Caminhava imerso em pensamentos em direção à minha casa, quando me aproximava da praça do comércio, pude ver uma pequena multidão se aglomerando e um som indecifrável de muitas vozes juntas e exaltadas. Alguém falava à frente daquela aglomeração, o magistrado – presumi.
"Caros cavalheiros, chegou ao conhecimento do nosso conselho que práticas pagãs estão ocorrendo em nossa abençoada comunidade. Denúncias a respeito de grupos ciganos, adivinhações e quem sabe até mesmo bruxaria! Deus condenará esses pecadores, pois a Sua palavra diz "Não vos dirijais aos espíritas nem adivinhos." Como também diz "Qualquer homem ou mulher que evocar os espíritos ou fizer adivinhações, será morto." Não vamos tolerar nenhuma feitiçaria nessa comunidade, e como representante do conselho, digo que, qualquer um que for pego em tais práticas será enforcado, e quem acobertar tal afronta às leis do nosso Senhor, sofrerá também as consequências! Vão para suas casas, e pensem bem a respeito. Informações que não forem passadas ao conselho serão severamente punidas".
A multidão aos poucos foi se dispersando, e não pude deixar de me lembrar das previsões feitas pela cigana, quando estava a caminho da propriedade dos Fordson. Isso com toda a certeza era uma informação; mas por outro lado, de certa forma eu havia permitido que ela fizesse uma leitura das palmas de minhas mãos. Tecnicamente eu era cumplice e já estava me afogando em problemas, não precisava de mais um. Concluí que era melhor ir embora e nunca revelar esse fato a mais ninguém.
Estava exausto, sujo e faminto como um mendigo quando cheguei em casa; e ao abrir a porta vi que uma desordem se instalava no interior. Móveis tombados, vidro quebrado, e escuridão. Os lampiões já deviam estar acesos àquela hora. Fiquei apreensivo, iluminei o ambiente e tudo estava como se um furacão tivesse passado por ali. Fechei a porta, e então verifiquei que preso à ponta de uma faca, um bilhete havia sido dobrado.
"Por sua insolência seu pai pagará. Quando disse que estavam falidos, não estava apenas ameaçando. Agora entenderá que quem tem poder tem tudo."
Caí de joelhos completamente atônito com o que havia lido. Isso era trabalho daquele porco, que com o orgulho ferido procurou vingança. Mas o que Walter Sólomon teria contra meu pai, para arrancá-lo de dentro de casa com tamanha brutalidade, considerando a destruição deixada no processo? Meu Deus! Nessa hora meus pensamentos levaram um choque. Será que seria capaz de fazer mal a ele? Isso era tudo culpa minha, seria melhor pra todos e principalmente pra mim mesmo que dessem fim à minha vida, e não à de meu pai.
Já havia escurecido, e a maioria das pessoas já haviam se recolhido em casa. Se Walter estiver planejando acusar meu pai de alguma coisa, ele deve tê-lo mandado para a custódia da carceragem da vila. Não era um caminho longo, então fui o mais rápido de pude, correndo como nunca havia corrido na vida. Acreditariam se eu dissesse que fui eu o inventor da expressão - "Vai tirar o pai da forca?"- os últimos cidadãos que ainda caminhavam nas ruas me olhavam curiosos, certamente tentando imaginar o motivo do meu desespero.
Cansado e totalmente amedrontado cheguei à carceragem da vila, era um tipo de cadeia provisória naqueles tempos. Não havia guarda naquele dia, já que a escolta era uma opção apenas para criminosos perigosos, ou alguma suspeita de bruxaria. A cena que vi partiu um pouco mais meu coração que já estava um tanto quanto pisoteado desde o início; meu pai estava recostado na grade, e se virou devagar quando me aproximei. Havia machucados em seu rosto, o que demonstrava sinais de violência. Parecia muito mais cansado e deprimido que eu. E não era pra menos. Perguntei a ele o que havia acontecido; e senti que ele me relatou a situação apenas por falta de alguém melhor. Não era eu a pessoa que ele mais queria ali naquele momento.
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Atração Infernal
Fiction généraleEstou apaixonado por um demônio, e por isso estou condenado ao inferno. Receberei o castigo por nutrir um sentimento tão puro por alguém que joga no lado negro do tabuleiro. Então antes que eu seja levado, vou lhes contar como aquele anjo obscuro en...