O quarto perfeitamente organizado; exceto por uma cadeira tombada, e o corpo morto e frio de meu pai enforcado na porta, que caiu ao chão quando eu a abri. Meus nervos foram ao limite. Ácido parecia percorrer minhas veias ao invés de sangue. Estava impotente diante da situação mais uma vez, e agora também estava sozinho no mundo.
Gritei. Foi a única maneira que encontrei de dissolver o torpor que se instalava em mim, e então logo a porta da frente foi chutada e a casa preenchida pelas pessoas que passavam do lado de fora naquela hora. Eu não me movia. Poderia tê-los expulsado, eu queria; mas meu corpo não me obedecia e tudo o que eu tinha consciência de estar fazendo era chorar.
Eu podia ver claramente o horror estampado nas faces de cada um. Parecia que temiam se aproximar do corpo, vendo as circunstâncias da morte. Tudo isso pareceu acontecer lentamente, como em um universo paralelo a este; então friamente consegui levantar-me do chão. Cheguei mais perto, desatei o nó em seu pescoço e fechei-lhe os olhos para este mundo.
Meus sentidos estavam adormecidos, eu não ouvia nada além da confusão em minha mente e das batidas secas no meu peito. Mas no instante seguinte o som externo voltou a soar na minha cabeça. Os comentários que eu ouvi ali foram horríveis. "Ele vai para o inferno." "Tirou a própria vida!" "Não pode receber um enterro cristão". Julgamentos e mais julgamentos. Foi demais; nessa hora eu explodi de uma vez só tudo que havia guardado em mim na forma de uma ira cega e violenta. Expulsei aquelas pessoas dali sem ao menos me dar ao trabalho de saber quem eram. Elas não podiam fazer nada. Ninguém podia.
Sozinho novamente tomei seu corpo em meus braços e as lágrimas voltaram a verter como uma fonte. A janela abriu com violência e um vento frio soprou dentro do quarto me causando arrepios. Um envelope branco caiu no chão, ele poderia estar ali o tempo todo mas só naquele momento eu o percebi. Era uma carta. Uma carta de despedida do meu pai.
Querido Jefferson; fui um covarde desde o início e agora morrerei como um. Todos esses anos eu carreguei o duro peso da morte de Magdalena em minhas costas, como um eterno fardo que fazia com que eu me lembrasse do que fiz dia após dia. Eu consegui cria-lo sozinho, dei estudo e tentei mantê-lo dentro dos caminhos do nosso Senhor. Nos últimos dias eu vinha refletindo; na maioria das vezes, o que é bom pra uns não é para os outros. Você é especial meu filho, e eu quase tirei isso de você. Sinto muito. Espero que um dia possa perdoar-me pelos meus pecados, pois digo do fundo da minha alma abatida, que tudo o que fiz, fiz para seu bem. Você escolheu seu próprio caminho, siga-o até o fim. Você é capaz de qualquer coisa que quiser. Você é como sua mãe foi, indomável. Se um dia chegar a amar alguém, lute por isso. Não seja um covarde, não seja como eu. Estou deixando essa casa e a barbearia como suas propriedades a partir deste dia, e o testamento está sobre a mesa de bebidas. Aquelas economias não eram as únicas, procure em baixo de sua cama e encontrará. Seja feliz meu filho, seja o que eu não fui.
Adeus.
Com amor; Frederick Marshall.
As palavras estavam ali, impressas no papel com a letra tremida de sempre; seu corpo também estava ali. Sem vida, frio, e não havia mais nada que eu pudesse fazer a não ser enterrá-lo. Naquele tempo; a igreja recusava-se a velar suicidas, pois era crença universal que apenas Deus dava a vida e apenas Ele poderia tirá-la. Acreditavam que, aquele que retirasse a própria vida mesmo sob as circunstâncias mais aflitivas, estavam condenados ao inferno; onde suas almas seriam dilaceradas em agonia para sempre. Saber disso não melhorava em nada meu estado, e impediria meu pai tivesse um enterro cristão, que era presidido por um sacerdote. De qualquer forma, eu precisava tentar.
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Atração Infernal
General FictionEstou apaixonado por um demônio, e por isso estou condenado ao inferno. Receberei o castigo por nutrir um sentimento tão puro por alguém que joga no lado negro do tabuleiro. Então antes que eu seja levado, vou lhes contar como aquele anjo obscuro en...