Capítulo 4

2.1K 172 132
                                    

"I hope I can be able to have him
here more often."

Acordo com algo a roçar no meu nariz, não quero levantar-me, mas esta coisa já me está a irritar. Abro os olhos devagar vendo um papel em cima da minha almofada. Pego nele e leio.

'O Hershel pediu que o fosses ajudar quando acordasses.'

A caligrafia não é das melhores, mas ao menos dá para perceber o que está escrito. Beth deve ter deixado este bilhete antes de eu acordar.

Pego numa muda de roupa e visto-me. O dia está quente por isso uso as mesmas calças de ontem e apenas um top na parte de cima. Guardo o bilhete no bolso das minhas jeans, deixo Dylan a dormir e dirigo-me ao refeitório, no bloco B. Em cima da mesa estava uma massa feita pelas mulheres do bloco A, acho que elas queria fazer pão, mas não resultou lá muito bem...

Lavo os dentes, penteio o meu cabelo com os dedos o melhor possível e caminho até ao pátio.

Ando lentamente pela relva do pátio até encontrar Hershel a trabalhar na sua horta e, então, vou em direção a ele. Estranho a ausência de Carl ali, vejo-o todas as manhãs a trabalhar com Hershel na horta. Talvez seja por isso mesmo que ele precisa da minha ajuda...

"Bom dia." ele cumprimenta-me com um sorriso. "Vejo que recebeste o recado do Carl."

Ah então foi o Carl que me mandou o papel e não Beth...

"Sim, ele mandou um bilhete." digo.

"Ele teve de ir cuidar da irmã agora, mas fico contente por não passar a manhã sozinho." a sua voz é amena e amigável. Hershel é um senhor simpático, mas continuo um pouco intimidada com as pessoas desta prisão. "Vamos começar?"

Hershel explicou-me tudo o que precisava de saber para tratar da horta e poder ajudá-lo, passamos pelo menos umas duas horas de volta da horta, mas senti-me bem e útil. Ele disse-me que eu aprendia depressa e que gostava de ter a minha ajuda daqui para a frente, eu fico feliz por isso, assim terei algo para fazer e não estarei só a servir de peso morto.

Hershel sorri-me depois da pequena conversa e sai, deixando-me sozinha.

Lembro-me que Dylan ficou a dormir na cela, por isso vou até ao seu encontro e vejo-o a encarar o teto, deitado no beliche de cima. Ele está tão concentrado que nem repara na minha presença, até que lhe toco nas pernas, assustando-o.

"Não tens fome?" pergunto-lhe e ele nega com a cabeça.

Subo as escadas do beliche e sento-me ao seu lado, encarando o teto também. Ele senta-se e olha para mim, abrindo a boca para perguntar algo, mas fechando-a logo a seguir.

"Diz..." rio, despenteando-lhe o cabelo.

"Onde está a minha mamã?" ele pergunta e o meu coração dispara. "Tu disseste que ela ia voltar, mas ela não está aqui."

Não consigo evitar que várias lágrimas inundem os meus olhos, portanto, limpo-as disfarçadamente e sorrio para Dylan.

"Ela vai voltar..." minto. "Tens de esperar pelo momento certo, só isso." abracei-o de lado e rapidamente ele me abraçou da mesma forma.

Como é que se diz a uma criança de sete anos que, provavelmente, a mãe está morta? Como é suposto fazer com que o Dylan entenda que nunca mais vai ver a mãe ou receber um beijo de boa noite por parte da progenitora? Não posso fazer isso! A única opção é omitir a situação.

"Porque é que não vais á hora da história, com a Carol?" clareei a garganta, tentando não chorar á frente de Dylan.

"Depois vais lá ter comigo?" ele faz beicinho e eu rio, acenando afirmativamente.

A pequena criatura loira sai a correr da cela, a fim de encontrar a biblioteca. Quando vejo que ele já está longe, sento-me no chão e tento segurar as lágrimas. Não quero chorar, para além disso, nem há razão para chorar. A mãe de Dylan não é a minha mãe e provavelmente não irá voltar e um dia, o rapaz irá ter de encarar a realidade.

Eu tenho de vontade de chorar porque sei o quanto o Dylan sente a falta da mãe dele. A minha mãe morreu antes do apocalipse e eu sinto tanto a falta dela... Mas eu sei que ela está morta, que não há mais volta a dar. Com a mãe do Dylan, é diferente... Ela pode andar por aí á procura do filho.

Escondo a minha cabeça no meio das minhas pernas e respiro fundo. Um abraço por parte da minha mãe sabia mesmo bem agora, quebrava todas as minhas agonias e inseguranças, assim como afastava o medo que eu tenho. Medo que isto não resulte, medo do que pode acontecer a Dylan quando eu não estiver por perto, medo de viver.

Ouço passos a entrar na cela silenciosa e por momentos penso que é Dylan, que deu meia volta no seu caminho, mas rapidamente esqueço essa ideia quando essa pessoa se agacha á minha beira e me põe a mão no ombro.

"O que estás aqui a fazer?" uma voz grave, mas suave pergunta. Olho em direção á pessoa e vejo Carl. "O Daryl anda á tua procura."

"Quero lá saber dele." resmungo, voltando a pôr a minha cabeça no meio das pernas.

"Estás chateada?"

"Não." digo, sinceramente, não estou chateada, apenas frustrada com o mundo.

Ele senta-se encostado á parede á minha frente.

"Espero que não te importes, mas vou ficar aqui." ele diz.

Não digo nada, apenas aperto as minhas pernas com força e fecho os olhos, tentando espairecer. Desisto dessa ideia quando passam alguns minutos. Olho para Carl, este já estava a encarar-me. A expressão dele é difícil de desvendar, os seus olhos estão mais azuis do que nunca e o seu cabelo está mais despenteado do que o normal.

"Tens uma letra horrível." gozo e ele solta uma risada baixa. "Como está a tua irmã?" a pergunta vem-me á cabeça.

"Está bem. Está com a Beth." assinto ao que ele disse. "E o teu? Quer dizer, o Dylan?"

"Ele é praticamente meu irmão..." encolho os ombros. "Foi á hora da história." olho para as minhas unhas, retirando as pequenas peles do canto.

"Á hora da história?!" Carl arregala os olhos e eu levanto o meu olhar dos dedos para olhar para o rapaz de olhos azuis, erguendo uma sobrancelha.

"Sim, qual é o problema?" Carl morde o lábio, encarando um ponto morto no meio da cela. "Grimes?"

O xerife abana a cabeça e encara-me. "Hm... sim... não, não há nenhum problema. Eu tenho de ir!"

A minha barriga começa a roncar e lembro-me de que não almocei, mas não me importo, já passei dias de fome.

Carl levanta-se mais rápido do que eu consigo processar e sai da minha cela, espero uns instantes na esperança que ele volte, mas ele simplesmente não o faz. As pessoas daqui têm a mania de me deixar sempre sozinha.

Carl deixa-me curiosa e intrigada. Ele é tão calado e um completo idiota mas a sua presença faz a diferença... Não percebi muito bem porque é que ele ficou comigo, mas ainda bem que o fez, senti-me melhor apesar de não termos falado quase nada. Acho que é isso que me deixa curiosa em relação a Carl, não é preciso ele falar nada para que uma pessoa o queira estrangular. Mas também não é preciso ele falar nada para que uma pessoa se sinta melhor ou bem humorada, basta ele estar aqui.

Espero poder ter a oportunidade de ele estar aqui mais vezes...

• The Reason • ➳ cr/cgOnde histórias criam vida. Descubra agora