus gritos de agonia até que cessassem, e lá permanecemos até o fim para nos certificar de que ela não havia escapado. A não ser eu e os membros mais antigos do conselho, ninguém nunca soube a verdade e agora você também sabe.

Não pode ser. – Repetia repetidamente atordoado com a revelação. É claro que eu havia entendido perfeitamente o que meu pai acabara de dizer, só me recusava a aceitar. Eu cresci acreditando que a praga havia tirado a vida de minha mãe, quando na verdade meu pai a entregou a mercê das barbáries cometidas pelo conselho. Meus olhos se preencheram de lágrimas, lágrimas pela mãe que eu nunca conheci. A que me deu a vida, e teve a própria tirada de forma tão brutal.

_Como o senhor pode ser capaz de entregar a vida da sua esposa como se fosse nada nas mãos de assassinos?! A vida da minha mãe! Fui tudo uma mentira. Irônico, principalmente de quem me educou pra "nunca mentir". O que mais era mentira? Como posso saber se não há mais nenhum segredo escondido? Eu só possuo um, e agora o senhor sabe.

_Eu juro, que tudo que fiz, fiz pensando no seu bem e no seu futuro.

_Meu bem? Meu futuro? Há um dia atrás o senhor queria praticamente me vender com seus planos de casamento por dinheiro. Você não pode ser capaz de saber o que é pro meu bem ou não. Não depois disso.

Sai batendo a porta atrás de mim com mais impacto do que eu havia planejado. A história da morte devido à peste era uma farsa encobrindo mais sujeira do conselho; e dessa vez meu pai estava enterrado até o pescoço nisso. Todos tinham sangue nas mãos e na consciência, se é que tinha consciência. Sentei me frente à mesa, e enchi um copo de vinho. Lágrimas salgadas temperavam a bebida que descia praticamente sem gosto devido ao meu estado de choque. Todo esse tempo; eu me senti culpado por ser quem eu era. Nunca quis dar desgosto ao meu pai, afinal; laços de sangue estavam acima de qualquer coisa, e no final... Foi ele quem me decepcionou.

O ar dentro de casa estava me matando, eu tinha a extrema necessidade de sair dali e ir pra qualquer lugar. Se fosse possível ir á uma montanha bem alta e me isolar eu o faria. Sai de casa e de forma automática fui para o lugar que sempre ia quando queria desabafar. Algum tempo depois me vi entrando na propriedade da família de Rick. Ele não trabalhava, até porque não precisava; seu pai era um dos mais ricos e influentes do condado. Não foi preciso usar o sinal secreto; Rick estava do lado de fora escovando o pelo de seu cavalo que ele tratava como se fosse uma pessoa. Danúbio era um animal belo e forte, com cores que situavam entre tons de marrom claro e branco.

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