Contos Para Não dormir

O Inquilino Parte-4

Eram 3:15 da manhã. Hugo se revirava na cama de um lado a outro. Aquilo era um choro? Sim, era um choro de mulher. Estava por toda a casa, baixo, triste e insistente. Hugo podia ouvi-lo nitidamente. Já tinha andado pela casa inteira tentando saber de onde aquele lamento triste estava vindo mas acabou desistindo. Agora ele estava acordado olhando para o teto fixamente. Os olhos estavam ardendo de tanto sono mas ele não poderia dormir. - Eu disse pra você ir embora - Disse Sonya, sentada na beira da cama. - É você quem está morta - Resmungou Hugo se virando de lado - Devia estar em alguma festa no céu. - Suicidas não vão para o céu - Disse Sonya tristemente. Hugo a encarou. O rosto dela era quase o mesmo de quando ela estava viva, porém agora era um rosto sem expressão e depressivo. - Eu sinto muito - Foi tudo o que Hugo conseguiu dizer. - Você sente muito - Sonya repetiu com amargura na voz - Esse será seu carma, querido. Até que nós dois possamos nos encontrar na eternidade. Hugo sentiu um caláfrio percorrer seu corpo. Aquilo soava como um mal agouro. O choro no entanto parou. Hugo se levantou e foi espiar pela porta do quarto. - A vadia calou a boca - Disse ele para Sonya. - Ela está sofrendo por quê os filhos dela foram mortos - Disse Sonya num tom calmo - Devia sentir pena. - Eu só quero dormir. - Pode simplesmente deixar a casa e comprar outra. Hugo deu uma risada debochada. - Não vou largar a casa - Disse ele - Eu paguei por ela, então vou ficar. Esses fantasmas que vão para o inferno. Sonya se aproximou dele e ele se assustou com o movimento brusco que ela fez. Ela pousou as mãos frias no rosto dele delicadamente e disse: - O problema não são os fantasmas, Hugo. Essa gente só está presa aqui. São inofensivos. O problema mesmo é a coisa que causou suas mortes. Hugo se interessou pela conversa: - Que coisa? - Perguntou ele. - Uma entidade. Você a viu no sótão. Uma criatura da escuridão. - Adrian Bess disse que havia um demônio na casa - Se lembrou Hugo. - Foi a única coisa que ele disse que era realmente verdade - Revelou Sonya - Saía daqui Hugo. Saía enquanto ainda pode ou esse ser maligno irá matar você. Sonya desapareceu e Hugo se sentou na cama. Poderia ter dormido se não houvesse uma mulher ensanguentada deitada bem na sua cama. - Meu marido matou minhas crianças - Disse a mulher - Por favor me ajude... Hugo se afastou da cama e se sentou no chão. Escondeu o rosto nas mãos e começou a cantar alto para abafar a voz da mulher que ainda suplicava na cama. Hugo não estava mais aguentando

Dois dias depois daquela madrugada difícil, Hugo estava em casa se ocupando de jogar toda a comida fora. Por algum motivo estranho a comida estava estragando mesmo que estivesse na geladeira. Isso sem falar das plantas e da água que agora saía preta e mal-cheirosa das torneiras. Hugo estava quase desistindo daquilo tudo e indo embora, mas seu orgulho era mais forte. Herdara isso de seu velho pai que era um paulista orgulhoso e teimoso. Depois de jogar a comida fora, Hugo tratou de cobrir a lareira com tijolos. A lareira vivia acedendo sozinha e aquilo já estava irritando Hugo profundamente. Não queria mais ver aquele bebezinho aparecer de novo. Hugo ainda estava trabalhando nisso quando a campainha tocou. O rapaz atendeu a porta e ficou surpreso em ver quem estava lá: - Posso entrar? - Perguntou Adrian. Hugo relutou um pouco mas por fim deixou que Adrian entrasse na casa. - O que quer? - Perguntou Hugo. - Ajudar - Respondeu Adrian de imediato - Sei que deve estar zangado mas dessa vez eu vim pra ajudar de verdade. - Como? Você nem sabe caçar fantasmas de verdade. Adrian concordou com a cabeça. - Eu sei -Disse Adrian - Só que eu andei pesquisando. Entrei nesses grupos do Facebook que falam sobre espíritos e demônios e acho que encontrei a solução pró seu problema. Acho que tem um demônio aqui. - Eu sei - Disse Hugo - Sonya me falou. Adrian encarou Hugo com um olhar curioso. - Quem é Sonya? - Perguntou. - Minha esposa morta - Respondeu Hugo naturalmente. Adrian pensou sobre àquilo um pouco e então disse: - Tá. Eu pesquisei e aí achei coisas bem interessantes sobre demônios. A boa notícia é que podemos expulsá-lo. A má notícia é que vamos ter que invocá-lo pra fazer isso. - Isso não parece ser uma coisa muito inteligente - Disse Hugo - É o único jeito? - Também podemos queimar a casa mas esse é o método Foda-se Tudo. Invocar o Capeta pode dar certo. Depois disso ferrar com ele é a parte mais difícil. Hugo refletiu um pouco. Queria se livrar daquela loucura toda e abrir não da casa não estava em seus planos. - Então eu topo - Disse ele sorrindo - Invoque ele.

Adrian colocou uma mesinha com um pentagrama desenhado no centro bem no meio da sala. Em cima da mesa colocou uma tigelinha preta e fez um corte na mão. Deixou o próprio sangue pingar dentro da tigela, acendeu duas velas pretas em cima da mesa. Hugo se ocupava em desenhar simbolos estranhos nas paredes da casa. Segundo Adrian aqueles simbolos serviriam para deixar o demônio fraco e preso numa forma humana quase inofensiva.
- Tem um tutorial de como invocar o demônio no YouTube? - Indagou Hugo depois de terminar de desenhar os símbolos - Sério? Essa garotada de hoje sabe mesmo de tudo.
Adrian pegou um pedaço de pano velho e sujo de sangue do bolso da jaqueta e colocou fogo nele usando um isqueiro. Jogou a tira de pano na tigela e esperou que queimasse por completo.
- O que era isso? - Perguntou Hugo.
- Uma pedaço das vestes de uma freira assassinada.
- Onde conseguiu isso?
Adrian meneou a cabeça e disse num tom evasivo:
- Não vai querer saber.
Por fim Hugo se afastou da mesa e fez um círculo de sal grosso no chão onde ele e Hugo ficaram parados.
- Aconteça o que acontecer - Disse ele a Hugo - Não saía do círculo.
Adrian então começou a recitar alguma coisa em latim que Hugo não compreendia. A sala começou a tremer e então um homem de terno surgiu junto a mesa. Era alto e magro. Tinha cabelos negros que íam até os ombros e sorria exibindo seus dentes brancos e impecáveis. O homem pegou a tigela na mesa e aspirou a fumaça lentamente.
- Ah- Exclamou o homem - Adoro sangue de freira. O que eu fiz para merecer esse mimo?
O homem encarou Adrian com um sorriso:
- Ora, ora - Disse ele - Se não é o rapaz da TV. Adoro seu programa. Sério. Eu não me divertia tanto assim desde Gomorra.
- Quem é você e por que está aqui? - Perguntou Adrian rispidamente.
- Meu nome é Malek - Respondeu o demônio - E estou aqui pelas três coisas básicas: Matar, roubar e destruir.
- Só que tá na hora de cair fora, seu desgraçado - Disse Hugo nervoso - Essa casa é minha!
- A casa é sua mas sua vida nos pertence - Disse Malek - Ora, Hugo! Ainda não se tocou? Acha que está aqui por acaso? Eu o atraí pra cá. Eu queria você aqui, bem na minha arapuca. Você tem fibra garoto e eu adimiro isso. Sua alma é importante pra mim. Queria que você se matasse. Deixei esses fantasmas á solta pela casa só pra te levar á loucura mas subestimei você. Você se manteve firme e ainda trouxe esse palhaço do Adrian Bess pra nossa festa. Melhor se tivesse chamado um padre.
O demônio se virou e só então notou os desenhos nas paredes.
- Querem me exorcizar? - Indagou o demônio cheio de irá -Seus ratos traiçoeiros!
O demônio se precipitou para frente mas não conseguiu ultrapassar o círculo de sal. Adrian começou a falar em latim novamente. O demônio começou a berrar de ódio.
- Eu vou matar vocês - Gritou ele.
Adrian continuou com seu latim sem titubear. O demônio caiu de joelhos. Seu corpo começou a pegar fogo imediatamente e então aconteceu algo que ninguém esperava. Sonya apareceu do lado de fora do círculo. Ela encarava Hugo com frieza e então ela fez um movimento com a mão e fez com que se abrisse uma brecha no círculo de sal.
- Querida - Disse Hugo - O que está fazendo?
- Você pagar pelo que fez com nosso filho - Disse ela - É o seu carma.
E então ela desapareceu. O demônio se moveu rapidamente e jogou Adrian e Hugo pra longe usando sua força descomunal
- Agora Vamos conversar - Disse o demônio - Eu vou me divertir muito...