Capítulo I - Além do muro

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Anthony olhou fixamente para as águas do espelho d'água e como de costume atirou uma pequena pedra contra ele, ondas se formaram repentinamente sobre a superfície da água e ele teve a curiosa impressão de ver os contornos de um rosto feminino surgirem e sumirem logo em seguida.

Ele empalideceu intrigado e voltou confuso para a sua casa cruzando as ruas movimentadas do Vilarejo.

Chegando em casa, observou o globo de cristal da sala, que parecia tão enigmático quanto o rosto que vira na água, subiu até a varanda vitrificada e, após observar um tempo o Sol, voltou-se para o muro repulsivo e pesado que ficava no alto de uma elevação - respirou lentamente e meditou um pouco - até que uma voz cortante ecoou fazendo-o sobressaltar:

__Anthony, nós já falamos sobre isso, esqueça o muro! – Disse dona Anne se aproximando de forma súbita.

__Mas mãe, por que não? – Questionou Anthony.

__Você sabe filho, ninguém pode passar desse muro... -  Sussurrou Anne

__Mas por que temos que viver reclusos aqui?

__ Você sabe o que acontece a quem ultrapassá-lo? Claro que sabe... Mas para refrescar sua memória: todos os seus temores irão se concretizar, dores diversas e inimagináveis, tudo que você mais detesta irá ocorrer...

__Medo, sempre o medo... Não há nada mais vivo aqui! – Dizendo isso, Anthony se retirou.

A povoação, chamada pelos habitantes de vilarejo, ficava em uma depressão, no horizonte dela havia um muro relativamente alto, que circundava todo o local.

O dia já clareava, Anthony caminhava pela rua central, absorto em cogitações, pensava sobre a determinação de ter que se tornar sacerdote, mas como poderia ser um deles? Se estava tão confuso acerca do que acreditar. O tempo passava apático, horas velozes e indiferentes atormentavam seu sono e o dia da ordenação estava chegando - isso o afligia profundamente.

__Bom dia Anthony! – Exclamou um belo arbusto que passeava calmamente ao seu lado.

Anthony fez uma reverência à planta e se apressou.

__Você parece atordoado hoje... Cuidado! - Exclamou a simpática planta.

Uma estátua distraída por pouco não colidiu com o jovem.

__Se você quiser água, espere. Só a terá na festa de mais tarde! – Replicou o futuro sacerdote.

__Não fale assim Anthony! Mas quanto ao que você me pediu... - Aludiu a planta

__Você conseguiu? – Perguntou Anthony empolgado.

__Sim, ela está perto do paço Real. Ao meio dia, os guardas fazem uma pausa, há uma janela na lateral da cela, amanhã durante a festa de agradecimento, você terá a oportunidade de falar com Marie Claire.

Os olhos do jovem cintilaram e ele agradeceu:

__Obrigado, eu sabia que você não falharia! – Dizendo isso, com o semblante radiante, acariciou a planta e a ofereceu um generoso torrão de açúcar, alguns instantes depois retomou sua caminhada em direção à praça central.




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